A união da chamada terceira via em torno de uma única candidatura a presidente ainda permanece apenas uma ideia. Mas, pouco a pouco, pré-candidatos e outros nomes identificados com o centro político ensaiam aderir à possibilidade de abrir mão de seus próprios projetos eleitorais para ampliar as chances de superar a atual polarização entre o presidente Jair Bolsonaro e o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) para as eleições de 2022.
O cenário de união é tido como possível por lideranças político-partidárias de partidos envolvidos nas conversas. Na quinta-feira (7), três pré-candidatos da terceira via – os governadores João Doria (PSDB-SP) e Eduardo Leite (PSDB-RS) e o ex-ministro da Saúde Luiz Henrique Mandetta (DEM/União Brasil) – participaram de um evento e se comprometeram a trabalhar juntos para fortalecer um nome alternativo às candidaturas de Bolsonaro e Lula.
Um pouco antes disso, na segunda-feira (4), o governador de São Paulo, João Doria, embora não tenha aberto mão de seu projeto presidencial, sugeriu que pode abdicar de sua candidatura caso isso evite a pulverização de candidaturas de centro. No último dia 29, Doria já havia jantado com o ex-juiz Sérgio Moro (outro pré-candidato) e Luiz Henrique Mandetta.
Ciro Gomes (PDT) é outro pré-candidato que vem se movimentando para tentar unir mais nomes do centro no entorno de seu projeto. Ele tem conversado com o apresentador de TV José Luiz Datena (PSL/União Brasil), outro presidenciável. E já recebeu sinalizações positivas do deputado Rodrigo Maia (ex-DEM-RJ) e de ACM Neto (DEM/União Brasil). Ciro também participou, em 12 de setembro, das manifestações contra Bolsonaro convocadas pelo Movimento Brasil Livre (MBL) – da direita não alinhada com o governo federal.
Qual é a chance de haver união entre Doria, Leite, Moro e Mandetta
O movimento de Doria foi visto como animador dentro de partidos de centro-direita. Mas lideranças político-partidárias ainda dizem que a ideia precisa amadurecer. Alguns, entendem que as discussões precisam ser mais inclusivas, desprendidas de vaidades. Outros, defendem a evolução das conversas e a confirmação de pré-candidaturas.
O deputado federal Paulo Abi-Ackel (PSDB-MG), vice-líder do partido na Câmara e presidente do diretório mineiro tucano, acredita ser "perfeitamente possível" uma união do centro. "Desde que o candidato seja bem quisto e tenha bom diálogo com as demais forças políticas de centro", diz ele.
Abi-Ackel apoia, nas prévias do PSDB, o governador do Rio Grande do Sul, Eduardo Leite, para ser o candidato a presidente do seu partido. Mas ele diz que a evolução das conversas sobre união passa pelo posicionamento de nomes como Moro. "Não acredito que ele participará das discussões como candidato. Moro não se colocou como pré-candidato ainda porque todo mundo sabe que ele tem uma certa dificuldade de transitar no universo político. Ele tem consciência. É muito inteligente, mas não há uma única declaração dele nesse sentido", diz Abi-Ackel.
O deputado José Nelto (Podemos-GO), vice-líder do partido na Câmara, acredita na possibilidade de o centro caminhar junto e defende uma possível candidatura de Moro. "Ele já teve uma reunião com o Podemos e começa, agora, a se movimentar. Ele ainda não declarou, mas eu acredito que é preciso haver um processo de amadurecimento político dessa terceira via, que é como um jogo de xadrez: saber jogar na hora certa, se posicionar e recuar", avalia.
O deputado federal Júnior Bozzella (PSL/União Brasil-SP), vice-presidente nacional do PSL, acredita que a ideia de uma candidatura única é um caminho natural, mas evita dizer que isso vai acontecer. "Se vai ser única e exclusiva, eu acho um pouco mais complexo. Mas podemos discutir a depuração, o afunilamento e a redução do número de candidaturas", pondera.
O União Brasil, formado pela fusão do PSL com o DEM, cogita lançar candidato a presidente, que pode ser Mandetta, Datena ou o presidente do Senado, Rodrigo Pacheco (DEM/União Brasil-MG). Pacheco também avalia migrar para o PSD para concorrer ao Planalto.
