O país vai ganhar mais uma estatal dependente do Tesouro em 2020: a Telebras. Antes tratada como independente (aquela que em tese consegue se manter sozinha), a companhia acabou usando aportes de capital da União para pagamento de despesas básicas, como custeio e folha salarial, e por isso teve de ser reenquadrada pelo governo no orçamento do ano que vem. A informação consta do Projeto de lei Orçamentária Anual (PLOA) de 2020 enviado ao Congresso na última sexta-feira (30).
A nova classificação pode parecer, num primeiro momento, apenas burocrática. Mas não é. Ela traz mudanças significativas para a empresa e para o Orçamento da União. E caso a reclassificação não fosse feita, o governo poderia sofrer sanções, já que a alteração foi pedida pelo Tribunal de Contas da União (TCU), com base na Lei de Responsabilidade Fiscal (LRF).
Entenda o caso
A Telebras – uma estatal de telecomunicações – era até este ano classificada como empresa pública independente, de controle direto da União. Ela tem, inclusive, ações negociadas na Bolsa. O fato de ser classificada como independente lhe dá liberdade para manejar seu orçamento, com base em suas receitas e aportes de capital recebidos do governo e demais acionistas.
Só que o TCU identificou que a Telebras usou aportes de capital feitos pelo Tesouro para bancar despesas correntes, como folha de pagamento. Isso não é permitido para estatais independentes. Os aportes do Tesouro, no caso das estatais independentes, só podem ser usados para investimentos. Segundo o tribunal, a companhia recebeu R$ 1,85 bilhão de 2013 a 2017, dinheiro esse usado em parte para pagamento de despesas correntes.
Logo, o tribunal entendeu que a Telebras deve ser classificada como estatal dependente, e que o dinheiro que o Tesouro a envia não se trata de aumento de capital, e sim de subvenção para pagamento de despesas.
Diante do entendimento do tribunal, o ministério da Economia reclassificou a estatal como dependente a partir do orçamento de 2020.
O que muda para a União
Com isso, todas as despesas da Telebras para 2020 passam a constar do Orçamento federal projetado para o ano que vem, o que até agora não ocorria. Isso pressiona o Orçamento federal, que passa a contar com uma despesa a mais. E ajuda a aumentar o déficit da União.
Para 2020, a previsão do governo é que a Telebras gere uma despesa de R$ 741 milhões. Esse dinheiro já está separado no PLOA para aporte (subvenção) na companhia. Essa despesa foi incluída no orçamento do Ministério de Ciência, Tecnologia e Comunicações, pasta responsável pela estatal.
Um valor menor pode vir de fato a ser aportado pelo Tesouro na estatal, o que não é esperado, frente à baixa capacidade que ela tem de gerar receita. Em 2018, por exemplo, a Telebras teve receita líquida de apenas R$ 199,6 milhões.
O que muda para a companhia
Já a Telebras, ao ser classificada como dependente, ela perde a sua autonomia, pois seu orçamento passa para o controle da União. Além disso, ela não poderá mais pagar Participação nos Lucros e Resultados (PLR) aos empregados nem Remuneração Variável Anual (RVA) aos diretores.
A estatal também pode ser obrigada pelo governo a fechar seu capital, ou seja, sair da Bolsa de Valores, já que foi classificada como empresa dependente da União.
“Sugere-se à gestão da empresa avaliar a conveniência e oportunidade de realizar fechamento de capital junto à Comissão de Valores Mobiliários, tendo em vista a aparente incompatibilidade na atuação de uma empresa de capital aberto que receba recursos do controlador para pagamento de despesas com pessoal e de custeio em geral”, diz ofício do ministério da Economia.
A companhia afirmou em comunicado ao mercado que vai tentar reverter seu enquadramento com estatal dependente.
Telebras na lista de privatização
Com a Telebras, o país passará a ter 19 estatais dependentes. Ou seja, empresas públicas que precisam que o governo envie dinheiro anualmente para bancar suas despesas, pois não geram receita suficiente para isso.
A expectativa, porém, é que isso dure pouco tempo, pois a estatal de telefonia foi incluída na lista de possíveis privatizações do governo Bolsonaro. O caso ainda está em estudo pelo Programa de Parcerias e Investimentos (PPI), mas a intenção é privatizá-la até 2022.
Na semana em que o governo anunciou esse objetivo, as ações ordinárias da empresa, pouco negociadas, chegaram a subir mais de 1.000% no acumulado de algumas sessões. Nos papéis preferenciais, mais negociados, a valorização passou de 200%.