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O ministro Alexandre de Moraes, do Supremo Tribunal Federal (STF), suspendeu a nomeação do novo diretor-geral da Polícia Federal, Alexandre Ramagem. Na decisão, o ministro atendeu ao pedido de liminar impetrado pelo PDT. A cerimônia de posse estava marcada para esta quarta-feira (29), às 15 horas, no Palácio do Planalto.
Após a nomeação de Ramagem sair no Diário Oficial, diversas ações foram protocoladas na Justiça contestando a indicação. O delegado e atual diretor da Agência Brasileira de Inteligência (Abin) é amigo do vereador Carlos Bolsonaro (Republicanos-RJ), filho do presidente Jair Bolsonaro. Carlos é alvo de inquérito no STF que apura a disseminação de fake news na internet.
Na ação, o PDT alegou desvio de finalidade na nomeação, alegando que a intenção de Bolsonaro ao designar o novo chefe da PF é interferir na polícia para proteger a ele mesmo e a familiares que estariam no alvo de investigações em andamento.
“A vontade pessoal contida no ato, é de, através da pessoa do Litisconsorte (Ramagem), imiscuir-se na atuação ordinária da Polícia Federal, sobremodo, a do exercício exclusivo de função de polícia judiciária da União, perante esta Corte, inclusive. Pretendendo-se, ao fim, o aparelhamento particular – mais do que político, portanto – de órgão qualificado pela lei como de Estado”, diz trecho do mandado de segurança apresentado pelo partido.
Diante do exposto, Alexandre de Moraes deferiu a medida liminar e determinou a notificação imediata da decisão ao Palácio do Planalto. A troca da direção da PF foi pivô do pedido de demissão do ex-ministro da Justiça e Segurança Pública, Sergio Moro. O ex-juiz da Lava Jato não concordou com a saída do delegado Maurício Valeixo, por pressão de Bolsonaro, e acusou o presidente de tentar interferir politicamente na Polícia Federal. Essa denúncia é alvo de um inquérito aberto no STF a pedido da Procuradoria-Geral da República e cuja relatoria está com o ministro Celso de Mello.
“Tais acontecimentos, juntamente com o fato de a Polícia Federal não ser órgão de inteligência da Presidência da República, mas sim exercer, os termos do artigo 144, §1º, VI da Constituição Federal, com exclusividade, as funções de polícia judiciária da União, inclusive em diversas investigações sigilosas, demonstram, em sede de cognição inicial, estarem presentes os requisitos necessários para a concessão da medida liminar pleiteada”, afirma Moraes em seu despacho.
Leia a decisão de Alexandre de Moraes na íntegra
Por que nomeação de Ramagem é polêmica
A nomeação do delegado Alexandre Ramagem para o comando da PF causou polêmica devido à proximidade do delegado com a família Bolsonaro. Ele é amigo do vereador Carlos Bolsonaro (Republicanos-RJ), que é investigado em um inquérito comandado pela PF que corre no STF sobre disseminação de fake news.
Ramagem se aproximou do clã Bolsonaro após chefiar a segurança do candidato a presidente em 2018, durante a campanha presidencial. Com a vitória de Jair nas urnas, o delegado foi nomeado assessor na Secretaria de Governo, do ex-ministro Santos Cruz, e em seguida, por influência de Carlos, assumiu a direção-geral da Abin, o órgão de inteligência do governo. A posse de Ramagem na chefia da agência chegou a causar ruído porque tradicionalmente o posto era ocupado por funcionários de carreira.
Nas redes sociais, no fim de semana, o presidente rebateu uma internauta que apontou os laços de amizade de Ramagem com a família Bolsonaro. “E daí? Antes de conhecer meus filhos eu conheci o Ramagem. Por isso, deve ser vetado? Devo escolher alguém amigo de quem?”, escreveu, em tom irônico.
STF já barrou outras nomeações de presidentes
O presidente da República tem a prerrogativa para montar como bem entender o seu time de ministros e outros cargos de primeiro e segundo escalão, de acordo com a lei. Mas dois presidentes da República tiveram nomeações barradas pelo STF recentemente.
Em 2016, o ministro Gilmar Mendes acatou um pedido dos partidos PSDB e PPS e barrou a nomeação do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) como ministro da Casa Civil da então presidente Dilma Rousseff (PT).
A nomeação foi suspensa depois que o então juiz da Lava Jato, Sergio Moro, tornou públicas conversas telefônicas interceptadas pela Polícia Federal. Em um dos diálogos, Lula e Dilma conversavam sobre a nomeação e a conversa foi interpretada como obstrução de Justiça. Mais tarde, Moro foi repreendido pelo STF por divulgar o diálogo, já que Dilma tinha prerrogativa de foro e ele era juiz de primeira instância — a decisão só poderia ter partido do Supremo.
Em sua decisão, Gilmar Mendes argumentou com os princípios da moralidade e da impessoalidade para justificar o veto ao nome de Lula para assumir a Casa Civil de Dilma. O princípio da impessoalidade proíbe que atos administrativos estejam destinados ao atendimento de interesse particular ou se confundam com interesses particulares. Já o princípio da moralidade estabelece que o agente público precisa estar atento não apenas à norma jurídica, que é a lei, mas precisa estar restrito a uma lei ética e com a moralidade desse ato que ele está proferindo.
O outro precedente ocorreu em 2018, no governo Michel Temer (MDB). O então presidente tentou nomear a deputada Cristiane Brasil (PTB-RJ) para o Ministério do Trabalho e enfrentou uma longa batalha judicial. A posse dela foi suspensa por decisão da ministra Cármen Lúcia, então presidente do STF.
Filha do ex-deputado Roberto Jefferson (PTB-RJ), Cristiane tinha no "currículo" uma condenação por dívidas trabalhistas e, por isso, sua indicação ao Ministério do Trabalho foi contestada.