Entorno de Jair Bolsonaro considera que celular apreendido não tem nada que o incrimine| Foto: Marcos Correa/PR
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Dois dos maiores colaboradores do ex-presidente Jair Bolsonaro (PL) estão sob intensa pressão, nas últimas semanas, por serem alvos de investigações do ministro Alexandre de Moraes, no âmbito do Supremo Tribunal Federal (STF). O ex-ministro da Justiça Anderson Torres, que passou quase quatro meses preso, e o coronel e ex-ajudante de ordens Mauro Cid, preso há mais de uma semana, têm sido instados a delatar o antigo chefe. Mesmo assim, as defesas dos dois dizem que não vão fechar acordos de delação contra ele.

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Torres foi preso em 14 de janeiro, acusado por Moraes de omissão na proteção da área central de Brasília no 8 de janeiro, quando vândalos invadiram e depredaram as sedes dos Poderes. Durante seu período na cadeia, porém, a Polícia Federal coletou outros elementos que demonstram que ele tinha ao menos conhecimento, ou talvez participação, de planos para prejudicar ou reverter a vitória eleitoral do presidente Luiz Inácio Lula da Silva.

Em sua casa, a PF encontrou a minuta de um decreto presidencial que imporia estado de defesa no Tribunal Superior Eleitoral (TSE) para rever o resultado da disputa. Depois, documentos do Ministério da Justiça mostraram um plano para fiscalizar o transporte de eleitores numa região da Bahia onde o PT é forte – Torres diz que o objetivo era apurar compra de votos, mas a suspeita é de que a Polícia Rodoviária Federal (PRF) pode ter sido acionada para atrapalhar a chegada de votantes às urnas. Por fim, há registros em vídeo de que Torres ajudou Bolsonaro a questionar a segurança das urnas eletrônicas, o que pode ser crime, segundo Moraes.

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Mauro Cid, por sua vez, é investigado ao menos desde agosto de 2021 pelo ministro. Naquela época, a PF descobriu, com a quebra de seus sigilos telefônico e telemático, que ele ajudou Bolsonaro a divulgar o inquérito da PF que investigou o ataque hacker ao TSE em 2018 – o caso foi arquivado porque a Procuradoria-Geral da República considerou que o documento não era sigiloso. A abertura dos dados de seu celular ainda revelou que ele pagava contas pessoais da família do ex-presidente, linha de investigação ainda em andamento e que tende a avançar, pela suspeita de uso de dinheiro público.

O que apareceu de mais forte - e que o levou à prisão - foi a revelação de mensagens em que ele articulava a inserção de dados falsos de vacinação contra a Covid em um sistema do Ministério da Saúde para emissão de certificados falsos – foram beneficiados a mulher de Cid, Bolsonaro e a filha do ex-presidente.

Moraes e a PF agora querem saber se ele e Bolsonaro também se envolveram em planos para anular a eleição de Lula ou mesmo para provocar uma intervenção militar para afastá-lo do poder. Transcrições de áudios de militares para Cid defendendo uma ruptura foram divulgados nos últimos dias.

Advogados rejeitam acordo de delação premiada

Até o momento, no caso de Torres, advogados chamados para defendê-lo têm assegurado que nada do tipo será achado contra Bolsonaro. A estratégia do ex-ministro é colaborar com as investigações sobre os atos do 8 de janeiro, mas sem admitir culpa nem imputar conivência ao ex-presidente. Nesta sexta, o advogado Eumar Novacki foi peremptório ao rejeitar um acordo de delação premiada. “Não existe essa possibilidade de delação. O que o Anderson vai fazer é cooperar para que se esclareça o mais breve possível, os fatos que levaram àqueles odiosos atos do 8 de janeiro”, afirmou à imprensa.

Ele também diz que o celular do ex-ministro estará à disposição da PF e, na entrevista, evitou a todo custo criticar Moraes pela prisão prolongada do cliente. Ao contrário, disse que era esperada uma reação enérgica do ministro após os atos de vandalismo. A estratégia da defesa é aplacar qualquer tipo de animosidade contra Moraes e não repetir, por exemplo, a postura dos ex-deputados Daniel Silveira e Roberto Jefferson de confrontar o ministro – ambos estão presos e devem passar um bom tempo cumprindo pena.

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Os advogados também querem se afastar de políticos aliados de Bolsonaro que, revoltados com sua prisão, o visitaram na cadeia e passaram a criticar o ministro. A ideia é apaziguar a relação com o STF, para que Torres responda às acusações após se recuperar da depressão vivida no cárcere.

