Os ministros do Supremo Tribunal Federal (STF) decidiram nesta quarta-feira (7) que o julgamento de inquéritos e ações penais voltam a ser uma atribuição do plenário da Corte — hoje, eles são analisados pelas turmas. Com isso, processos criminais que envolvem réus com foro privilegiado, como os da Operação Lava Jato, que atualmente tramitam apenas na Segunda Turma, passarão a ser julgados pelo conjunto dos 11 ministros do STF e não mais apenas pelos cinco integrantes do colegiado.
A mudança no Regimento Interno da Corte, proposta pelo novo presidente do Supremo, Luiz Fux, na abertura da sessão plenária desta quarta, pode ser considerada uma vitória da Lava Jato. Investigações e condenações no âmbito da operação vinham sofrendo derrotas seguidas nos últimos meses na Segunda Turma justamente por causa do colégio de votos ser mais restrito.
Um dos membros, o ministro Celso de Mello, ficou ausente dos julgamento nas últimas semanas por razões médicas, o que reduziu para quatro o número de votantes no colegiado. Em geral, processos da Lava Jato estavam terminando empatados, o que beneficiava os réus. Agora, isso tende a acabar no plenário.
A mudança aprovada nesta quarta não impacta a análise do recurso do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva, que defende a suspeição do ex-juiz da Lava Jato Sergio Moro e a anulação da condenação aplicada contra ele no caso do triplex do Guarujá. Por duas razões: o caso que envolve o petista é um habeas corpus e Lula não tem foro privilegiado.
Considerado "lavajatista", Fux aproveitou brecha para mudar Regimento do STF
O julgamento de ações penais no Supremo Tribunal Federal ocorria tradicionalmente em plenário. Entretanto, após o processo do mensalão, que demandou um semestre inteiro para ser julgado, o STF decidiu transferir a análise de processos criminais para as turmas.
Essa mudança ocorreu em 2014 e, na época, o STF afirmou que a alteração no Regimento Interno foi para priorizar, em plenário, o julgamento de matérias constitucionais ou com repercussão geral (aquelas que afetam automaticamente ações semelhantes em tramitação no país).
Agora, após a adoção do chamado “plenário virtual”, no qual os ministros computam seus votos sem a necessidade de debates, o ministro Luiz Fux viu uma brecha para retomar a regra que estava em vigência até 2014. O presidente do STF elaborou então uma emenda para revogar trechos do Regimento Interno da Corte que previam a distribuição de ações penais para as duas turmas.
Internamente, a decisão do ministro Fux não foi bem acolhida por ministros "garantistas" como Gilmar Mendes, Dias Toffoli e Ricardo Lewandowski. Ambos são defensores de que inquéritos e ações penais não devem ser analisados pelo plenário sob a justificativa de que isso comprometeria a produtividade da Suprema Corte. Apesar disso, ao fim do debate, todos concordaram com a mudança.
“A proposta de retorno em plenário do STF restabelece uma situação tradicional. Tem também a marca da racionalidade, porque agora as turmas é que estão se inviabilizando”, disse o ministro Celso de Mello, decano do STF. “É importante restabelecer a competência no plenário para que em matérias tão delicadas, tão sensíveis, não se esvazie a competência penal originária do plenário do STF”, complementou Mello.
O ministro Marco Aurélio Mello ressaltou também que, ao contrário de 2014, agora o plenário tem condições de voltar a analisar ações penais pelo fato de que o próprio STF, em 2018, passou a entender que o tribunal julgará apenas ações penais relacionadas a políticos com foro privilegiado cujos crimes tenham ocorrido durante o exercício do mandato. “Houve uma diminuição substancial no número de processos e de inquéritos-crime (por conta daquela decisão). E, tanto quanto possível, nós devemos atuar no verdadeiro Supremo. Que é o revelado pelo plenário”, disse o ministro.
Em números, hoje o Supremo tem 166 inquéritos em tramitação, com 29 ações penais em curso nas turmas. Em 2018, antes da mudança de jurisprudência sobre o foro privilegiado, tramitavam na Corte 500 inquéritos e 89 ações penais.
O ministro Ricardo Lewandowski disse que aderiria à proposta, mas a título de “experiência”. Já Gilmar Mendes deixou claro o seu inconformismo com a mudança. Não necessariamente pela proposta, mas por ter sido pego de surpresa pela reforma regimental proposta por Fux.
“A mim me parece, e isso serve de aviso para outras situações, é que reformas regimentais devem ser primeiro avisadas aos ministros para serem discutidas. De fato, não faz sentido a gente chegar do almoço e receber a notícia de que tem uma reforma regimental”, disse o ministro. “Não me oponho (à mudança). Mas tome esse cuidado em relação aos colegas. Porque senão, de fato, então vamos fazer um ato institucional e se passe a fazer dessa forma. Não é assim que se procede”, complementou.
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