O presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) e a diplomacia brasileira lamentaram a morte do presidente do Irã, Ebrahim Raisi, e do chanceler iraniano, Hossein Amir Abdollahian, que morreram em um acidente de helicóptero neste domingo (19). Desde seu primeiro mandato, Lula defende a comunicação com o Teerã e buscou estabelecer uma relação com o país. Aproximação essa que foi observada com cautela pelas nações do Ocidente.
Em sua conta no X, o antigo Twitter, Lula manifestou pesar pela morte das autoridades iranianas e enviou condolências aos familiares de todas as vítimas, ao governo e ao povo iraniano. O Palácio do Itamaraty teve posicionamento parecido sobre a tragédia. Em nota, a pasta afirmou que a notícia foi recebida com "profunda consternação".
Conhecido como “carniceiro de Teerã", Raisi entrou no radar de sanções dos Estados Unidos e foi considerado responsável pela supervisão administrativa da execução de menores à época de seus supostos crimes. Washington também o responsabilizou pelo envolvimento na repressão violenta dos protestos do oposicionista Movimento Verde após as contestadas eleições presidenciais de 2009.
Além dos crimes cometidos contra os direitos humanos, sobretudo no que diz respeito às mulheres, o Irã também é acusado de apoiar e financiar grupos terroristas, como o Hamas na Palestina, Hezbollah no Líbano e os Houthis no Iêmen. O país ainda possui um preocupante programa nuclear e é acusado de enriquecer urânio para produzir armas nuclear.
Lula, porém, sempre foi um defensor do diálogo com o Irã. Em seus primeiros mandatos, apostou na aproximação e nas trocas diplomáticas com o Teerã, com a justificativa do comércio bilateral.
O petista ainda tentou costurar um acordo "amigável" entre o Irã e o Ocidente sobre o programa nuclear do país. A medida foi observada com apreensão pelas nações ocidentais, sobretudo pelos Estados Unidos.
Lula tentou intermediar acordo nuclear do Irã
Em meio à aproximação do Brasil com o Irã, sob os interesses de Lula, o petista, que estava em seu segundo mandato, tentou se projetar como um intermediador do Oriente Médio com as nações Ocidentais.
Em meados de 2009, o Conselho de Segurança da ONU estava prestes a aprovar uma série de sanções contra o Irã com o intuito de fazê-lo parar com o enriquecimento de urânio.
Enquanto Teerã argumentava que o programa tinha fins civis, o Ocidente alegava que o governo iraniano estava enriquecendo o elemento com o intuito de produzir uma bomba atômica — o que o Irã sempre negou.
O mandatário brasileiro, então, tentou intervir nas negociações. Lula queria que as partes chegassem a um acordo "amigável", evitando que o Irã fosse mais uma vez sancionado.
O brasileiro fez declarações de apoio ao autocrata iraniano Mahmoud Ahmadinejad ao defender que o país pudesse “desenvolver tecnologia nuclear para fins pacíficos”. Sob a liderança de Lula o Brasil formulou, junto com a Turquia, o Acordo do Teerã em 2010, mas a iniciativa não foi aceita pelos Estados Unidos.
À época, conforme revela documentos do Wikileaks — plataforma sem fins lucrativos que publica documentos confidenciais e sigilosos de organismos governamentais — , a diplomacia norte-americana trocou diversas mensagens sobre a aproximação do Brasil com o governo iraniano.
"A intensificação do relacionamento de longa distância de Lula da Silva
com o Irã. Por enquanto, o caso de amor iraniano-brasileiro não vai muito além da retórica, mas Washington vê uma necessidade crescente de manter sob controle o aventureirismo da política externa de Lula, especialmente quando se trata de o Brasil forjar laços nucleares e bancários com o Irã", diz um dos documentos trocados entre representantes da diplomacia estadunidense em 2010.
Mais tarde, os Estados Unidos chegaram a um acordo com o Irã. O Plano de Ação Conjunta Global (JCPOA, na sigla em inglês) foi firmado em 2015 e estabelecia controle ao desenvolvimento nuclear do Irã em troca de alívio aos embargos impostos ao país. O tratado, contudo, foi abandonado três anos mais tarde pelo então presidente dos Estados Unidos, Donald Trump.
Brasil adotou tom brando para bombardeio iraniano em Israel
No sentido oposto do Ocidente, o presidente Lula sempre se opôs às sanções impostas ao Irã, apesar do extremismo e das graves acusações feitas contra o país. No último ano, o mandatário brasileiro se encontrou com o presidente iraniano Ebrahim Raisi. A reunião ocorreu à margem da Cúpula dos Brics, em Joanesburgo, na África do Sul.
