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Um vídeo de uma reunião de 5 de julho de 2022, encontrado no computador do ex-ajudante de ordens de Jair Bolsonaro (PL), tenente-coronel Mauro Cid, está sendo usado pela Polícia Federal para embasar parte das acusações contra o ex-presidente e aliados, na âmbito da Operação Tempus Veritatis, deflagrada na manhã desta quinta-feira (8). Na manhã desta sexta-feira (9), o vídeo foi divulgado à imprensa pelo Supremo Tribunal Federal (STF). Veja abaixo a íntegra.
Naquela ocasião, Bolsonaro estava reunido com Anderson Torres (então ministro da Justiça), Augusto Heleno (na época, chefe do GSI), Paulo Sérgio Nogueira (Defesa), Mário Fernandes (então chefe-substituto da Secretaria-Geral da Presidência), Walter Braga Netto (ex-ministro da Casa Civil e então candidato a vice-presidente), Paulo Guedes (ex-ministro da Economia) e outros ministros.
Bolsonaro questionou reiteradamente a lisura das eleições e pediu que uma nota conjunta sobre isto fosse assinada pelos integrantes da Comissão de Transparência Eleitoral. Bolsonaro ainda cobrou que seus ministros assumissem o mesmo discurso. Em um determinado momento, o então presidente disse que não se tratava de uma questão de usar força: "Não é dar tiro", disse.
Após a divulgação, um dos advogados de Bolsonaro e ex-secretário-executivo do Ministério das Comunicações e ex-chefe da Secretaria de Comunicação Social, Fabio Wajngarten fez uma publicação no X (antigo Twitter). "Todas as opiniões do Presidente são absolutamente públicas. Todas as opiniões, comentários fazem parte da democracia. Ficou absolutamente claro que o Presidente condena e rejeita qualquer uso da força", disse Wajngarten.
Veja a seguir o que Bolsonaro disse na referida reunião, segundo transcrições da PF e do vídeo que foi divulgado pelo STF.
Pressão a ministros
“Hoje me reuni com o pessoal do WhatsApp, e outras também mídias do Brasil. Conversei com eles. Tem acordo ou não tem com o TSE? Se tem acordo, que acordo é esse que tá passando por cima da Constituição? Eu vou entrar em campo usando o meu exército, meus 23 ministros”, disse o ex-presidente, conforme a transcrição da PF.
“E eu tenho falado com os meus 23 ministros. Nós não podemos esperar chegar 23, olhar para trás e falar: o que que nós não fizemos para o Brasil chegar à situação de hoje em dia? Nós temos que nos expor. Cada um de nós. Não podemos esperar que outro façam por nós. Não podemos nos omitir. Nos calar. Nos esconder. Nos acomodar. Eu não posso fazer nada sem vocês. E vocês também patinam sem o Executivo. Os poderes são independentes, mas nós dois somos irmãos. Temos um primo do outro lado da rua que tem que ser respeitado também. Mas todo mundo que quer ser respeitado tem que respeitar em primeiro lugar. E nós não abrimos mão disso”, afirmou ainda Bolsonaro na reunião, segundo a PF.
"Caos no Brasil"
Em outro momento da reunião, Bolsonaro diz que "se a gente reagir depois das eleições, vai ter um caos no Brasil".
"Nós sabemos que, se a gente reagir depois das eleições, vai ter um caos no Brasil, vai virar uma grande guerrilha, uma fogueira no Brasil. Agora, alguém tem dúvida que a esquerda, como está indo, vai ganhar as eleições? Não adianta eu ter 80% dos votos. Eles vão ganhar as eleições".
Nota conjunta sobre a falta de lisura das eleições
Mais à frente, num momento posterior da reunião, o ex-presidente ainda pediu uma nota conjunta dos integrantes da Comissão de Transparência das Eleições que declararia que "até o presente momento", no caso dia 5 de julho de 2022, a "lisura das eleições são simplesmente impossíveis de ser atingidas".
“Olhem pra minha cara, por favor. Todo mundo olhou pra minha cara? Acho que não tem bobo aqui. Pô, mais claro do que tá aí? Mais claro … impossível! Eu acredito que essa proposta de cada um da Comissão de Transparência Eleitoral tem que … quem responde pela CGU vai, quem responde pelas Forças Armadas aqui… é botar algo escrito, tá? Pedir à OAB. Vai dar… a OAB vai dar credibilidade pra gente, tá? Polícia Federal … dizer … que até o presen … uma nota conjunta com vocês, com vocês todos … topam … que até o presente momento dadas as condições de … de … se definir a lisura das eleições são simplesmente impossíveis de ser atingidas. E o pessoal assina embaixo. Além de eu falar com os embaixadores e pagar a missão pro … já que o Célio tá coordenando aqui … Célio, missão Célio, cê vai ver todos que integram a comissão de… Comissão de Transparência Eleitoral. Convidar todos pra semana que vem. Todos. Pra gente fazer uma reunião como o pessoal e eles.”
Preocupação com eleições e acusações contra Lula
Em outro trecho transcrito, Bolsonaro teria dito: “A Câmara deve votar hoje o … a PEC da Bondade, como é chamada, né? E não tem como, né, depois dessa PEC da Bondade, a gente … a gente não tá pensando nisso, manter 70% dos votos, ok? Mas a gente vai ter 49% dos votos, vou explicar por que, né?”.