Bozzella explica, entretanto, que o debate de união vai depender de como o processo político se desenvolverá nos próximos meses. "Os quadros políticos precisarão ter a grandeza e sabedoria para se sentar numa mesa e chegar a uma conclusão, claro, capitaneada pelos partidos."
Qual a chance de haver união da terceira via para lançar Ciro Gomes
Uma união da centro-direita com a centro-esquerda para lançar Ciro Gomes (PDT) com candidato único da terceira via é menos possível do que uma união que inclua Moro, Doria e Mandetta.
Lideranças de partidos de centro-direita acham improvável uma união entre os dois centros, embora haja quem não ache que isso seria impossível.
O deputado Paulo Abi-Ackel (PSDB-MG) não acredita na possibilidade uma união da terceira via com a centro-esquerda. "Ciro não tem dado sinais de fazer esse movimento com o centro. Está garantindo que é candidato em qualquer circunstância", diz o presidente do diretório mineiro tucano. "E não acredito que o ACM [Neto] o apoiaria. Vejo o ACM muito mais vinculado ao Mandetta e os partidos que se assemelham ao DEM, como o PSDB", complementa.
ACM Neto é apontada por parte dos políticos como uma liderança capaz de intermediar uma união da centro-direita com Ciro. "O ACM é muito próximo ao Ciro e já deu essas pistas e dicas. Uma hora, ele fala do Eduardo Leite. Mas a gente sabe que tem proximidade com o Ciro", sustenta um influente aliado de ACM.
A aproximação entre Ciro e Datena é, contudo, insuficiente para selar uma união entre os centros. Dentro do PSL/União Brasil (partido ao qual o apresentador de TV está filiado), esse movimento é visto como um ato isolado de Datena para buscar protagonismo. "É uma questão de ego [do Datena], que acha que tem que ser consultado", diz uma liderança do PSL/União Brasil. Segundo ele, a intenção de Datena seria se filiar ao PDT e compor a chapa presidencial com Ciro, como vice; ou lançar-se candidato a governador de São Paulo ou senador.
Lideranças de partidos da terceira via entendem ainda que uma união da centro-direita com a centro-esquerda está muito mais no campo especulativo do que num cenário eleitoral real. Uma análise feita é de que esse "centro absoluto" poderia, na prática, ser insuficiente em reter todo o eleitorado de centro-direita e centro-esquerda sob o discurso de enfrentar dois adversários em comum. Incertezas quanto a unificação de agendas – como a econômica – sobre uma chapa única poderiam, assim, causar fuga de eleitores.
Por isso, o cenário padrão considerado majoritariamente pela terceira via é trabalhar a candidatura única no espectro dos partidos de centro-direita para superar Bolsonaro no primeiro turno de 2022. Lideranças afirmam que, na atual polarização, o atual presidente é o candidato mais possível de ser batido. Lula hoje demonstra ter uma posição mais consolidada como provável candidato que estará no segundo turno.
União de nomes da terceira via pode evoluir a partir de abril
A despeito dos primeiros movimento para uma união da terceira via, é improvável que uma união de nomes seja confirmada ainda em 2021. As prévias do PSDB, por exemplo, que decidirão se o candidato tucano será Doria ou Leite, ocorrerão em 21 de novembro. Somente depois disso, com o nome tucano definido, é que ele poderia negociar uma união com pré-candidatos de outros partidos da terceira via.
A avaliação feita por lideranças é que o debate pode evoluir somente a partir de abril de 2022. Entre março e abril abre-se a chamada janela partidária, período para a filiação de candidatos e a migração de deputados para outra legenda sem o risco de perder o mandato. Para o "xadrez político", só após esse período os partidos terão a "fotografia" real para onde cada quadro foi, onde se instalaram e quais são as forças políticas.
A partir de abril, com o cenário de realinhamento e adequação melhor definido, seria possível avaliar a união da terceira via – embora as conversas entre pré-candidatos possam evoluir nesse período.
O prazo também permitirá que legendas e pré-candidatos analisem qual nome é mais forte e, em tese, mais viável de capitanear uma candidatura única da terceira via, segundo as pesquisas eleitorais.
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