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Fronteira entre Brasil e Venezuela, em Pacaraima, Roraima.
Fronteira entre Brasil e Venezuela, em Pacaraima, Roraima.| Foto: Mauro Pimentel/AFP

Se fosse um país, a faixa de fronteira do Brasil teria o tamanho da Dinamarca. É uma área de 2,29 milhões de quilômetros quadrados – o equivalente a 27% do território nacional. As divisas brasileiras por terra passam por dez estados e 588 municípios, sendo que 120 ficam exatamente sobre a linha de fronteira. Desse total, 32 cidades são gêmeas – ou seja, estão fisicamente ligadas a municípios de países vizinhos. Só nessas cidades gêmeas vivem 11 milhões de pessoas, o equivalente à população de São Paulo (e o dobro do número de dinamarqueses).

Mas a vida na área da fronteira nacional está muito distante da Dinamarca. Não se equipara nem mesmo às condições socioeconômicas da média do Brasil. Em geral, as 32 cidades gêmeas são mais violentas do que a média nacional – no caso mais extremo, o município de Paranhos, no Mato Grosso do Sul, a taxa de homicídios chega a 109,7 a cada 100 mil habitantes, o triplo do Brasil.

Além disso, os indicadores de educação, saúde e renda são menores. Somente um dos 32 municípios registraram Índice de Desenvolvimento Humano Municipal (IDHM) próximo da média brasileira: foi Foz do Iguaçu, com 0,751. Quando o assunto é mortalidade infantil, apenas três das 32 cidades gêmeas apresentavam, em 2016, indicadores menores do que o teto recomendado pela Organização Mundial da Saúde (OMS): Itaqui (RS), com 8,91 mortes para cada 100 mil habitantes; Porto Xavier (RS), com 8,7; e Bela Vista (MS), com 7,18.

Em Pacaraima (RR), apenas 5,72% da população economicamente ativa tem emprego regular. Em Tabatinga (AM), o PIB per capita anual não passa dos R$ 6.246,54. Em Assis Brasil (AC), o índice de autonomia financeira, que mede o quanto a cidade vive de seus próprios recursos, é de apenas 2,39% - sendo que a média nacional é 41,99%.

Tradicionalmente, divide-se a fronteira brasileira por terra em três arcos, Sul, Central e Norte. No Arco Sul, ficam 418 municípios, ou 71% do total. O Central contém 99 municípios e se caracteriza por um fluxo intenso de pessoas e bens. No Arco Norte ficam 71 municípios. É a faixa mais extensa, mas com menor densidade demográfica e menor fluxo de bens. O contrabando e o crime organizado atuam, principalmente, na faixa que vai do Rio Grande do Sul, no Arco Sul, até o Mato Grosso do Sul, no Arco Central.

Crime se beneficia das más condições da população da fronteira

“O tráfico de drogas, armas e o contrabando se beneficia da falta de condições de trabalho formal e da baixa escolaridade da população fronteiriça para engrossarem seus exércitos de “mulas”, passadores, olheiros e transportadores desses produtos de crimes, fator esse que aumenta ainda mais a informalidade e a migração de mão de obra formal para as atividades criminosas”, afirma o estudo Diagnósticos do desenvolvimento das cidades gêmeas do Brasil, produzido pelo Instituto de Desenvolvimento Econômico e Social de Fronteiras (Idesf).

O estudo diz qual é a consequência final da falta de políticas públicas eficientes: “os alarmantes dados de homicídios e parco investimento na área de segurança pública demonstram o desmonte econômico e social de regiões que são extremamente ricas em recursos naturais”. Cria-se então um ciclo vicioso, em que o crime emprega jovens, aumentando a violência e inviabilizando as iniciativas educacionais que poderiam estimular a geração de empregos formais.

Zona fronteiriça tem necessidade de ações amplas

O Idesf aponta que o problema que começa nas fronteiras afeta a toda a sociedade: “O prejuízo causado pelo descaso dos governos e a falta de planejamento estratégico que pense essas áreas como fonte de integração e desenvolvimento têm espalhado reflexos em todo o país, com a entrada pelas fronteiras de drogas, armas e produtos ilegais, fomentando um círculo vicioso que onera todo o Estado e a sociedade brasileira”.

A solução, aponta o instituto, teria de se apoiar numa vasta gama de ações focadas na região. “Não basta, contudo, adotar como política para as cidades gêmeas somente a repressão aos crimes de fronteira. A atuação deve ser em todas as frentes, de tal forma que a população dessas regiões possa sentir não só a força do Estado, mas sua presença nas diversas áreas em que ele tem a obrigação de atuar, em especial na educação, na saúde pública e na criação de oportunidades de emprego e renda dignos. Isso, sim, é que fará das cidades de fronteira regiões menos fragilizadas e com menor risco de suas populações engrossarem as estatísticas criminais.”

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