O ministro Celso de Mello, do Supremo Tribunal Federal (STF), completa 75 anos no dia 1.º de novembro, o que o fará ter de se aposentar compulsoriamente, de acordo com e legislação. Com isso, será aberta a primeira vaga na Corte a ser preenchida por uma indicação do presidente Jair Bolsonaro (sem partido). E essa escolha terá de ser submetida ao Senado. Embora historicamente a tendência seja de aprovação das indicações presidenciais, Bolsonaro pode enfrentar problemas dependendo do nome que escolher e de como estiver o clima entre o Planalto e o Congresso nesse período.
Alguns nomes são apontados como possíveis escolhas de Bolsonaro para o cargo. Os ministros Jorge Oliveira (Secretaria-Geral) e André Mendonça (Justiça) estão entre os cotados – a favor deste último pesa o fato de ser evangélico, já que Bolsonaro disse, em mais de uma ocasião, que gostaria de apresentar um candidato "terrivelmente evangélico" para a corte.
O ministro do Tribunal Superior do Trabalho (TST) Ives Gandra Martins Filho é também um dos especulados, assim como o juiz Marcelo Bretas, que conduz ações da operação Lava Jato no Rio de Janeiro.
No ano passado, Bolsonaro falou que havia firmado um "compromisso" para indicar o então ministro Sergio Moro (Justiça) para a função, algo descartado nos dias atuais, após o rompimento entre eles. O presidente chegou a falar também que gostaria de ver o procurador-geral Augusto Aras no STF. Mas, em postagem no dia 29 de maio, declarou que o chefe do Ministério Público Federal (MPF) não deverá ser um de seus escolhidos.
A indicação por parte do presidente da República é o primeiro passo de um processo que tem no Senado suas etapas decisivas. Após a apresentação do nome pelo chefe do Executivo, o selecionado é sabatinado pela Comissão de Constituição, Justiça e Cidadania (CCJ), e tem sua aprovação apreciada pelos integrantes do colegiado.
Se a CCJ votar a favor da indicação, o nome segue para o plenário, onde é apreciado pela totalidade dos senadores. Apenas com a maioria de votos nesta última etapa é que o escolhido pelo presidente se torna, de fato, apto a ser ministro do STF.
CCJ não é terreno fácil para governo
A CCJ, ponto inicial da tramitação da indicação ao STF no Senado, não é necessariamente um ambiente tranquilo para o governo. A presidente da CCJ é a senadora Simone Tebet (MDB-MS), que adotou postura crítica à gestão Bolsonaro em diferentes ocasiões – por exemplo, contestou a atuação do presidente no combate à pandemia de coronavírus; viu com preocupação as falas de Moro durante a saída do ex-ministro do governo; e votou a favor do projeto das fake news, atacado pelos bolsonaristas.
Além disso, entre os titulares da CCJ, não há nenhum líder ou vice-líder do governo no Senado ou no Congresso.
Um dos oposicionistas que integra a CCJ, o senador Humberto Costa (PT-PE) prefere não arriscar um palpite sobre como o nome de Bolsonaro tramitaria dentro da comissão. "Tudo depende de diversos fatores. Primeiro, de quem seria esse nome. Das ideias que esse nome represente. Também de como o Supremo receberia esse nome. E da relação do presidente com o Congresso na época da tramitação da indicação", afirma.
Outro senador da CCJ, Alessandro Vieira (Cidadania-SE) também acredita que fatores de momento serão decisivos para ditar os rumos da indicação. "Bolsonaro pode ter sucesso ainda que escolha um nome fora do roteiro tradicional, desde esse nome tenha qualificação para o cargo. E eu cito o caso da nomeação de Augusto Aras como exemplo. Ele foi escolhido como chefe do MPF vindo de fora da lista tríplice elaborada pela categoria, totalmente em desacordo com o habitual. Mas foi ao Senado e demonstrou ter capacidade. E eu, que estava reticente, acabei votando a favor", afrima Vieira.
