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A maioria dos ministros do Supremo Tribunal Federal (STF) acolheu a tese da Procuradoria-Geral da República (PGR) de que os eventos de 8 de janeiro resultaram de um “crime multitudinário”, ou seja, cometido por uma multidão, em que as pessoas envolvidas influenciavam umas às outras com o objetivo comum de derrubar o governo do presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) por meio de violência ou grave ameaça e impedir ou restringir o exercício dos poderes Judiciário e Legislativo.
O entendimento foi apresentado durante o julgamento de Aécio Lúcio Costa Pereira, primeiro condenado do 8 de janeiro. Mas trata-se de uma tese que poderá agora ser aplicada aos demais 231 réus presos em flagrante nos edifícios-sede dos Poderes ou na Esplanada dos Ministérios, em Brasília.
Com isso, não será necessária uma individualização detalhada da conduta de cada um para uma condenação. “Em crimes em multidão, entendo que todos devem responder pelo resultado comum. O autor estava ciente de sua atuação em harmonia com os atos de todos que ali estavam, em uma concorrência de vontades bem caracterizada. Os agentes envolvidos na prática criminosa exerceram influência uns sobre os outros”, disse Cristiano Zanin na sessão desta quinta.
“Os crimes multitudinários envolvem delitos praticados em contexto de massa, com participação difusa, de grande quantidade de pessoas, muitas das quais sem qualquer inter-relação prévia, estabelecida em data anterior. As dificuldades observadas para detalhar a conduta de cada elo dessa multidão, todavia, não pode conduzir à letargia dos órgãos responsáveis pela persecução penal, sob pena de eventos criminosos, extremamente graves e extremamente disruptivos do tecido social tornarem-se, na prática, imunes à própria jurisdição criminal do Estado”, afirmou a presidente da Corte, Rosa Weber.
Advogado critica aplicação da tese no STF
Nesta quinta (14), durante o julgamento do segundo réu do caso, o advogado Hery Waldir Kattwinkel Junior criticou aplicação da tese pelos ministros. Segundo ele, ao julgar crimes cometidos por uma multidão, o juiz deve saber diferenciar condutas de grupos distintos, de modo a não condenar inocentes.
“Temos sim, mesmo com crimes multitudinários, grupos. Existem grupos executores, mas existem grupos manifestantes. Não podemos colocar no mesmo balaio aquelas pessoas que estiveram com pensamentos psicológicos diferentes”, disse o advogado.
Ele deu como exemplo casos de brigas de torcidas organizadas em estádios. “Se uma torcida organizada começar a brigar com a outra, daqui a pouco estou respondendo pelos crimes ali cometidos só pelo simples fato de estar no estádio. Porque eu fui com a mesma vontade, de assistir a uma partida, da mesma forma que quis a torcida organizada. Só naquele meio tempo mudou, e eles quiseram partir para a briga. E não é porque estou perto que esteja participando daquilo e com vínculo psicológico para aquilo”, afirmou.
“É preciso também, no caso dos executores [do ato de 8 de janeiro], estabelecer em que grupos havia a mesma motivação. Grupos que queriam depredar, grupos que queriam defender, grupos que estavam ali, sim, para se manifestar”, finalizou.