O Atlas da Violência – Retrato dos Municípios Brasileiros 2019 mostra que o tráfico de drogas e a disputa entre facções criminosas estão por trás das taxas de homicídio nas cidades mais violentas do país. O estudo analisou 310 municípios brasileiros com mais de 100 mil habitantes em 2017 e fez um recorte regionalizado da violência no país. O documento foi produzido pelo Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea) e pelo Fórum Brasileiro de Segurança Pública (FBSP).
Infográfico: veja a taxa de homicídio em cada um dos municípios avaliados
O Atlas, divulgado nesta segunda-feira (5), mostra que houve um crescimento das mortes nas regiões Norte e Nordeste influenciado principalmente pela guerra do narcotráfico, disputa por rotas de drogas e pelos conflitos entre facções. O mercado ilícito de madeira e mogno nas zonas rurais também é apontado como um dos principais causas dos assassinatos.
A conclusão é parecida com a revelada pelo Atlas da Violência divulgado meses atrás, que analisou as taxas de homicídio nos estados brasileiros.
O estudo divulgado nesta segunda-feira aponta para um crescimento abrupto nas taxas de homicídios em vários municípios ao longo da rota do Rio Solimões, na Amazônia. O motivo apontado para esse crescimento, segundo o Atlas, é a busca pelo controle do tráfico de drogas no Norte e no Nordeste do país.
A íntegra do Atlas da Violência: leia todo o conteúdo da pesquisa sobre homicídios nos municípios
120 cidades brasileiras são responsáveis por 50% dos homicídios
O Atlas mostra que a distribuição dos homicídios é concentrada em termos municipais. Em 2017, 50% dos homicídios registrados em todo o país estavam concentrados em 120 municípios.
Dessa lista, 16 municípios são do estado do Rio de Janeiro, 14 da Bahia e 10 de Pernambuco. A situação dos demais estados é a seguinte: Acre (com 1 município), Alagoas (2), Amazonas (1), Amapá (1), Ceará (8), Distrito Federal (1), Espírito Santo (4), Goiás (4), Maranhão (2), Minas Gerais (7), Mato Grosso do Sul (1), Mato Grosso (1), Pará (8), Paraíba (3), Tocantins (2), Piauí (1), Paraná (5), Rio Grande do Norte (5), Roraima (1), Rondônia (1), Rio Grande do Sul (8), Santa catarina (2), Sergipe (2) e São Paulo (8) também integravam a lista.
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O documento também mostra que 574 cidades concentraram 75% dos homicídios em 2017.
Situação nas capitais
As 11 capitais mais violentas do país em 2017 estavam nas regiões Norte e Nordeste, segundo o Atlas da Violência. A mais violenta era Fortaleza (CE), com uma taxa de 87,9 homicídios a cada 100 mil habitantes – um aumento de 69% em relação ao ano anterior e de 120% em relação a 2007, quando a taxa na capital cearense era de 39,9 homicídios a cada 100 mil. A Organização das Nações Unidas (ONU) considera epidêmicas taxas acima de 10 mortes a cada 100 mil pessoas.
Em segundo lugar aparece Rio Branco, no Acre, com uma taxa de 35,2 homicídios por 100 mil habitantes. O índice aumentou 35,2% em relação a 2016 e 157% em relação a 2007, quando era de 33,1.
Belém, no Pará, conseguiu diminuir em 3,1% o índice de homicídios em 2017 em relação ao ano anterior. Mesmo assim, aparece como a terceira capital mais violenta do país, com uma taxa de 74,3.
A lista segue com as capitais Natal/RN (73,4); Salvador/BA (63,5); Maceió/AL (60,2), Recife/PE (58,4); Aracaju/SE (57,4); Manaus/AM (55,9); Macapá/AP (54,1) e Boa Vista/RR (48,9).
