O presidente da Sociedade Brasileira de Infectologia, Clóvis Arns da Cunha, manifestou nesta quarta-feira (25) preocupação com a ideia do presidente Jair Bolsonaro de implantar o chamado "isolamento vertical" – em que se isola apenas a população de mais risco, idosos e doentes crônicos – como medida de enfrentamento à pandemia do coronavírus no país.
A manifestação de Cunha foi feita em entrevista coletiva, depois de a entidade que preside emitir nota pública contestando o pronunciamento de Bolsonaro – que, na noite de terça-feira (24) questionou medidas de isolamento adotadas por estados e municípios para enfrentar a Covid-19.
O médico ponderou que o isolamento vertical é um segundo passo nas medidas de controle da pandemia, adotado por diversos países depois de passado o pico de contaminação. Ele lembrou que o Brasil ainda está no início desse processo, com crescimento exponencial no número de infectados.
“É o próximo passo [o isolamento vertical, depois de passado o pico de casos]. Mas hoje devemos funcionar só com os serviços essenciais. Neste momento de crescimento franco da transmissão comunitária, a recomendação é para que fiquemos em casa. Quando a curva [de infectados] achatar, começa a se liberar trabalhadores da indústria, do comércio, protegendo os grupos de risco”, disse.
Para Arns da Cunha, as primeiras cidades brasileiras poderão diminuir a rigidez de suas medidas de contenção dentro de 15 dias. “Tudo vai depender da epidemiologia. Mas, para cidades em que em 15 dias aparecerem poucos casos, sem contaminação comunitária, pode diminuir as restrições. Onde há mais casos – como no Sul e no Sudeste, principalmente Rio de Janeiro e São Paulo –, seria precipitado voltar em menos de um mês.”
Segundo o médico, para se poder adotar apenas o isolamento vertical, é necessário se ter dados epidemiológicos para comprovar que a transmissão está realmente diminuindo. “E, para isso, é fundamental que cheguem ao país os testes rápidos que o Ministério da Saúde está comprando e que eles sejam aplicados em todos os casos suspeitos. Só assim conseguiremos identificar se o vírus está circulando ou não por determinada localidade, sob o risco de se a população deixar o isolamento antes do tempo, a transmissão voltar a subir e de que um novo período de reclusão seja ainda maior”, afirmou.
Médico critica Bolsonaro
Arns da Cunha também criticou a declaração do presidente Bolsonaro classificando a Covid-19 como uma "gripezinha" ou um "resfriadinho". “O que está acontecendo hoje na Itália, na Espanha e hoje em Nova York, nunca ninguém viu. É a maior pandemia desta geração. Não vivemos a gripe espanhola. Confie nas orientações das autoridades de saúde. Nós estamos muito preocupados com o impacto econômico e social. Mas, se não tomarmos a medida agora, o período de isolamento pode ter que ser maior depois.”
O presidente da Sociedade Brasileira de Infectologia comentou ainda sobre os testes com os medicamentos cloroquina e hidroxicloroquina no tratamento aos casos graves do novo coronavírus. “As duas drogas foram testadas em laboratório e podem ter atividade diante do vírus. O número [de testes] até hoje foi muito pequeno. É um trabalho não muito forte cientificamente. Não foi randomizado [testado em uma amostra aleatória de pessoas], não foi comparado com o placebo. Não tem muito peso científico, mas é o que temos no momento. Então, é compreensível que se tente alguma coisa em pacientes em estado muito grave, mas que se faça dentro de um protocolo de pesquisa, porque, às vezes, o remédio pode ser pior que a doença, pode trazer mais danos que benefícios”, alerta, citando que a droga causa efeitos colaterais consideráveis no aparelho gastrointestinal, na coagulação e no nível hepático.
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