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Na metade de março, quando o novo coronavírus já havia chegado ao território brasileiro e começava a se espalhar, o ministro da Economia, Paulo Guedes, deu uma entrevista em que transparecia tranquilidade em relação à crise que se avizinhava. "Com R$ 3, R$ 4 ou R$ 5 bilhões a gente aniquila o coronavírus", disse. À época, o argumento do ministro era de que a principal resposta do país à epidemia eram as reformas.
Um mês depois, o próprio governo já revisou sua estimativa para o Produto Interno Bruto (PIB) em 2020, de 2,1% para 0,02%. As medidas já anunciadas pela equipe econômica para enfrentar a crise, também segundo o governo, terão impacto nas contas públicas de um valor equivalente a 3,76% do PIB.
Diante do cenário – que deve se concretizar de forma muito pior do que a previsão do governo, com recessão em 2020 –, já há quem defenda soluções que, antes, seriam impensáveis.
Veja três dos "remédios" que vêm sendo propostos por alguns economistas para a crise:
1. "Imprimir dinheiro" para dar mais liquidez à economia
A primeira solução foi defendida publicamente pelo ex-ministro da Fazenda e atual secretário de Fazenda e Planejamento de São Paulo, Henrique Meirelles. A ideia seria expandir a base monetária do país – o popular "imprimir dinheiro" –, de modo a prover mais liquidez para empresas e pessoas que estão em dificuldade.
Essa tarefa teria que ser realizada pelo Banco Central, autoridade monetária que é a única que tem a prerrogativa de emitir mais moeda. Na prática, isso não seria feito simplesmente com a impressão de mais notas de real. A ideia é de que o BC compre títulos públicos e privados no mercado secundário, colocando, assim, mais moeda em circulação.
Esse tipo de operação não é permitida hoje no Brasil, apesar de já ser realizada por autoridades monetárias de outros países. Na proposta de emenda à Constituição (PEC) 10/2020, que cria o chamado "Orçamento de Guerra", isso ficaria permitido somente durante o combate à pandemia.
O risco desse tipo de expansão monetária é de aumentar a inflação. Os defensores da medida, entretanto, apontam que a atividade já está muito fraca – e que, por isso, não haveria risco de aumento da inflação neste momento.
2. Aumentar a tributação sobre os mais ricos
Outra proposta revive uma ideia antiga, que é bandeira dos setores mais à esquerda no espectro político. Trata-se da famosa "taxação de grandes fortunas", isto é, da cobrança de um imposto que atinja a parcela de cidadãos mais ricos do país.
Isso seria feito por meio da criação do Imposto sobre Grandes Fortunas, que teria alíquotas de 1%, 2% e 3% incidindo sobre o patrimônio que for maior do que R$ 20 milhões, R$ 50 milhões ou R$ 100 milhões, respectivamente. O potencial de arrecadação de um imposto assim seria de R$ 40 bilhões por ano.
Há outras alternativas na mesa, como a criação da Contribuição Social sobre Altas Rendas de Pessoas Físicas (CSPF), que teria alíquota de 20%. Pela proposta, a CSPF incidiria sobre os rendimentos que ultrapassem os R$ 80 mil por mês.
Entidades defensoras da criação da contribuição, como a Associação Nacional dos Auditores Fiscais da Receita Federal do Brasil (Anfip) e o Instituto Justiça Fiscal (IJF), afirmam que a nova contribuição poderia aumentar a arrecadação do governo em R$ 72 bilhões por ano.
Outra opção seria aumentar a Contribuição Social sobre o Lucro Líquido (CSLL), cobrando uma alíquota adicional de 30% de instituições financeiras e de empresas de alguns setores.
O fim da isenção de Imposto de Renda sobre lucros e dividendos de pessoas físicas, algo que já vem sendo estudado pelo governo desde muito antes da pandemia, também é sugerido como forma de aumentar a arrecadação do governo neste período de crise.
3. Usar as reservas internacionais para abater a dívida pública
Por fim, outra alternativa para capitalizar o governo neste momento de crise seria usar as reservas internacionais para bancar o aumento de gastos do poder público para enfrentar a crise. A medida foi defendida pelo próprio ministro Paulo Guedes. Em reunião virtual com senadores no dia 11 de abril, Guedes afirmou que é "incongruente" que um país tenha reservas de quase R$ 2 trilhões, mas esteja com uma dívida de R$ 4 trilhões.
"O Brasil não precisa de todo esse volume em divisas internacionais, talvez a metade disso. Assim, passada a crise, nada impede que possamos utilizar esse montante para pagar a conta da crise e até reduzir nosso endividamento", disse o ministro, segundo relatos dos senadores.
Nos últimos meses, o BC já utilizou parte das reservas internacionais para tentar controlar a desvalorização do real frente ao dólar. Segundo dados da própria autoridade monetária, o Brasil tem mais de US$ 343,1 bilhões em reservas.
A dívida pública, por sua vez, tende a crescer durante a crise, já que o governo deve precisar de recursos extras para bancar políticas de socorro à economia e para compensar a perda de arrecadação advinda da desaceleração da atividade. A Instituição Fiscal Independente (IFI), ligada ao Senado Federal, prevê que a dívida chegue a 84,9% do PIB em 2020. Sem a venda de reservas, segundo a IFI, o endividamento pode chegar a 87,9% só neste ano.
Economistas que discordam desse posicionamento, como Monica de Bolle, dizem que se desfazer das reservas agora é não pensar nas possíveis necessidades do país no futuro. "Nesse momento, nenhum país no mundo está sendo penalizado por fazer medidas de estímulo fiscal. Muito pelo contrário. As pessoas estão preocupadas com os países que estão fazendo pouco para combater a crise. O momento é de gastar e emitir mais dívida. Ter pudores em fazer isso é não enxergar direito a situação", disse a economista, em live no seu canal no YouTube.
Ela defende, portanto, que o país guarde suas reservas para poder utilizá-las quando chegar o momento de voltar ao ajuste fiscal, no pós-crise.