Guilherme Haddad Nazar chefia a sede brasileira da Binance, corretora de criptomoedas suspeita de envolvimento com lavagem de dinheiro.| Foto: reprodução/Câmara
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O sobrinho do ministro Fernando Haddad, da Fazenda, é chefe da sede brasileira da Binance, maior corretora global de criptomoedas e que está no centro de investigações pelo mundo por suspeita de não pagar impostos locais e de estar envolvida em lavagem de dinheiro.

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Guilherme Haddad Nazar, sobrinho do ministro, chegou a prestar depoimento na CPI das Pirâmides Financeiras, que caracterizou a corretora como plataforma para golpes financeiros, segundo apuração da Folha de São Paulo publicada nesta segunda (15). Tanto Nazar quanto o ex-CEO, Changpeng Zhao, conhecido como CZ, tiveram pedidos de indiciamento resultantes da comissão.

A Binance afirmou à Gazeta do Povo que "não mediu esforços para colaborar ativamente com os trabalhos da CPI" e que investiu recursos significativos nos últimos dois anos para "aprimorar seu programa de conformidade" com a exigência de verificação da identidade de usuários.

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Neste sentido, a corretora disse que vem atuando "de forma contínua" para "ajudar proativamente" as autoridades na aplicação da lei ao redor do mundo e no Brasil "para detectar atividades suspeitas e combater crimes e ilícitos financeiros envolvendo o ecossistema de criptomoedas".

Já o Ministério da Fazenda informou a reportagem que realizou em 2023, através da Receita Federal, uma investigação em relação a "eventuais fraudes identificadas em exchanges estrangeiras que operam com consumidores brasileiros, sem instalar-se formalmente no país".

A investigação, no entanto, foi realizada de forma sigilosa e não teve o resultado divulgado. O ministério informou ainda que irá lançar em breve uma ação específica de conformidade para regularização desse mercado antes de estabelecer uma ação punitiva.

A relação da empresa com o Haddad ocorre num momento em que ele corre atrás de fontes para aumentar a arrecadação de impostos e alcançar a meta de zerar o rombo das contas públicas neste ano. Embora não recolha tributos nacionais, a sede brasileira da Binance emprega cerca de 200 pessoas e patrocina o Campeonato Brasileiro de Futebol (masculino e feminino) e o time do Santos.

Enquanto corretoras brasileiras pagam ISS sobre taxas de corretagem e reportam transações à Receita Federal, a Binance se esquiva dessa tributação, alegando ser uma operadora internacional sem sede no Brasil. Apesar de não ter uma sede oficial, a empresa mantém uma operação robusta no país, com Nazar na liderança e Henrique Meirelles, ex-presidente do Banco Central, no conselho consultivo.

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O Ministério da Fazenda informou que a Binance possui um pedido de autorização para aquisição de corretora de valores mobiliários que já está em curso no âmbito do Banco Central. "Tal pedido encontra-se em estágio de análise, não tendo por enquanto desfecho", completou a pasta.

A Binance afirmou à Gazeta do Povo que a aquisição da corretora local Sim:paul ocorreu em março de 2022 com autorização do Banco Central e da Comissão de Valores Mobiliários (CVM).

A CPI identificou sete CNPJs usados pela empresa no Brasil para atividades administrativas e registro de funcionários, pelos quais afirma pagar impostos.

O depoimento de Nazar na CPI em setembro ressaltou a posição da Binance de não recolher tributos, alegando que a “compra e venda de criptoativos é feita por empresas não brasileiras”. Embora seja difícil determinar o montante exato devido em impostos, a CPI calcula que a empresa deveria pagar entre R$ 300 e R$ 400 milhões anualmente, com base em informações reveladas durante um litígio com o banco Acesso.

"O que nós temos são clientes residentes no Brasil que depositam seus reais e passam a ter em sua conta da Binance o poder de comprar criptoativos que não são custodiados aqui. Então, não há fato gerador físico no local", disse Nazar à CPI.

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O litígio com o Acesso envolveu notificações do Banco Central sobre o risco de lavagem de dinheiro nas operações da Binance, levando à disputa de R$ 450 milhões na Justiça. A corretora não apenas deixa de pagar ISS sobre taxas de corretagem, como também não reporta à Receita Federal a movimentação de seus clientes, o que impediria a cobrança de imposto de renda sobre ganhos de capital.

Em resposta, Nazar destacou a responsabilidade dos usuários em fazer o “devido reporte à autoridade”, negando aconselhamento fiscal direto. O filho da irmã do Ministro Haddad foi nomeado diretor da empresa em dezembro de 2022, gerando controvérsias pela proximidade com o tio.

Relator da CPI, o deputado Ricardo Silva (PSD-SP) citou uma análise feita pela empresa AML Reputacional que teria identificado nos 700 maiores usuários da Binance 95% de chances de operações relacionadas à lavagem de dinheiro na plataforma.

"A Binance apoia a regulação e acredita que um ambiente regulatório estável pode apoiar a inovação e é essencial para estabelecer confiança no setor e crescimento de longo prazo. [...] A Binance já detém 18 licenças, incluindo-se países como Itália, França, Japão, Espanha, Emirados Árabes Unidos, Polônia, Suécia, El Salvador e outros, alguns deles membros do G7 e com regras rígidas para o setor financeiro", completou a Binance em nota à Gazeta do Povo.

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As acusações enfrentadas pela Binance no Brasil refletem um padrão global, com o procurador-geral dos EUA, Merrick Garland, afirmando que a empresa se tornou a maior corretora de criptomoedas “em parte por causa dos crimes que cometeu”.

Janet Yellen, secretária do Tesouro dos EUA, foi mais incisiva, alegando que a Binance fechou os olhos para suas obrigações legais, permitindo fluxo de dinheiro para atividades criminosas.

O ex-CEO, CZ, aguarda sentença nos EUA, enquanto no Brasil, pedidos de indiciamento foram feitos contra ele e Guilherme Haddad Nazar pela CPI.