Já as capitais com menores taxas de homicídio em 2017 foram São Paulo/SP (13,2); Campo Grande/MS (18,8); Brasília/DF (20,5); Curitiba/PR (24,6); Belo Horizonte/MG (26,7) e Cuiabá/MT (28,8). Todas apresentaram uma redução na taxa em relação aos índices em 2016.
O Atlas também mostra que as capitais com maior crescimento dos índices em 2017, em relação ao ano anterior, foram Florianópolis (+70,9%) e Fortaleza (+69,5%). Na outra ponta, as capitais que mais reduziram as taxas de homicídio no mesmo período foram Campo Grande (-28,9%) e Cuiabá (-26,3%).
Milícias: um ingrediente a mais para a violência no RJ
O Atlas também mostra que o Rio de Janeiro foi o estado mais violento na região Sudeste do país, com 45,2 mortes a cada 100 mil habitantes em 2017. Para efeitos de comparação, o estado de São Paulo, menos violento da região, tinha uma taxa de 14,3.
O Rio de Janeiro apresenta um componente a mais em comparação com outros estados: a presença das milícias que atuam no estado. A cidade do estado do Rio de Janeiro com a maior taxa de homicídio registrada em 2017 era Queimados (115,6 assassinatos a cada grupo de 100 mil moradores).
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O Atlas da Violência atribuiu a taxa a presença e disputa por território entre milícia e tráfico de drogas na região. “Além dos problemas históricos de violência no estado, que envolvem as escaramuças entre as três facções criminosas cariocas – CV, Amigos dos Amigos (ADA) e o Terceiro Comando Puro (TCP) –, nos últimos anos tem aumentado muito a presença das milícias, não apenas na capital, mas em muitas cidades do interior. A guerra entre grupos de milicianos e narcotraficantes, bem como entre esses últimos, tem contribuído para aumentar o número de mortes não apenas na região metropolitana, mas em todo o estado”, aponta o documento.
Investimento no sistema prisional e ausência de conflitos
No Espírito Santo, segundo o Atlas da Violência, apesar da existência de várias facções criminosas (como o PCC, CV, ADA e Primeiro Comando de Vitória), não houve nenhuma morte violenta nos presídios capixabas em 2015 e 2016. O fenômeno, segundo o estudo, possivelmente é um reflexo dos grandes investimentos para o saneamento do sistema prisional do estado feitos ainda em 2010, que garantiram o controle do sistema.
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Desenvolvimento humano como chave para entender taxas de homicídio
O Atlas da Violência - Retrato dos Municípios Brasileiros 2019 traz o desenvolvimento humano como chave para entender as taxas de homicídio nas cidades do país. Segundo o documento, as taxas de atendimento escolar entre 0 e 3 anos era maior em municípios menos violentos – considerando apenas as cidades com mais de 100 mil habitantes. Enquanto isso, a renda per capita da fatia mais pobre nos municípios com maior letalidade equivaliam a 40% do mesmo indicador dos municípios mais pacíficos em 2017.
O Atlas também concluiu que as condições habitacionais eram piores nas cidades mais violentas e que a média do percentual de jovens entre 15 e 24 anos que não estudavam, não trabalhavam e eram vulneráveis à pobreza era quatro vezes maior no conjunto dos municípios com as maiores taxas de homicídios.
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Dentro do grupo dos 20 municípios com menores taxas estimadas de homicídio por 100 mil habitantes no Brasil, 14 estavam no estado de São Paulo, três municípios se localizavam em Santa Catarina e outros três em Minas Gerais.
Já no grupo dos 20 municípios com mais de 100 mil habitantes mais violentos do país, 18 eram das regiões Norte e Nordeste. Nesta lista, 5 municípios eram da Bahia, 4 do Pará, 3 do Ceará, 2 do Rio Grande do Norte, 2 de Pernambuco. Os estados do Rio de Janeiro, Rio Grande do Sul, Sergipe e Acre tinham um município cada na lista.