A recente decisão do ministro Gilmar Mendes que eliminou as condenações do ex-ministro José Dirceu na Lava Jato é apenas a ponta do iceberg. Aguardam decisões semelhantes no Supremo Tribunal Federal (STF) vários outros notórios réus processados por corrupção, lavagem de dinheiro e outros delitos descobertos na operação que desmantelou o esquema de desvios na Petrobras e suas subsidiárias.
O ex-diretor de Serviços da estatal Renato Duque, que segundo as investigações recolhia propina em favor do PT, recorreu à Segunda Turma da Corte contra a decisão de Dias Toffoli, em julho, que negou a anulação de seus processos e um pedido para que não fosse preso. O recurso para se livrar de 39 anos de pena de prisão será julgado por Gilmar Mendes, André Mendonça, Edson Fachin e Nunes Marques, mas ainda não há data marcada para a análise.
Assim como Dirceu e vários outros réus já beneficiados, ele alega ter sido vítima de perseguição política e “conluio” dos procuradores da extinta força-tarefa de Curitiba com o ex-juiz Sergio Moro. Alguns réus conseguiram se livrar das penas com essa narrativa no STF; outros tiveram provas anuladas, mas Toffoli, que concentra em seu gabinete esses pedidos, têm enviado muitos deles para as instâncias inferiores onde tramitam as ações penais.
Além de Dirceu, conseguiram anular suas condenações no STF o presidente Luiz Inácio Lula da Silva, em 2021, o vice-presidente Geraldo Alckmin, os empresários Walter Faria e Paulo Skaf, o ex-ministro Paulo Bernardo Silva, o prefeito do Rio Eduardo Paes, o ex-presidente da Eletronuclear Othon Luiz Pinheiro da Silva, e o ex-ministro Edison Lobão, por exemplo.
Ultimamente, Toffoli – que herdou o processo do ministro aposentado Ricardo Lewandowski – tem atendido pedidos individuais para anular as provas oriundas do acordo de leniência da Odebrecht. Com essa decisão, abre o caminho para que os réus esvaziem as denúncias e processos penais que respondem nas diversas instâncias onde seus casos tramitam.
Em setembro do ano passado, o ministro já havia declarado a imprestabilidade de todas essas provas, mas vários réus buscaram no STF uma decisão individual nesse sentido, para adiantar a anulação de seus processos e evitar idas e vindas nas instâncias inferiores.
Além de Duque, o ex-tesoureiro do PT João Vaccari Neto quer se livrar das condenações. Para isso, recorreu a Gilmar Mendes com argumentos semelhantes aos de Dirceu, de que sua sentença foi política. O pedido foi apresentado em outubro do ano passado. Em abril deste ano, o procurador-geral da República se manifestou contra, sob o argumento de que não há provas de perseguição. Desde então, o pedido está parado sobre a mesa de Gilmar Mendes.
Também aguarda uma decisão favorável do STF o ex-governador do Rio de Janeiro Sergio Cabral. Ele pediu a Toffoli uma extensão da decisão que zerou os processos criminais contra o empresário Marcelo Odebrecht e beneficiou o ex-governador do Paraná Beto Richa. Nesse pedido, Cabral quer se livrar de uma pena de 14 anos de prisão por cobrança de propina nas obras do Comperj, complexo petroquímico do Rio.
Em parte das decisões já proferidas, Toffoli rejeita a anulação das condenações, remetendo os casos de volta à primeira instância. Uma das últimas decisões ministro nesse sentido se deu num pedido apresentado em segredo de Justiça pelo ex-presidente da Câmara Eduardo Cunha. Ele rebateu a defesa dizendo não haver provas de conluio de Moro e da força-tarefa contra o ex-deputado.
Mas muitos réus recorrem dessas decisões ao próprio STF, para que os pedidos sejam analisados na Segunda Turma. Há pedidos assim, por exemplo, do ex-marqueteiro do PT João Santana e sua mulher, Mônica, e também do empresário Adir Assad, que teriam atuado no escândalo do Petrolão.
Não há prazo para o STF decidir sobre esses casos. Uma parte das decisões está em segredo; outros processos chegam à Segunda Turma para votação virtual, o que também dificulta o acompanhamento de cada um pela imprensa e pela sociedade em geral.
Todos os pedidos se inspiram na decisão de 2021 que declarou Moro parcial nas ações contra Lula. As defesas conseguiram no STF o material apreendido com hackers que interceptaram clandestinamente mensagens trocadas pelos procuradores durante a operação. Parte delas nem sequer envolve Moro, mas mesmo assim são usadas para apontar uma suposta perseguição da força-tarefa.
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