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Apesar de todas as polêmicas em torno das motivações e dos responsáveis pelo vandalismo ocorrido em 8 de janeiro de 2023, o presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) avança com planos concretos para construir um museu em Brasília dedicado ao tema. O terreno já foi definido no Eixo Monumental da capital, o orçamento prévio é de R$ 40 milhões e a data para iniciar as obras foi marcada pelo Ministério da Cultura (MinC) para o começo de 2025.
A decisão do governo, contudo, enfrenta críticas de senadores de oposição, que questionam tanto a prioridade dada ao projeto diante das carências nacionais, quanto controvérsias que cercam os incidentes de um ano atrás na Praça dos Três Poderes. À Gazeta do Povo, eles criticaram os valores envolvidos e os objetivos do projeto.
Mesmo entre políticos de esquerda, há divisões quanto à interpretação dos acontecimentos, com alguns não reconhecendo nos atos sequer uma tentativa frustrada de golpe de Estado. Entre eles está o próprio ministro da Defesa, José Múcio Monteiro.
Para o senador Hamilton Mourão (Republicanos-RS), erguer “o dito Museu da Democracia” é “uma vergonha”. “O desgoverno Lula até hoje não trata com seriedade das questões relevantes para a República e para a sociedade. O povo está abandonado, sem saúde e segurança pública. Mesmo assim, o presidente pretende gastar cifra escandalosa nesse projeto”, protestou.
“O 8 de janeiro de 2023 foi um dia triste e não deve ser comemorado. O tempo se encarregará de demonstrar os abusos cometidos por autoridades do governo contra cidadãos de bem que defendiam suas ideias”, comentou o senador Astronauta Marcos Pontes (PL-SP). Ele lembra que foi a primeira vez na história que uma manifestação política e desarmada teve mais de 2,1 mil pessoas presas, com condenações de 17 anos de prisão. “Temos muito menos democracia hoje. Temos que lutar pela democracia absoluta”, disse. No Senado tramitam duas propostas para anistiar os presos do 8 de janeiro.
A senadora Damares Alves (Republicanos-DF) disse ter recebido a notícia da construção do museu com perplexidade e indignação. “Lamento por essa ideia inadequada e absurda. Além do investimento pesado, o equipamento demandará custos permanentes de manutenção e funcionários. O governo não sabe mesmo o que fazer”, declarou. Para ela, o ideal seria direcionar esses recursos para demandas urgentes de idosos e mulheres na saúde pública ou criar programas voltados a autistas e a crianças, adolescentes e mulheres vítimas de violência. “Melhor empregar esse dinheiro em viaturas policiais e leitos hospitalares”, sugeriu.
A senadora lembrou ainda de outra iniciativa semelhante proposta pelo governo de Dilma Rousseff (PT) que acabou se perdendo no caminho, a do Memorial da Anistia, em Belo Horizonte. O projeto iniciado em 2009 já consumiu cerca de R$ 30 milhões dos cofres públicos e até hoje não saiu do papel, restando apenas um prédio inacabado sob responsabilidade da Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG).
Governo cria versão virtual do museu e quer construção rápida
Idealizado pelo MinC em setembro, o Museu da Democracia foi incluído no Programa de Aceleração do Crescimento (PAC) e a Secretaria de Patrimônio da União reservou para o empreendimento uma área no setor cultural da Esplanada dos Ministérios, ao lado do Teatro Nacional.
O Instituto Brasileiro de Museus (Ibram) lançará nos próximos meses um concurso para escolher o projeto arquitetônico e de engenharia. “A expectativa é de construção rápida”, disse Fernanda Castro, presidente do Ibram. Os detalhes do projeto foram apresentados na esteira do evento "Democracia Inabalada", proposto pelo governo e realizado no Congresso para marcar um ano do 8 de janeiro.
Enquanto não se materializa, o empreendimento já tem uma versão virtual (democracia.museus.gov.br), para coletar sugestões do público. O governo informou em nota que o repositório digital, “além de abrigar um memorial sobre os ataques antidemocráticos”, servirá de base à campanha voltada ao engajamento social de museus e pontos de memória.
A ministra da Cultura, Margareth Menezes, afirmou que o “Museu da Democracia” terá espaços também para tratar da escravidão e da relação com os povos originários. “Será um museu onde teremos acolhimento e refletiremos sobre esses acontecimentos com outros museus”, ressaltou.