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A pouco menos de dois meses da aposentadoria do ministro Marco Aurélio Mello, do Supremo Tribunal Federal (STF), dois nomes aparecem como favoritos para serem escolhidos pelo presidente Jair Bolsonaro para a vaga que será aberta na Corte: o ministro da Advocacia-Geral da União (AGU), André Mendonça, e o presidente do Superior Tribunal de Justiça (STJ), ministro Humberto Martins.
Logo depois na lista de favoritos, vem o desembargador William Douglas, do Tribunal Regional Federal da 2.ª Região (TRF-2). Outros nomes – como o procurador-geral da República, Augusto Aras – correm por fora, com bem menos chances.
A escolha de um evangélico para o STF está praticamente sacramentada, pois essa foi uma promessa de Bolsonaro. André Mendonça e Humberto Martins cumprem esse requisito, além de agradarem ao presidente.
Mas há variáveis que têm levado Bolsonaro a refletir antes de bater o martelo. Uma delas é a viabilidade política. Qualquer indicado precisa ser aprovado pelo Senado. E, atualmente, cálculos políticos feitos pelo Palácio do Planalto não asseguram a aprovação de Mendonça, o nome favorito de Bolsonaro. Por esse motivo, ele poderia optar por Martins. Já William Douglas, que também é evangélico, vem sendo visto como a terceira via caso também haja algum empecilho na indicação do presidente do STJ.
A Gazeta do Povo elencou os pontos fortes e fracos de cada um dos principais cotados para assumir no STF a vaga de Marco Aurélio Mello, que se aposenta em 5 de julho.
André Mendonça: os pontos fortes e fracos na indicação ao STF
Pastor presbiteriano, o ministro da AGU André Mendonça tem o apoio de Jair Bolsonaro, da primeira-dama Michelle Bolsonaro e da maioria dos ministros de Estado.
Também é apoiado por associações e líderes evangélicos, tais como os pastores Silas Malafaia, líder da Assembleia de Deus Vitória em Cristo; Valdemiro Santiago, fundador da Igreja Mundial do Poder de Deus; e o bispo Robson Rodovalho, da Igreja Sara Nossa Terra.
A proximidade de André Mendonça com Bolsonaro rende a ele, naturalmente, um dos principais trunfos. Pessoas próximas do ministro da AGU afirmam ser comum os contatos telefônicos entre os dois, não apenas para assuntos da Advocacia-Geral da União. Quase diariamente pelas manhãs, por volta das 6h, por exemplo, o ministro faz uma oração com o presidente da República.
É esse contato próximo que levou Michelle Bolsonaro a torcer por Mendonça nos bastidores e engrossar o coro de lideranças evangélicas para que Bolsonaro o escolha para o STF.
Contudo, a proximidade entre o AGU e o presidente da República incomoda muitos integrantes do Judiciário e do Senado.
Nos bastidores, ministros do STF se articulam para barrar a indicação dele. A maioria deles rejeita o advogado-geral da União porque se sentiu "afrontada" com a forma "exagerada" que ele usou a Lei de Segurança Nacional (LSN) contra críticos do governo.
Além disso, também constrangeu ministros do STF o pedido de habeas corpus solicitado pela AGU ao general Eduardo Pazuello, ex-ministro da Saúde, para pode ficar em silêncio na CPI da Covid. "O único que o apoia [André Mendonça] é o [ministro Dias] Toffoli", afirma um interlocutor de um dos ministros.
Também haveria rejeição a Mendonça no Senado, responsável por aprovar ou rejeitar as indicações dos presidentes ao STF. Com o desgaste que o governo vem sofrendo na CPI da Covid, o clima dentre os senadores seria para barrar uma possível indicação dele.
O que favorece e desfavorece Humberto Martins
O presidente do STJ, Humberto Martins, um adventista do Sétimo Dia, tem aquilo que mais falta a André Mendonça: apoio político do Congresso e do STF.
O presidente da Câmara, Arthur Lira (PP-AL), é um dos principais apoiadores de Humberto Martins – ambos são de Alagoas. O apoio de Lira também garante a adesão do Centrão ao presidente do STJ. Humberto Martins também teria o apoio de importantes lideranças da Frente Parlamentar Evangélica.
Mas um fator que pesaria contra Humberto Martins é a proximidade do presidente do STJ com o senador Renan Calheiros (MDB-AL), outro alagoano. Aliados de André Mendonça entendem que a briga entre o senador Flávio Bolsonaro (Republicanos-RJ) com Renan Calheiros) na CPI da Covid, na última quarta-feira (12), pode desequilibrar a disputa a favor do titular da AGU.
