Pressionado a abastecer o país com vacinas contra a covid-19 e pela dependência da Coronavac, que já foi chamada pelo presidente Jair Bolsonaro de "vacina de João Doria", o governo federal tenta avançar na compra de outros imunizantes.
A Sputnik V, da Rússia, é vista como uma das mais promissoras por interlocutores do presidente e do ministro da Saúde, Eduardo Pazuello, mas ainda esbarra na falta de dados para a aprovação na Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa). Nos bastidores, defensores dizem que a Sputnik poderia se tornar "a vacina de Bolsonaro". "Se a Anvisa aprovar, compraremos a Sputnik", afirmou neste sábado (30) o presidente.
No Brasil, ela será produzida pela farmacêutica União Química, que planeja trazer ao país 10 milhões de doses prontas até março. Além disso, programa pretende produzir outras 150 milhões em 2021 - e espera fabricar o insumo farmacêutico ativo no Brasil. O governo do Paraná também tem acordo para produzir a vacina russa. Entretanto, o acordo com o governo paranaense nunca saiu do lugar, travado pelo Instituto Gamaleya, que desenvolveu o imunizante e pediu para rever as condições para produção no Instituto Tecnológico do Paraná (Tecpar).
Bolsonaro se reuniu quarta-feira (27) com o presidente da Anvisa, Antonio Barra Torres, e um dos temas tratados foi a aprovação da Sputnik V. O Ministério da Saúde disse à União Química que está "disposto a formalizar as tratativas comerciais para eventual aquisição dos lotes do imunizante", caso a empresa receba aval para o estudo de fase 3 e peça o uso emergencial à Anvisa.
A discussão ocorreu no momento em que o governo de São Paulo e o Ministério da Saúde travavam novo duelo pela Coronavac. A gestão do governador João Doria afirmava que, sem manifestação rápida do ministério, as 54 milhões de doses extras oferecidas pelo Instituto Butantan poderiam ser exportadas ou mesmo vendido para estados e municípios brasileiros - a prefeitura de Curitiba, por exemplo, demonstrou interesse em adquirir parte deste lote. Após pressão do Butantan, o Ministério da Saúde confirmou que vai assinar a ordem de compra dessas doses terça-feira (2).
O secretário executivo do Ministério da Saúde, Elcio Franco, chegou a dizer quarta-feira, à Rádio CBN, que não descartava abrir mão da segunda compra da Coronavac, caso tivesse outras opções.
Outras vacinas
Além da Sputnik V, o Ministério da Saúde também trata como promissora a Covaxin, desenvolvida pelo laboratório indiano Bharat Biotech. Mas, até agora, só foram publicados dados da primeira fase de pesquisa do imunizante. O governo ainda negocia a importação de mais 10 milhões de doses prontas da vacina de Oxford/AstraZeneca da Índia e conta com a produção de imunizantes pela Fiocruz e pelo Butantan.
O Instituto Gamaleya, de Moscou, que desenvolveu a Sputnik V, divulgou que sua taxa de eficácia é de 91,4%, mas ainda não publicou em artigo científico os detalhes do ensaio clínico. Ainda não está claro, por exemplo, quanto tempo a proteção da vacina pode durar.
A distribuição da Sputnik V, porém, ainda esbarra no aval da Anvisa, que aponta falta de dados básicos para poder liberar o uso emergencial do imunizante. Faltam também pesquisas de fase 3 do produto no Brasil.
Em conversas entre Planalto e Ministério da Saúde não é descartado um drible na agência sanitária, mas há resistência. Dispensar a análise da Anvisa bateria de frente com o discurso do presidente de que apenas vacinas seguras e eficazes, certificadas pelo órgão, serão distribuídas. Foi o argumento usado para atrasar a compra da Coronavac e da vacina da Pfizer.
Ainda assim, uma ideia por enquanto remota é permitir que vacinas aprovadas na agência sanitária da Rússia pudessem receber autorização excepcional para importação e distribuição no Brasil. Esse aval chegou a ser colocado em minuta da Medida Provisória 1.026/2021, que liberou a compra de imunizantes sem registro da Anvisa, mas foi excluído do texto final. Pela MP atual, só produtos registrados em EUA, União Europeia, Reino Unido, Japão e China entram na regra. Outro caminho seria imitar a decisão da Argentina, que deu o aval para o uso emergencial, com uma recomendação pouco aprofundada de sua agência reguladora.
A Anvisa detalhou ao STF a falta de dados da Sputnik, em ofício de 22 de janeiro, onde ressaltou que sequer informações exigidas para realizar a pesquisa no País foram apresentadas. Faltam ainda dados de eficácia e segurança do produto, entre eles, os de "toxicidade reprodutiva", que mostram que a vacina não leva à infertilidade ou prejudica o desenvolvimento de um embrião, feto ou recém-nascido. O pedido foi devolvido pela agência à empresa.
A União Química não informou ao Estadão quando enviará os dados cobrados, mas interlocutores da empresa afirmam que as exigências serão cumpridas e esperam receber o aval para os estudos em breve. As informações são do jornal O Estado de S. Paulo.
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