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Membros da comunidade de ucranianos e seus descendentes que vivem no Brasil preparam uma onda de manifestações contra a visita do chanceler russo Sergey Lavrov ao país na segunda-feira (17).
Assim, os protestos estão marcados para acontecer às 12h30 em quatro cidades brasileiras: Brasília, São Paulo, Rio de Janeiro e Curitiba.
Ou seja, a comunidade ucraniana não reprova o fato do Brasil manter diálogo sobre comércio com a Rússia. Mas, seus membros pedem que o presidente Luiz Inácio Lula da Silva pare de tomar partido de Moscou na guerra da Ucrânia sob a alegação de estar promovendo a paz.
Ao longo das últimas semanas, Lula vem promovendo não apenas uma intensificação das relações comerciais, mas uma aproximação política com a Rússia e com a China, países que se alinharam com o Irã e a Coreia do Norte contra os Estados Unidos e a Europa após a volta da guerra de alta intensidade ao território europeu no ano passado.
O presidente petista vem adotando o discurso alinhado ao eixo Moscou-Pequim de tentar mudar a geopolítica mundial exercendo antagonismo ao Ocidente. Assessores de Lula têm minimizado suas declarações e argumentado que o Brasil quer dialogar tanto com a Rússia e a China como com os Estados Unidos e seus aliados.
"Não temos intenção de nos afastar de nenhum parceiro comercial, sobretudo da qualidade dos EUA. Nós estamos fazendo um esforço de aproximação, queremos investimentos do EUA no Brasil", disse Haddad durante a visita da comitiva brasileira à China.
Lula admitiu que não tem plano de paz para a Ucrânia
Na última sexta-feira (14), o petista admitiu que não possui um plano de paz para a Ucrânia, como vinha anunciando desde fevereiro, e acusou os Estados Unidos e seus aliados europeus de ajudar a Ucrânia a atacar a Rússia. A visão troca os papéis de vítimas e agressores e está alinhada com uma campanha mundial de desinformação patrocinada pelo Kremlin.
O principal argumento do presidente brasileiro para tratar do assunto internacionalmente era tentar mediar um acordo de paz entre Moscou e Kyiv. Mas, quando foi questionado pela TV estatal chinesa CCTV, na última sexta-feira, sobre qual era exatamente sua estratégia, Lula foi evasivo e disse que não tem um plano específico.
Segundo uma fonte ligada à organização dos protestos que pediu para não ser identificada, o grupo teme que o próximo passo de Lula seja determinar às Forças Armadas brasileiras que participem de exercícios militares conjuntos com a Rússia.
O governo da África do Sul foi alvo do mesmo tipo de ofensiva diplomática russa e aceitou neste ano participar de manobras militares navais coordenadas pelo Kremlin.
Russo visitará ditaduras na Venezuela, Nicarágua e Cuba, onde não haverá manifestações
Lavrov deve se encontrar com o chanceler brasileiro Mauro Vieira e negociar uma viagem de Lula para Moscou. Depois de passar por Brasília, o alto funcionário do Kremlin vai visitar as ditaduras da Venezuela, da Nicarágua e de Cuba, que são as principais parceiras de Moscou na América Latina.
Até o momento, não há previsão de protestos nesses países que usam grandes aparatos de repressão a manifestações populares.
“Defendemos o reforço da cooperação russo-latino-americana com base no apoio mútuo, na solidariedade e tendo em conta os interesses um do outro”, escreveu Lavrov em artigo publicado pela revista mexicana Buzos de la Noticia.
A ação faz parte de uma tentativa do Kremlin de conseguir novos aliados na África e na América Latina em um esforço de confrontar os Estados Unidos e a União Europeia.
Representante ucraniano encara visita de russo com desgosto
Procurado pela reportagem por causa das possíveis manifestações contra o chanceler russo, o representante consular da Ucrânia em São Paulo, Jorge Rybka, disse não ver problemas no Brasil manter relações diplomáticas com quem quiser. Mas, afirmou que a visita de Lavrov ocorre em um momento complicado.
"Entendemos que o Brasil tem todo o direito e legitimidade de manter relações diplomáticas com as nações com as quais tem negócios. Mas o momento é complicado pois a agressão russa à Ucrânia continua. Nós vemos a visita de Lavrov com estranhamento e desgosto", afirmou.
"Gostaríamos que o Brasil continuasse a votar como fez na Assembleia da ONU reprovando a invasão russa", disse. No final de fevereiro, o Brasil votou favoravelmente a uma resolução da ONU exigindo que Moscou retire suas tropas dos territórios invadidos na Ucrânia. China, África do Sul, Índia e Irã se abstiveram.
Mas, na mesma ocasião, em um aceno a Moscou nas entrelinhas, o Brasil se absteve em duas votações secundárias que tentavam descaracterizar a resolução principal contrária à invasão.
Lavrov traz carga secreta de 5 toneladas, diz TV
De acordo com o portal R7 da TV Record, o chanceler russo está trazendo em seu avião uma carga secreta classificada como mala diplomática que não é sujeita à averiguação de autoridades brasileiras. O veículo de imprensa especulou que podem ser desde armamentos da equipe de segurança de Lavrov, material de uso bélico até dinheiro não declarado.
O Brasil depende atualmente de importações de fertilizantes da Rússia para manter todo o setor do agronegócio. Esse fato vem sendo utilizado pelo presidente Vladimir Putin para conseguir concessões políticas desde o início da guerra na Ucrânia no ano passado.
O conflito também fez as importações de diesel aumentarem. Após sofrer sanções econômicas do G-7, o grupo das maiores economias do planeta, a Rússia vem oferecendo derivados de petróleo por preços abaixo do mercado para nações não alinhadas com as potências ocidentais.
Em anos anteriores, o Brasil até flertou com a Rússia para tentar obter a tecnologia de propulsão nuclear para seu submarino Alvaro Alberto, que vai ser construído em Itaguaí, segundo fontes ligadas às Forças Armadas ouvidas pela reportagem.
Manifestações contra russo podem ocorrer na Esplanada dos Ministérios
A comunidade ucraniana e de descendentes de ucranianos no Brasil tem mais de 600 mil integrantes. Os protestos estão marcados para acontecer no momento em que Lavrov fará seu pronunciamento à imprensa, às 12h30 de segunda-feira (17).
A principal manifestação deve ocorrer em Brasília na Esplanada dos Ministérios, em frente ao Palácio do Itamaraty. Membros da comunidade russa contrários ao regime de Vladimir Putin e da comunidade bielorrussa também devem participar. Além deles haverá ativistas brasileiros e ucranianos.
Também haverá manifestações em São Paulo, no consulado russo na Avenida Lineu de Paula Machado, no Butantã; no Rio de Janeiro, no consulado da Avenida Professor Azevedo Marques, no Leblon, e em um local ainda não definido em Curitiba.