Com Lula, Raisi falou sobre o desejo de ampliar a relação comercial com o Brasil. O Irã foi o país do Oriente Médio que mais importou produtos brasileiros em 2022. No ano passado, o fluxo comercial entre as duas nações chegou a US$ 2,3 bilhões. O mandatário brasileiro justifica essa comércio com o Irã para manter os diálogos com o país, que é alvo de sanções das democracias ocidentais.
Recentemente, a diplomacia brasileira foi questionada ao comentar um bombardeio do Irã contra Israel. Em 13 de abril, o Irã fez um ataque com cerca de 300 drones e mísseis contra Israel, mas o sistema de defesa aéreo israelense interceptou 99% dos projéteis. Foi o primeiro ataque dessa natureza do Irã contra Israel, conforme afirmou o embaixador do país no Brasil, Daniel Zonshine.
Em nota, o Ministério de Relações Exteriores afirmou que “acompanha com grave preocupação” os ataques iranianos. O posicionamento brasileiro foi considerado insuficiente para a diplomacia israelense e gerou uma repercussão negativa para o Brasil. A postura foi comparada à uma nota divulgada pelo Itamaraty dias antes, quando "condenava" um bombardeio feito ao consulado do Irã na Síria.
O chanceler Mauro Vieira foi questionado sobre a nota classificada como "amena" e afirmou que o texto havia sido escrito no começo dos ataques, durante a noite, quando o Itamaraty ainda não sabia a real extensão dos ataques. O ministro salientou ainda que o Brasil "condena qualquer ato de violência", mas que um novo posicionamento não seria divulgado.
Brasil se absteve em votação da ONU para investigar abusos de direitos humanos no Irã
Ainda em abril deste ano, o Brasil se absteve de votar sobre uma investigação contra o Irã no Conselho de Direitos Humanos (CDH) das Nações Unidas.
Aprovada com maioria, a resolução pede a investigação da violação de direitos contra mulheres, crianças e minorias étnicas no Irã. Em sua justificativa para não apoiar a determinação, o Brasil alegou que o Irã tem cooperado com as investigações desde que ela tiveram início.
"No entendimento de que o Irã fortalecerá os esforços para melhorar a situação de direitos humanos no país e baseado no espírito do diálogo construtivo, o Brasil vai se abster. Encorajamos o Irã a seguir aumentando seu envolvimento com mecanismos de direitos humanos num espírito de cooperação e abertura”, declarou Tovar da Silva Nunes, embaixador do Brasil na ONU.
Na votação que deu início à essa investigação, em novembro de 2022, o Brasil também se absteve de votar. Esse processo teve início depois da morte de Mahsa Amini, jovem iraniana que foi presa por, supostamente, usar o véu islâmico de forma incorreta.
Tovar Nunes externou que o Brasil "continua profundamente preocupado” com as violações de direitos humanos no país, em especial contra mulheres, crianças e minorias religiosas. Em seu discurso, o embaixador pediu o fim da pena de morte.
A Missão Internacional Independente de Apuração dos Fatos, como a resolução foi denominada, foi aprovada por 24 votos favoráveis, 8 contras e 15 abstenções. Além do Brasil, Bangladesh, Camarões, Costa do Marfim, Geórgia, Gana, Índia, Cazaquistão, Kuwait, Quirguistão, Malásia, Maldivas, Qatar, África do Sul e os Emirados Árabes Unidos se abstiveram. Argélia, Burundi, China, Cuba, Eritreia, Indonésia, Sudão e Vietnã votaram contra.
Irã passou a integrar o Brics, com apoio dos países fundadores do bloco
Indo mais uma vez na contramão dos países do Ocidente, o Brics (acrônimo para o bloco formado por Brasil, Rússia, Índia, China e África do Sul) aprovou a entrada de mais seis países ao bloco a partir do começo deste ano. O Irã foi um deles, ao lado de Arábia Saudita, Egito, Emirados Árabes e Etiópia — todos considerados ditaduras de acordo com o Ranking de Democracia do jornal inglês The Economist.
De acordo com o próprio bloco, mais de 40 países tinham interesse em integrar o Brics e 22 fizeram uma solicitação formal. Os critérios para a escolha dos cinco anunciados não ficou claro, mas analistas traçaram à Gazeta do Povo anteriormente o que pode ter motivado as escolhas dos países-membros.
Com a maioria no alvo de sanções das nações ocidentais, os países escolhidos possuem um histórico de oposição aos Estados Unidos, discurso parecido com o da China que é o país com maior influência no bloco atualmente. A entrada do Irã no Brics reforçou ainda o teor político e de antiamericanismo do bloco, que tem sido pautado pela Rússia e sobretudo pela China.
A participação e reprodução dos discursos do Brics pelo Brasil têm deixado as democracias ocidentais em alerta. Países da União Europeia já externaram tal preocupação e membros da diplomacia norte-americana já condenaram algumas declarações do presidente Lula.
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