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Água no Nordeste

Após 14 anos, transposição do Rio São Francisco entra na reta final

Comporta de Salgueiro (PE) da obra de transposição do Rio São Francisco foi inaugurada pelo presidente Jair Bolsonaro.
Comporta de Salgueiro (PE) da obra de transposição do Rio São Francisco foi inaugurada pelo presidente Jair Bolsonaro. (Foto: Isac Nóbrega/PR)

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O primeiro "milagre" da transposição do Rio São Francisco foi em 2017, quando o rio salvou 500 mil paraibanos da severa estiagem que atingiu o estado. Agora, passados quatro governos e 14 anos da instalação da pedra fundamental, a obra que desloca parte das águas do "Velho Chico" entra na reta final.

Na semana passada, o presidente Jair Bolsonaro inaugurou mais um trecho no município de Salgueiro (PE), da obra que foi tirada do papel em 2007 no governo Lula, avançou nas presidências de Dilma Rousseff e Michel Temer, e deve ser concluída na atual gestão. O prazo de conclusão foi adiado várias vezes e agora a nova previsão é junho do ano que vem.

O São Francisco nasce na Serra da Canastra (MG), percorre 2.800 quilômetros e deságua em Penedo (AL). A transposição é a maior obra hídrica já realizada no país. Soma 477 quilômetros de extensão com 13 aquedutos, nove estações de bombeamento, 28 reservatórios, nove subestações de energia, 270 quilômetros de linhas de transmissão em alta tensão e quatro túneis.

Assim que for completado, o projeto deve beneficiar 12 milhões de pessoas em 390 municípios no Ceará, Paraíba, Pernambuco e Rio Grande do Norte, estados historicamente vulneráveis à seca.

A obra é dividida em dois eixos: o leste, que tem 217 km, deve levar água a 5,5 milhões de habitantes de 170 cidades de Pernambuco e da Paraíba; e o norte, com 260 km, deve garantir segurança hídrica a mais de 6,5 milhões de pessoas em 220 cidades paraibanas, pernambucanas, cearenses e potiguares.

Orçado em R$ 4,5 bilhões, ao longo dos anos o projeto viu aumentar os custos ambientais e de engenharia. Até hoje o governo federal já desembolsou R$ 10,8 bilhões, mais que dobro do previsto.

Em março de 2017, Michel Temer fez uma inauguração às pressas do eixo leste. Lula e Dilma também participaram de um ato simbólico de inauguração no mesmo ano para reivindicar a paternidade petista do projeto. Agora foi a vez de Jair Bolsonaro abrir mais uma comporta.

Cada eixo está 97% finalizado, mas faltam obras complementares que, de acordo com o Ministério do Desenvolvimento Regional, não comprometem a pré-operação. O eixo leste já abastece 1,4 milhão de pessoas em 46 cidades pernambucanas e paraibanas, cerca de 1/4 do potencial, segundo o governo.

Risco de transposição virar "elefante branco" ainda preocupa

Agora que água no agreste chegou o que fazer com ela? Essa é a questão que mais preocupa Francisco Sarmento, professor da Universidade Federal da Paraíba e engenheiro que trabalhou por 14 anos no projeto, sob as gestões Itamar Franco, FHC e Lula.

“A inércia é total em termos de elaboração e implementação de políticas públicas. Nas duas esferas: federal e estadual”, critica o especialista que defendeu o projeto por muitos anos, mas hoje se diz decepcionado. Ele vê risco alto de que a transposição se torne um "elefante branco" no coração do Nordeste.

A obra tem capacidade projetada de bombeamento de 126 m³ por segundos, sendo 99 m³/s no eixo norte e 27 m³/s no leste. Um volume de água “cavalar”, segundo Sarmento, que supera amplamente as necessidades da população e da agricultura. A capacidade instalada, contudo, é de 24 m³/s no eixo norte e 14 m³/s no leste, segundo o ministério.

Apesar das repetidas inaugurações, ainda faltam os serviços ditos complementares, mas que na verdade são essenciais para o bom funcionamento da obra, como a drenagem dos canais para impedir o rompimento em caso de chuva forte, as estradas de acesso, a instalação das bombas e o sistema operacional.

Algumas dessas obras nem foram licitadas. “Hoje está tudo parado, debaixo das intempéries”, afirma Sarmento. O problema é conhecido pelo governo, que anunciou que, terminada a transposição, vai iniciar a fase de revitalização do rio, ainda esse ano.

“Não adianta ter a água correndo e o rio estar morto, assoreado, com as margens aterradas, matas ciliares mortas, com as nascentes ser ter reposição das águas”, disse o ministro do Desenvolvimento Regional, Rogério Marinho, em maio.

A revitalização consiste em tratar esgoto e resíduos sólidos nas quase mil cidades cortadas pelo rio, plantar matas ciliares e fazer o desassoreamento para retomar a capacidade de navegabilidade.

Para não deixar o rio minguar sob o "sol de rachar" do semiárido, o  governo Temer aventou a possibilidade de entregar a gestão da obra à iniciativa privada por meio de parcerias público-privadas (PPP), mas a hipótese até agora não avançou.

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