A retomada das atividades econômicas em várias cidades e estados do país expôs um problema que é velho conhecido de muitos brasileiros: ônibus, trens e metrô cheios e terminais de transportes com muita aglomeração. Cenas cotidianas para quem precisa usar o transporte coletivo sempre mostram como é complexo o trabalho de tentar conter a disseminação da Covid-19 no Brasil. Especialistas demonstram preocupação com a possibilidade de o transporte coletivo se tornar o grande vetor do novo coronavírus nas cidades com a retomada do comércio, principalmente.
Dentro de um coletivo é quase impossível manter o distanciamento social – e sobra para motoristas e cobradores a missão de controlar a quantidade de passageiros, que nem sempre usam máscaras. Álcool gel? Só se for de uso pessoal.
Nem todos os estados e municípios brasileiros proibiram a circulação do transporte coletivo durante a pandemia. A medida rígida foi adotada em Santa Catarina, por exemplo. No estado, a reabertura do comércio foi autorizada antes da retomada dos serviços de transporte municipais e intermunicipais – decreto do governador repassou aos prefeitos a responsabilidade de decidir se os sistemas voltam a operar ou não.
Em outras localidades, como é o caso de Curitiba, o sistema nunca parou de funcionar, mas passou a circular com a frota reduzida. Menos ônibus circulando poderiam ser vistos como uma forma de desincentivar o seu uso, mas também eram uma medida necessária para adequar os custos do transporte para as empresas operadoras. De março para cá, a quantidade de passageiros transportados despencou, mas os custos fixos não caíram na mesma medida.
Em muitas cidades, para evitar aglomerações em terminais e pontos de ônibus e dentro dos coletivos, será necessário ampliar a frota disponível, independentemente dos custos envolvidos. E quando se fala de custos, isso implica tanto os gastos das empresas de transporte quanto eventuais aportes que o poder público pode ter de fazer para subsidiar os sistemas.
Riscos de contaminação são altos no transporte coletivo
Epicentro da Covid-19 no Brasil, as decisões tomadas pelo estado de São Paulo e suas cidades acabam sendo mais ruidosas. Foi assim com a decisão de reabrir o comércio de rua na capital e a orientação de que só circulem passageiros sentados nos ônibus, para evitar aglomerações. O caso de São Paulo expôs receios de especialistas em mobilidade urbana e infectologia, sobretudo pela má qualidade dos sistemas de transportes públicos do Brasil.
“Não se pode garantir controle de transmissão com gente dentro do ônibus”, afirmou Domingos Alves, professor da Faculdade de Medicina da USP Ribeirão Preto. Para ele, o ponto é que nenhum país do mundo que obteve sucesso nas medidas pós-Covid-19 trabalhou com quarentena e relaxamento da mobilidade simultaneamente.
O engenheiro Ailton Brasiliense Pires, presidente da Associação Nacional de Transportes Públicos (ANTP), lembra que é praticamente impossível praticar o distanciamento social dentro dos ônibus. “Não há frota suficiente para atender às condições de segurança determinadas pela saúde para prevenir contra o novo coronavírus”, disse.
Ele ainda defende que haja uma orientação mais clara e incisiva quanto ao uso de máscara – nível de proteção dentro dos ônibus, quantidade de trocas diárias e afins. Outro ponto destacado por ele é a necessidade de se adequar horários de entrada e saída de trabalhadores para diminuir a quantidade de pessoas circulando nos coletivos nos horários de pico.
O infectologista Lauro Ferreira Pinto Neto, da Sociedade Brasileira de Infectologia e professor da Santa Casa de Vitória, considera o uso do transporte público o maior desafio brasileiro para evitar um agravamento das contaminações por Covid-19. “É preciso retomar a discussão sobre como melhorar o transporte público. O uso de máscaras ajuda, mas não é suficiente para proteger os passageiros dentro da aglomeração do transporte público”, afirmou.
Estratégias variadas para uso do transporte
Cada cidade ou estado adotou uma estratégia diferente para o transporte – seja optando pela suspensão do serviço ou redução da frota. Nessa fase de retomada, em comum em todas as localidades é a indicação de uso obrigatório das máscaras individuais dentro dos coletivos.
Em Santa Catarina, um decreto do governo estadual determinou a suspensão do transporte coletivo no estado a partir de 19 de março. Depois, vários serviços foram sendo retomados e houve uma flexibilização do isolamento no estado, mas a restrição para o transporte permaneceu.
Também por determinação do Executivo estadual, os prefeitos poderiam decidir sobre a retomada ou não desses serviços a partir de 8 de junho – a autorização só valeu para ônibus municipais e intermunicipais. Os veículos de transporte interestadual – públicos ou privados – e serviços de fretamento e turismo seguem vetados até agosto.
Nem todas as cidades aderiram de cara. A capital Florianópolis, que ficou mais de 30 dias sem registrar mortes por coronavírus, só vai reiniciar o serviço em 17 de junho. E vai fazer adaptações: não será mais aceito pagamento em dinheiro, apenas cartão; os veículos passarão por higienização especial e só poderão circular com 40% da ocupação. A prefeitura pretende disponibilizar álcool gel e também um sistema voluntário de check-in, por QR Code. A ideia é poder rastrear quem usou qual linha para uma comunicação efetiva em caso de contaminação pela Covid-19.
Em Curitiba, prefeitura, comércio e empresas de ônibus estão tentando achar uma solução para evitar aglomerações nos veículos e terminais. De acordo com as empresas de ônibus, quase metade do tráfego diário de passageiros ocorre nos horários de pico (entre 6h e 8h e 16h30 e 19h30). Na capital paranaense, a média diária de passageiros transportados registrou uma forte queda: antes da pandemia, eram transportados 754 mil passageiros e agora são menos de 300 mil.
A Urbs, responsável pela gestão do sistema em Curitiba, está mapeando o uso do transporte para propor um escalonamento de horários e adaptações nas linhas. As empresas de transporte sugerem escalonamento do horário do comércio para evitar aglomerações.
Em São Paulo, o prefeito Bruno Covas (PSDB) pediu que as empresas de ônibus disponibilizem mais 2 mil coletivos para a retomada dos serviços na capital, e evitar aglomerações. Não tem funcionado por lá. A frota de trens e metrôs também será ajustada.
A prefeitura de Fortaleza, cidade que retomou atividades gradualmente em junho, optou por instalar uma câmera térmica em um dos sete terminais fechados de ônibus do município. Assim, faz a triagem de passageiros que apresentem quadros de febre e orienta a buscar atendimento de saúde. Caso a prática apresente bons resultados, será replicada em outros terminais de transporte e órgãos da prefeitura.
No Rio de Janeiro, a situação é difícil. A lotação do transporte nunca diminuiu, mesmo quando o isolamento não havia sido flexibilizado. Na última semana, o ônibus seguiam atulhados. O BRT Transoeste, por exemplo, circulou superlotado apesar de a prefeitura determinar que ninguém pode entrar nos coletivos depois que os assentos estiverem ocupados. A alegação da concessionária que administra o serviço é de que apenas os agentes públicos podem impedir o acesso dos passageiros, mas intervenções pontuais dos agentes não têm funcionado.
O estado do Rio também encerrou as restrições a trens, barcas e metrôs do transporte intermunicipal. No metrô e trem, a ocupação fica limitada a 50% da capacidade. No caso das barcas, poderão embarcar a quantidade de passageiros equivalente ao número de assentos da embarcação.
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