Apesar de algumas propostas tramitando no Congresso, os servidores estão passando imunes à redução de jornada e salário neste momento de crise causada pela pandemia do novo coronavírus. O governo já autorizou a redução e até mesmo a suspensão do contrato de trabalho no caso da iniciativa privada, mas desistiu de apresentar projeto semelhante para o funcionalismo público. Os poucos parlamentares que apoiam mexer com os servidores também não estão conseguindo sucesso no Congresso neste momento.
A equipe econômica, segundo apurou a Gazeta do Povo com um técnico do Ministério da Economia, estava preparando uma proposta de emenda à Constituição (PEC) que propunha a redução de 25% da jornada e do salário dos servidores públicos. A minuta do texto permitia a redução até 2024, não somente durante a pandemia, e seria aplicada somente a quem recebesse acima de três salário mínimos.
A ideia inicial era que a PEC tivesse abrangência entre os servidores do Executivo, com possibilidade de extensão para estados e municípios. Mas a equipe econômica recebeu a sinalização do presidente da Câmara, Rodrigo Maia (DEM-RJ), que o ideal seria abranger os três Poderes, e chegou a iniciar conversas para incluir o Judiciário e o Legislativo.
Só que, diante das resistências, o ministro Paulo Guedes desistiu no fim de março de apresentar esse texto ao Congresso. Segundo essa fonte, que conversou reservadamente com a reportagem, foram dois principais motivos. O primeiro seria político, já que o funcionalismo é uma das categorias mais unidas e tem forte influência nos bastidores para barrar propostas que lhe desagradam. A Fonacate (Fórum Nacional Permanente de Carreiras Típicas de Estado) foi uma das principais associações de servidores que atuou para barrar o avanço da proposta.
O governo também temeu que a redução de salário e jornada fosse reduzir a produtividade dos servidores num momento em que a demanda está em alta. Esse interlocutor citou como exemplos de órgãos que não podem ter redução de jornada neste momento: INSS, que cuida dos benefícios previdenciários e assistenciais; Receita Federal, que está participando do comitê de combate à pandemia; e Ministério da Cidadania, que vai comandar junto à Caixa o pagamento do auxílio dos informais, além do Bolsa Família; entre outros.
Guedes desistiu de reduzir salários e disse preferir "congelamento" por alguns anos
Na última terça-feira (31), Maia jogou a responsabilidade da desistência do projeto que reduz o salário dos servidores nas mãos de Guedes. “Até semana passada, de fato, a discussão de uma PEC com os governadores tinha a possibilidade de redução de salário de todos os Poderes, inclusive na esfera dos estados. Quando o ministro [Paulo Guedes] deu a declaração de forma diferente, é óbvio que todos aqueles que têm dificuldades e são contra o debate abraçaram a posição do ministro, de que não seria preciso”, disse em declaração à imprensa.
A declaração a que Maia se referiu foi uma dada pelo ministro em videoconferência com investidores da XP Investimentos, realizada no dia 28 de março. Guedes disse que era contra reduzir salário dos servidores, pois isso tiraria o poder de compra deles. “Eu acho que num momento de emergência você tirar dinheiro do funcionalismo, seja das empresas, eu não acho que é o momento de fazer isso”, afirmou.
O ministro defendeu que, macroeconomicamente, faz mais sentido congelar o salário do funcionalismo por um período de dois a quatro anos. “Eu prefiro trocar por um congelamento mais longo dos salários do funcionalismo. Pega aí uns dois, três, quatro anos e trava isso [reajuste]. Eu acho isso mais construtivo pro país do que tirar poder de compra.” Neste ano, os servidores do Executivo, com exceção dos militares, já não tiveram aumento.
Iniciativa privada pode reduzir salário e até suspender
Para a iniciativa privada, o governo editou a medida provisória 936 – que permite a redução proporcional de jornada e salário em até 70%, dependendo do caso, e a suspensão do contrato de trabalho. Em ambos os casos, com possibilidade de acordo individual – uma inovação, pois a Constituição permite a redução de salário somente mediante acordo coletivo.
O governo estima que 24,5 milhões de pessoas terão seus contratos de trabalho suspensos ou a jornada e salário reduzidos. São cerca de 70% do total de trabalhadores empregados via CLT, ou seja, com carteira de trabalho assinada atualmente. A suspensão do contrato é válida por até dois meses e a redução, por até três meses. O governo vai pagar um auxílio aos trabalhadores para minimizar a perda de renda.
A MP está em vigor desde 1º de abril, quando foi publicada no Diário Oficial da União. Ela tem validade de 120 dias. O Congresso agora vai analisar a MP e fazer possíveis modificações.
Congresso tem iniciativas para reduzir salário de servidores
O Congresso também tem alguns projetos para reduzir a jornada e o salário dos servidores. Mas, por enquanto, nada foi pautado para votação nesse sentido pelos presidentes da Câmara e do Senado.