Depois, teria dito que Lula seria financiado pelo narcotráfico. “É … Nós estamos vendo aqui a … não é toda a imprensa, uma outra TV e as mídias sociais sobre a delação do Marcos Valério. A questão da … da execução do Celso Daniel. Né? É … O envolvimento com o narcotráfico. É … Temos informações do General Carvajal lá da Venezuela que tá preso na Espanha. Ele … já fez a delação premiada dele lá. É… Por 10 anos abasteceu com o dinheiro do narcotráfico Lula da Silva, Cristina Kirchner, Evo Morales. Né? Essa turma toda que cês conhecem.”
Bolsonaro reforça desconfiança sobre pesquisas eleitorais e TSE de forma irônica
Bolsonaro, em seguida, comentou as pesquisas de intenção de voto, insinuando, com ironia, que elas trariam índices falsos para corresponder a um resultado que, antes da eleição, já estaria preparado no TSE para dar a vitória a Lula.
“E a gente vê que o Data Folha continua … é … mantendo a posição de 45% e, por vezes, falando que o Lula ganha no primeiro turno. Eu acho que ele ganha, sim. As pesquisas estão exatamente certas. De acordo com os números que estão dentro dos computadores do TSE. Né? E … Eu tô … Eu tenho que ter bastante calma, tranquilidade, e vou entrar em detalhes com vocês daqui a pouco”, disse o ex-presidente.
Bolsonaro nega usar violência
Em vários momentos da gravação, Bolsonaro faz menção aos possíveis resultados da eleição e as providências que podem ser tomadas. Em um desses momentos, ele enfatiza que não devem ser tomadas "providências de força".
“Nós vamos esperar chegar 23, 24, pra se f**r? Depois perguntar: porquê que não tomei providência lá trás? E não é providência de força não, pô! Não é dar tiro. Ô Paulo Sérgio, vou botar a tropa na rua, tocar fogo aí, metralhar. Não é isso, p*a!”, disse ainda.
Pressão sobre ministros e mais desconfiança sobre sistema eleitoral
Em outro momento, Bolsonaro diz: "Alguém tem dúvida do que vai acontecer no dia 2 de outubro? Qual resultado que vai estar às 22h na televisão? Alguém tem dúvida disso? Aí a gente vai ter que entrar com um recurso no Supremo Tribunal Federal... Vai pra p*a que o p*u, p*a. Ninguém quer virar a mesa, ninguém quer dar o golpe. Ninguém quer botar a tropa na rua, fechar isso, fechar aquilo... Nós estamos vendo o que está acontecendo. Vamos esperar o quê?", questiona o ex-presidente.
“Daqui pra frente quero que todo ministro fale o que eu vou falar aqui, e vou mostrar. Se o ministro não quiser falar ele vai vim falar para mim porque que ele não quer falar. Se apresentar onde eu estou errado eu topo. Agora, se não tiver argumento pra me ti… demover do que eu vou mostrar, não vou querer papo com esse ministro. Tá no lugar errado. Se tá achando que eu vou ter 70% dos votos e vou ganhar como ganhei em 2018, e vou provar , o cara tá no lugar errado”, afirmou Bolsonaro, no registro da PF.
“Porque os cara tão preparando tudo, pô! Pro Lula ganhar no primeiro turno, na fraude. Vou mostrar como e porquê. Alguém acredita aqui em Fachin, Barroso, Alexandre de Moraes? Alguém acredita? Se acreditar levanta o braço! Acredita que eles são pessoas isentas, tão preocupado em fazer justiça, seguir a Constituição? De tudo que são … Tão vendo acontecer?”, afirmou o presidente aos ministros.
Em seguida, ele mencionou a reunião que faria com embaixadores para tratar de uma investigação da PF sobre uma invasão hacker ao TSE em 2018, e sobre a imparcialidade dos ministros da Corte Eleitoral – por causa desse encontro, Bolsonaro foi declarado inelegível até 2030.
“Vou fazer uma reunião quinta-feira com embaixadores, semana que vem com mais, vou convidar autoridades do… do judiciário, pra outra reunião, pra mostrar o que tá acontecendo. (…) Não tem como esse cara ganhar a eleição no voto. Não tem como ganhar no voto. também, eu não vou passar aqui, em 2014 foi aprovado o voto impresso no Congresso, tá fora do foco, né, fora da … do radar nosso, nem lembrava disso, que depois também o nosso Supremo derrubou. O nosso Supremo aqui é um poder à parte. É um super Supremo. Eles decidem tudo. Fora … Muitas vezes fora das quatro linhas”, disse.
Em outro momento, mais à frente, Bolsonaro fez a seguinte afirmação:
“Pessoal, perder uma eleição não tem problema nenhum. Nós não podemos é perder a Democracia numa eleição fraudada! Olha o Fachin. Os cara não têm limite. Eu não vou falar que o Fachin tá levando 30 milhões de dólares. Não vou falar isso aí. O … que o Barroso tá levando 30 milhões de dólares. Não vou falar isso aí. Que o Alexandre de Moraes tá levando 50 milhões de dólares. Não vou falar isso aí. Não vou levar pra esse lado. Não tenho prova, pô! Mas algo esquisito está acontecendo.”