O projeto de lei que vai taxar os fundos de investimentos exclusivos e offshore (PL 4.173/23) está pautado para ser discutido no plenário da Câmara dos Deputados nesta terça-feira (17) e poderá ser o primeiro grande teste de fidelidade da base governista após o ingresso de representantes do Centrão na Esplanada dos Ministérios.
Inicialmente, o presidente da Casa, Arthur Lira (Progressistas -AL) tinha acertado com o relator do projeto, deputado Pedro Paulo (PSD-RJ) e o colégio de líderes que a matéria seria apreciada em 24 de outubro, para que os parlamentares tivessem mais tempo de entender o texto e ele estivesse de volta de viagem oficial que faz à Índia e a China. Mas o governo quer votar logo o texto, considerado fundamental para a equipe econômica, e conseguiu acertar com o presidente em exercício da Casa, deputado Marcos Pereira (Republicanos-SP) a inclusão da matéria na pauta já para a próxima terça-feira (17).
Pereira confirmou à Gazeta do Povo que a taxação dos fundos offshore será pautada, mesmo com a ausência de Lira. A matéria teria apoio para ir a plenário, principalmente do governo, que busca mais uma forma de aumentar a arrecadação para auxiliar na meta de zerar o déficit público no próximo ano.
Relator diz que tributação vai ajudar a financiar sistema produtivo
O projeto de lei, que tramita em caráter de urgência e pode bloquear a pauta da Câmara se não for votado, prevê a cobrança de impostos sobre rendimentos de aplicações financeiras de pessoas físicas no exterior. O relator da matéria, deputado Pedro Paulo (PSD-RJ), ainda incluiu nesse mesmo PL uma outra proposta do Ministério da Fazenda para submeter os fundos de investimento fechados (ou exclusivos) à tributação periódica. As alíquotas ainda estão sendo discutidas no texto que será apresentado pelo relator. O deputado afirma que a expectativa é que a cobrança de imposto de renda sobre as aplicações resulte em um reforço de R$ 20 bilhões para os cofres públicos até 2026.
Em entrevista à TV Câmara, o relator explicou que ao tributar os fundos exclusivos, montados e estruturados para poucos investidores, o objetivo dos parlamentares é fazer com que o mercado de capitais ajude a financiar o sistema produtivo.
Os fundos exclusivos hoje só pagam imposto de renda no momento do resgate da aplicação, assim como os chamados fundos offshore, que somente são tributados quando o investidor traz os recursos do exterior para o Brasil.
Pelas novas regras, se aprovado o texto, quem tem menos de R$ 6 mil aplicados fora do país continua sem ser tributado; já as aplicações entre R$ 6 e R$ 50 mil pagarão 15% de imposto anualmente; enquanto as aplicações com mais de R$ 50.000,00 serão tributadas em 22,5%.
No caso dos fundos montados especificamente para um único investidor, o relator esclarece que a tributação será semestral e de 6%, com base no tempo de aplicação, para igualar as regras aos investimentos em fundos abertos.
A advogada Tatiana Villani, especialista em direito tributário, afirma que o projeto de taxação dos fundos alinha o Brasil às regras internacionais de tributação automática, em bases anuais, dos lucros de brasileiros que aplicaram no exterior. Para ela, "as novas regras tendem a gerar mais justiça tributária (pois afetam mais diretamente a população de alta renda, que tem mais acesso a investimentos no exterior), além de gerar mais receitas aos cofres públicos".
O advogado Felipe Santos Costa, da Comissão Especial de Assuntos Tributários da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB) do Rio de Janeiro, afirma que o projeto é importante para que o governo possa encontrar novas fontes de receita para zerar o déficit em 2024. "Não parece que haverá alternativa senão o governo começar a cortar as despesas para demonstrar que está realmente comprometido com a responsabilidade fiscal", pontua.
Além disso, o tributarista acredita que a base será testada pelo governo na votação, já que na discussão do projeto que reestabeleceu o voto de qualidade do Conselho Administrativo de Recursos Fiscais (CARF), os parlamentares votaram com o governo e foram depois surpreendidos pelo veto do presidente Lula a diversos dispositivos, o que foi visto como "uma quebra de acordo com o Congresso Nacional".
Por outro lado, o Centro de Liderança Pública (CLP) defendeu, no começo de outubro, que o projeto de lei pode, na verdade, resultar em uma queda de até R$ 13,5 bilhões por ano na arrecadação se houver uma migração de 10% dos "super-ricos" do país após a medida.
Na avaliação do deputado Gilson Marques (Novo-SC), o projeto é todo ruim. "O governo deveria fechar as torneiras. Não justifica tirar dinheiro do setor produtivo sem equilíbrio de contas e mandar para um governo que só quer gastar cada vez mais".
Tributação de fundos pode testar fidelidade ao governo
O professor de Ciências Políticas da Universidade de Brasília (UnB) Waldir Pucci acredita que ao tentar votar o projeto que tributa fundos exclusivos e fora do país o governo terá a primeira grande oportunidade de testar a fidelidade da base aliada que formou após a entrada de deputados no Centrão nos ministérios do Turismo, do Esporte e de Portos e Aeroportos.
"O governo precisa saber de fato quem o apoia, e depois da minirreforma ministerial não tivemos nenhum grande teste. Esse é um dos grandes objetivos da economia sob a tutela de [Fernando] Haddad [, ministro da Fazenda]. O governo está pressionando para colocar em pauta para saber o tamanho da fidelidade que vai ter, os posicionamentos do PP e Republicanos que acabaram entrando no governo", diz Waldir Pucci.
Já o cientista político Antônio Carlos de Almeida, diz que apesar do deputado Marcos Pereira garantir que há acordo para votar a tributação dos fundos na terça-feira (17), é pouco provável que isso ocorra. Segundo ele, o projeto até pode ser pautado, já que passa a trancar a pauta da Câmara dos Deputados, mas é difícil que seja mesmo discutido sem a presença de Arthur Lira. "Não passa de jogo de cena, para mostrar poder", opina.
Enquanto isso, a oposição na Câmara promete continuar obstruindo as votações. O vice-líder Maurício Marcon (PL-RS), afirmou que tanto o Partido Liberal quanto o Novo continuarão usando as táticas iniciadas há algumas semanas, para adiar o início das sessões e tentar dificultar o andamento das votações, em protesto contra o excesso de interferência do Judiciário no Legislativo; e pelo avanço de temas da chamada pauta de costumes na Casa. Os deputados querem avançar na análise de pautas que tratam do direito à vida e criminalização de posse de drogas, entre outras.
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