Na votação do chamado “Orçamento de Guerra”, por exemplo, na semana passada, as emendas do partido Novo que tratavam de redução de salário do funcionalismo foram barradas. As emendas previam redução de 26% a 50% do salário e da jornada, a depender do holerite do servidor. Quem atuasse diretamente no combate à pandemia não seria atingido. As emendas propunham ainda a redução de verba de gabinete e da cota parlamentar e a transferência do dinheiro do fundo de campanhas eleitorais para o combate ao coronavírus.
Elas foram rejeitadas pelo relator da PEC do Orçamento de Guerra, deputado Hugo Motta (Republicados-PB), que teve apoio de partidos de esquerda, de centro e de direita. O deputado Orlando Silva (PCdoB-SP), por exemplo, disse que iniciativas de cortar salário são demagogia ou guerra política. "Não podemos fazer demagogia ou guerra política no momento, alimentar posições de desprezo pelo serviço público", disse na votação de sexta-feira (3).
Além do Novo, outro partido que apoiou até aqui a redução de salário e corte de servidores foi o PSDB. O líder da sigla na Câmara, deputado Carlos Sampaio (PSDB-SP) protocolou no fim de março uma proposta (PL 1144/2020) para reduzir os salários do setor público durante o novo coronavírus. O texto abrange os três Poderes.
A proposta prevê que o corte será de 10% para quem recebe mais de R$ 5 mil e até R$ 10 mil e de 20% a 50% para quem recebe acima de R$ 10 mil. Servidores que recebem R$ 5 mil ou menos não são atingidos, assim como quem trabalha na área de saúde e segurança, independentemente dos seus rendimentos. Os cortes valeriam por três meses, podendo ser prorrogador por mais três, enquanto durar a pandemia.
A proposta de Sampaio chegou a ter o apoio público de Maia, que desistiu de pautá-la após o recuo do governo.
Outro texto que prevê a redução e jornada de servidor foi apresentado pelo deputado Alex Manente (Cidadania-SP). O projeto (PL 1139/2020) cria o Fundo Nacional Emergencial de Política Social, destinado a financiar as ações de combate ao novo coronavírus. Esse fundo seria abastecido com o dinheiro da redução de 30% do salário dos servidores dos três Poderes. Funcionários que ganham menos de um salário mínimo e das áreas de saúde e segurança não são atingidos. O texto aguarda despacho do presidente da Câmara.
O deputado Wladimir Garotinho (PSD/RJ) chegou a protocolar na Câmara um pedido para o presidente Jair Bolsonaro apresentar uma proposta de redução de até 50% do salário e da jornada dos servidores, da mesma forma que fez com a iniciativa privada. “Esta indicação se justifica pelo fato de que todos os brasileiros, não somente os que trabalham na iniciativa privada, tenham que se sacrificar para contribuírem com os esforços que visam proteger o trabalhador de uma possível demissão”, escreveu o deputado no dia 24 de março.
No dia 27 do mesmo mês, o requerimento foi retirado devido a “erro técnico por parte da assessoria, o qual corrigiremos para novo protocolo”.
O deputado Ricardo Izar (PP-SP) também preparou uma proposta para reduzir e a jornada dos salários dos servidores em 20%, com exceção daqueles que recebem R$ 5 mil ou menos. O deputado também garantiria que nenhum servidor que tivesse o salário reduzido recebesse menos de R$ 5 mil por mês. O texto se aplicava aos três Poderes e as regras valeriam durante a pandemia, com os recursos economizados sendo destinados ao combate ao vírus. O texto acabou não sendo protocolado pelo parlamentar.
Outra proposta que permite a diminuição dos vencimentos e está em tramitação no Senado é a PEC Emergencial, apresentada pelo governo em novembro do ano passado. Ela possibilita que União, estados e municípios reduzam em até 25% a jornada e salário de seus servidores, caso entrem em estado de “emergência fiscal”. A PEC não se aplicada ao Judiciário e ao Legislativo.
A proposta, contudo, proíbe o Executivo de aumentar seus gastos durante o estado de “emergência fiscal” e, por isso, não poderia ser aprovada neste momento da forma que foi apresentada, pois travaria as ações do governo no combate à pandemia. O relator da proposta, senador Oriovisto Guimarães (Podemos-PR), é favorável a mudar o texto para permitir exceções a gastos emergenciais, como durante estado de calamidade pública.
Impasse sobre apoio a Lula provoca racha na bancada evangélica
Símbolo da autonomia do BC, Campos Neto se despede com expectativa de aceleração nos juros
Copom aumenta taxa de juros para 12,25% ao ano e prevê mais duas altas no próximo ano
Eleição de novo líder divide a bancada evangélica; ouça o podcast
Triângulo Mineiro investe na prospecção de talentos para impulsionar polo de inovação
Investimentos no Vale do Lítio estimulam economia da região mais pobre de Minas Gerais
Conheça o município paranaense que impulsiona a produção de mel no Brasil
Decisões de Toffoli sobre Odebrecht duram meses sem previsão de julgamento no STF