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Relator das ações no STF, ministro Gilmar Mendes defendeu direito à “autodeterminação informativa”| Foto: Rosinei Coutinho/SCO/STF

O Supremo Tribunal Federal (STF) determinou que, em até 60 dias, o governo altere a composição do Comitê Central de Governança de Dados, órgão ligado à Presidência que controla e fiscaliza a troca de dados pessoais de cidadãos dentro do Executivo e com outros Poderes. O órgão é composto apenas por representantes de ministérios do governo. Agora, deverá incluir integrantes de outras instituições e entidades civis.

Além disso, o governo deverá seguir uma série de requisitos para proteger os dados contra vazamento ou o uso indevido deles, por exemplo, para ações de inteligência sem previsão legal. A decisão atende parcialmente duas ações, uma da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB) e outra do PSB, que buscavam derrubar um decreto de 2019, do presidente Jair Bolsonaro, que regulamentou o compartilhamento de informações sobre os brasileiros dentro da administração federal.

O decreto foi mantido, mas os ministros do STF exigiram que o compartilhamento dos dados deve sempre seguir “propósitos legítimos, específicos e explícitos”, ser compatível com finalidades informadas para a execução de determinada política pública ou obrigação legal e limitar-se ao mínimo necessário. O acesso aos dados sensíveis pelos servidores deverá ser sempre justificado e registrado, de modo que eventuais abusos sejam rastreados e punidos. Cidadãos que tiverem a privacidade violada poderão ser indenizados pelo Estado e os responsáveis condenados por improbidade e em processos disciplinares internos.

No julgamento, que durou vários dias, o ministro Gilmar Mendes destacou também o direito dos cidadãos à “autodeterminação informativa”, definido como o poder de cada pessoa saber como suas informações pessoais são usadas e como pode limitar sua disponibilidade. Esse princípio, afirmou, deve impedir a “ampla, irrestrita e irresponsável difusão dos dados pessoais custodiados pelo Estado”.

Ele considerou que as regras sobre o compartilhamento de dados decretadas em 2019 “não abrem espaço para a instituição de uma base integradora descomunal”. Antes, contém “instrumentos de interoperabilidade aptos a simplificar o fluxo de dados entre órgãos públicos”.

O ministro se referia ao Cadastro Base do Cidadão, um banco de dados criado pelo decreto de 2019 que reúne informações sobre cada brasileiro a partir de seu CPF, que pode agregar dados biográficos – nome, data de nascimento, filiação, naturalidade, sexo, estado civil, grupo familiar, endereço e vínculos empregatícios – e também dados biométricos – palma da mão, as digitais dos dedos, a retina ou a íris dos olhos, o formato da face, a voz e a maneira de andar.

No voto, Gilmar Mendes reconheceu a importância de o governo manter a base de dados para dar eficiência às políticas públicas e obrigações legais perante os cidadãos. Mas reforçou a necessidade de haver “ferramentas rigorosas de controle de acesso a esse cadastro”, “seguramente a maior base de dados pessoais existente no território nacional”.

Gilmar foi seguido pela maioria dos ministros. No julgamento, apenas André Mendonça e Kassio Nunes Marques adotaram posição mais amena, no sentido de dar um prazo maior, até 31 de dezembro, para o governo recompor o comitê gestor dos dados.

Em sua ação, o PSB havia contestado um convênio, baseado no decreto, que possibilitava à Agência Brasileira de Inteligência (Abin) receber do Departamento Nacional de Trânsito (Denatran) dados de 76 milhões de brasileiros com habilitação de motorista. O acordo, no entanto, foi revogado pelo governo. No julgamento, a União defendeu a validade do decreto, com o argumento de que o cadastro possibilitou o avanço dos serviços públicos digitais, especialmente após o início da pandemia.

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