Se a defesa de Torres ainda tem expectativa de inocentar o ex-ministro, a situação de Mauro Cid é mais complicada no caso dos cartões de vacina. A investigação da PF já tem provas suficientes para uma denúncia por parte da Procuradoria-Geral da República (PGR), no sentido de que ele teria articulado o esquema de falsificação dos dados – registros oficiais do Ministério da Saúde coletados pela Controladoria-Geral da União (CGU), comprovando a inserção de dados, coincidem com o teor de suas conversas.

A PF, no entanto, ainda quer aprofundar a investigação para saber se houve autorização de Bolsonaro para que Mauro Cid também incluísse doses para ele e Laura no sistema. O celular do ex-presidente, apreendido pela PF, é considerado peça-chave para esclarecer isso. Mas interlocutores próximos do ex-presidente garantem que nada será achado contra ele.

Inicialmente, a defesa de Mauro Cid estava a cargo de Rodrigo Rocca, advogado de confiança da família Bolsonaro – ele foi um dos que conseguiu livrar o senador Flávio Bolsonaro (PL-RJ) da acusação de rachadinha, e em 2022 ganhou um cargo no Ministério da Justiça. Nesta semana, porém, ele deixou a defesa – pessoas próximas da família do ex-ajudante de ordens ficaram incomodadas porque, na visão deles, o advogado parecia mais interessado em blindar o ex-presidente.

Assumiram a defesa do coronel os advogados Bernardo Fenelon e Bruno Buonicore. Assim como Eumar Novacki, defensor de Torres, eles não querem conflito com o STF. Buonicore já assessorou Gilmar Mendes. Fenelon é especialista em delação premiada, mas a estratégia não passa por isso. A ideia é fechar outro tipo de trato com a Justiça: um acordo de não persecução penal. Também envolve confissão, mas sem entregar outra pessoa, como na delação. Vale para delitos de menor potencial ofensivo – caso do cartão de vacina – e reduz a pena do réu.

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O esforço dos advogados agora será tirar Mauro Cid o quanto antes da cadeia. Para isso, devem não apenas manter uma linha amistosa com o STF – como fez Torres –, mas também argumentar que mantê-lo preso preventivamente, antes da condenação, não faz sentido: o coronel já não tem cargo de relevância que lhe desse condições de interferir nas investigações nem teria como cometer novos delitos do tipo.

Ainda assim, Moraes tende a mantê-lo na prisão por mais tempo para aguardar novas apurações da PF sobre o material apreendido em sua casa, incluindo dinheiro vivo (US$ 35 mil, equivalente a cerca de R$ 175 mil, além de outros R$ 16 mil). Além disso, a PF também vai tentar descobrir a origem de R$ 400 mil depositados em sua conta em março de 2022. O foco aqui é saber se ele era usado como laranja para supostas transações suspeitas de Bolsonaro.

Trata-se de uma linha de investigação que preocupa mais o entorno do ex-presidente. No ano passado, quando informações dessas transações vazaram para a imprensa, ele reagiu de maneira explosiva: numa entrevista no Palácio da Alvorada, Bolsonaro afirmou que Moraes agia de forma abusiva na tentativa de atingi-lo por meio da ex-primeira-dama Michelle Bolsonaro – alguns pagamentos efetuados por Mauro Cid eram para quitar boletos de contas pessoais dela. O objetivo disso, segundo defensores do ex-presidente, era evitar que seu nome e dados de sua conta aparecessem em recibos e faturas, por questão de segurança.

A PF ainda trabalha para descobrir se os recursos têm origem pública. Isso porque Mauro Cid e outros ajudantes de Bolsonaro faziam muitos saques e depósitos em espécie para pagar as contas, o que levantou a suspeita de um artifício para esconder a origem do dinheiro. Aliados do ex-presidente dizem que o recurso era privado, da conta pessoal dele, e que essas operações tinha valor baixo, e eram feitas assim para não expor Bolsonaro e Michelle.

A investigação sobre Mauro Cid tem mais um ponto delicado, por envolver um militar da ativa. O Exército tem dado apoio à família do coronel, especialmente sua mulher, que estaria bastante revoltada com a possibilidade de ele assumir toda a culpa no caso do cartão de vacina. Não haverá, no entanto, um apoio institucional a Mauro Cid, até porque muitos oficiais se surpreenderam com algumas das revelações, que também podem gerar punições administrativas ao coronel.

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Ao mesmo tempo, o Alto Comando está agindo para acalmar os ânimos de oficiais da reserva, que estão indignados com o caso, especialmente por considerarem que Moraes persegue o coronel, fazendo uma devassa em sua vida para encontrar algo que o incrimine.

A cúpula do Exército também tenta se equilibrar no caso, pois entende que ele desgasta a imagem pública da corporação e se esforça para não deixar que essa situação atrapalhe a relação já delicada da força com o governo Lula.

Infográficos Gazeta do Povo[Clique para ampliar]