O senador acrescenta que considera "democrática" a ideia de Bolsonaro apontar, para o cargo, um ministro de perfil conservador, como o próprio presidente indicou em algumas ocasiões. "Não há problemas quanto a isso. Só não é adequado que seja uma pessoa que não tenha formação."
Vieira ressalta, entretanto, que o tema da indicação ainda não ganhou corpo entre os debates com mais força no parlamento. "O que se fala sobre isso é mais da necessidade de nós, senadores, termos rigor durante a sabatina."
Rejeição de indicações para o STF é exceção das exceções
Ainda que a CCJ crie dificuldades para o nome escolhido por Bolsonaro, uma rejeição definitiva é cenário pouco provável. O histórico do Senado indica isso: ao longo dos mais de 130 anos de República, houve apenas cinco derrubadas de indicações ao STF, todas durante o mandato de Floriano Peixoto, o segundo presidente da história do Brasil.
O habitual é que a CCJ submeta o indicado a uma sabatina dura, mas com uma votação pouco conflituosa. Foi o que aconteceu em 2017 com Alexandre de Moraes, o único selecionado durante o mandato de Michel Temer (MDB). Ele foi interrogado pela CCJ por 12 horas e questionado sobre temas como um suposto plágio em um trabalho acadêmico e uma atuação como advogado da facção criminosa Primeiro Comando da Capital (PCC). Apesar dos questionamentos, Moraes foi aprovado na CCJ com 19 votos a favor e 7 contrários. Posteriormente teve, no plenário, o "sim" de 55 dos 81 senadores.
Mais tensa foi a sabatina pela qual passou o hoje ministro Edson Fachin, em 2015. Na ocasião, o país vivia o primeiro ano do segundo mandato da então presidente Dilma Rousseff (PT), e o clima de instabilidade política que culminaria no impeachment da petista. A sabatina de Fachin representou parte da polarização que marcava o país e o jurista teve que responder a temas como o apoio que deu a Dilma na eleição de 2010 e sua vinculação com o Movimento dos Trabalhadores Sem-Terra (MST). Mas, assim como no caso de Moraes, a tensão não se reverteu em votos contrários: Fachin foi aprovado por 20 a 7 na CCJ e 52 a 27 no plenário do Senado.
Senado pode discutir mudanças na regra de indicação ao STF
Além dos nomes para a composição do STF, o Senado pode promover ainda em 2020 um debate sobre o sistema de escolha de ministros do Supremo. A troca de modelo foi definida no início do ano como uma das prioridades do Congresso pelo presidente do Senado, Davi Alcolumbre (DEM-AP).
Uma das propostas em tramitação, apresentada pelo senador Lasier Martins (Podemos-RS), é a de que o novo ministro do Supremo seja escolhido pelo presidente da República entre os nomes de uma lista tríplice, composta por um integrante selecionado pelo próprio STF, outro pela Ordem dos Advogados do Brasil (OAB) e outro pelo MPF. O projeto havia recebido resistência de bolsonaristas no ano passado, que questionavam a mudança nas regras durante o mandato do presidente. Mas a redação atual do texto, elaborada pelo senador Antonio Anastasia (PSD-MG), determina que as novas normas valeriam apenas a partir de 2023, já após o fim da gestão Bolsonaro.
Há ainda uma iniciativa em debate na Câmara dos Deputados para "revogar a PEC da bengala" – a emenda constitucional que elevou para 75 anos a idade da aposentadoria compulsória dos ministros do STF.
O objetivo da ideia é fazer com que a aposentadoria compulsória de ministros dos tribunais superiores volte a ocorrer aos 70 anos, como era até antes da aprovação da PEC da Bengala, em 2015. Isso levaria a uma renovação mais rápida da composição atual do STF. A deputada Bia Kicis (PSL-DF) é a autora da proposição.
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