Mas fontes do Congresso acreditam que o episódio da CPI não vai afetar a indicação de Humberto Martins, que inclusive teria a simpatia de Flávio Bolsonaro. "É conversa essa história de a indicação do Humberto azedou por conta de briga entre o Flávio e o Renan", diz uma fonte do Senado. E haveria outro fator. "Hoje, o Humberto [Martins] está mais próximo do Arthur [Lira] do que do Renan", diz um interlocutor na Câmara. Lira e Renan são adversários políticos em Alagoas.
William Douglas: as chances da 3.ª opção para o STF
O desembargador William Douglas, do TRF-2, corre por fora na disputa, mas não é carta totalmente fora do baralho. Pastor de Igreja Batista, Douglas não desfruta do mesmo apoio político do governo ou mesmo de parlamentares. Entre evangélicos, a avaliação é de que ele não circula com tanta desenvoltura nas redes políticas necessárias para ser indicado ao STF.
Ainda assim, tem apoios. No governo, ele conta com o apoio da ministra da Família, Mulher e dos Direitos Humanos, Damares Alves. E, no Congresso, tem respaldo de alguns congressistas da base bolsonarista, como a deputada Bia Kicis (PSL-DF), presidente da Comissão de Constituição e Justiça (CCJ) da Câmara.
Nos últimos tempos, ele começou a se aproximar de outras pessoas com influência com o presidente Bolsonaro. Em entrevista ao jornal Correio Braziliense, Douglas disse que o senador Flávio Bolsonaro e o deputado Eduardo Bolsonaro (PSL-SP) foram seus alunos, mas nunca foram de sua "convivência" ou do "círculo íntimo". "Agora, ele tem tentado se aproximar dos filhos [do presidente]", afirma um interlocutor bolsonarista.
Os mais próximos de William Douglas entendem que ele poderia ser uma alternativa caso Bolsonaro perceba que André Mendonça não tem chances de ser aprovado pelo Senado. "Ele é super bem quisto no Supremo. O Toffoli gosta dele, o Gilmar [Mendes] e o [Luís Roberto] Barroso também. E isso não traria problemas em passar no Senado", diz um interlocutor do desembargador.
Douglas também é apoiado por associações de magistrados e denominações religiosas, mas trabalha nos bastidores para ampliar o apoio entre lideranças evangélicas.
Quais são os outros cotados ao STF
Jair Bolsonaro tem outros seis nomes como opção para indicar para a vaga no STF que será aberta com a aposentadoria do ministro Marco Aurélio Mello. A possibilidade de serem escolhidos, contudo, é tida como muito baixa. Para uns, a única possibilidade de figurar qualquer outro nome é mediante a indicação de André Mendonça por Bolsonaro seguida de rejeição do Senado.
O procurador-geral da República, Augusto Aras, está nessa lista. A indicação de Aras foi aventada pelo próprio Bolsonaro quando sugeriu, em 2020, que, “se aparecer uma terceira vaga” ao STF, ele entraria “fortemente” no páreo.
Uma terceira indicação, contudo, seria possível apenas em caso de reeleição de Bolsonaro em 2002 ou da aprovação da chamada PEC da Bengala (159/19), que reduziria de 75 para 70 anos a idade para a aposentadoria compulsória de ministros do STF – aumentando o número de indicados a que Bolsonaro teria direito no atual mandato.
Além de Aras, correm por fora da disputa três ministros do STJ: Luis Felipe Salomão, Mauro Campbell e João Otávio de Noronha. O desembargador Thompson Flores, do Tribunal Regional Federal da 4.ª Região (TRF-4), também aparece como uma opção.
Outros cotado é o ministro Ives Gandra Martins Filho, do Tribunal Superior do Trabalho (TST). O magistrado do TST é bem quisto por militares, pela base bolsonarista, dentro do STF e até entre evangélicos. Mas corre por fora apenas por não ser evangélico, mas católico.
O mesmo vale para quaisquer outros dos cotados na "bolsa de apostas" para o STF. "O Aras, Salomão, Campbell, Noronha e Thompson tem chances se o André for recusado", analisa uma fonte com circulação nas Cortes Superiores.
As qualificações técnicas dos três favoritos
André Mendonça é advogado da União desde 2000. Ele é doutor e mestre em direito pela Universidade de Salamanca, na Espanha, onde publicou dois livros e artigos científicos.
O ministro Humberto Martins é bacharel em Direito e tem especialização em Direito Civil e Constitucional. Publicou livros e artigos antes e depois de sua indicação ao STJ. Foi professor da Universidade Federal de Alagoas (UFAL), procurador de Alagoas e presidente da seção alagoana da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB-AL).
Já o desembargador William Douglas é bacharel e mestre em Direito. Tem mais de 50 livros publicados no Brasil e no exterior. É magistrado de carreira desde 1993. Foi promovido a desembargador do TRF-2 por antiguidade e com votação unânime do plenário da Corte.