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Eleito deputado federal por São Paulo pela primeira vez em 2018, Vinicius Poit assumiu no começo deste ano a liderança da bancada no Novo na Câmara dos Deputados. Recentemente, o parlamentar, que também é líder da bancada paulista na Casa, se articulou contra o texto do Orçamento de 2021 aprovado pelo Congresso.
Poit acusa o governo do presidente Jair Bolsonaro de articular junto ao Centrão a liberação bilionária de emendas parlamentares. Com um grupo de mais 20 parlamentares, o líder do Novo protocolou uma representação junto ao Tribunal de Contas da União (TCU) pedindo que o órgão se manifeste sobre o Orçamento inflado.
Em entrevista à Gazeta do Povo, o deputado afirmou que caso o texto seja sancionado pelo presidente Bolsonaro, na forma como foi aprovado, claramente o chefe do Executivo estará cometendo crime de responsabilidade e por isso poderia sofrer um processo de impeachment. Além disso, Poit avaliou a atuação do governo e do Congresso durante a pandemia, comentou sobre a viabilidade de uma candidatura de centro para à Presidência em 2022 e como estão as articulações do Novo para as eleições.
O senhor é um parlamentar de primeiro mandato e líder de uma bancada numerosa. Qual a marca da sua liderança até agora?
Vinícius Poit: A gente quer cada vez mais mostrar que o Novo não é só o partido que economiza dinheiro, mais transparente e mais econômico da Casa, mas sim o partido que traz resultado e um partido que dialoga. Isso eu fiz durante os meus primeiros dois anos de mandato, estando na liderança da bancada paulista, que é a maior bancada do Congresso. Cheguei lá dialogando, construindo pontes. Então, esta é a marca que queremos deixar como nova política, chegar lá para dar resultado. Porque entrar lá como uns da “nova política”, que de práticas novas não têm nada, para ficar mitando e lacrando na internet não dá.
O senhor tem defendido o diálogo como forma de legislar. Existe esse diálogo entre o governo e o Congresso? Por que matérias como as reformas não avançam?
Vinícius Poit: A gente tem a volta de práticas que não acreditou que iria ter nesse mandato. Temos um presidente estelionatário eleitoralmente, um presidente que ia privatizar, que disse que ia diminuir ministérios, que disse que não ia ter toma-lá-dá-cá com o Centrão. Ele não privatizou nada, aumentou o número de ministérios e recentemente cogitou criar um ministério só para garantir o foro privilegiado para Eduardo Pazuello (ex-ministro da Saúde).
Hoje, o que vemos é o maior toma-lá-dá-cá com o Centrão. Deu cargos e emendas, tudo que o Centrão quis e o Centrão é insaciável, quer mais e mais. O presidente não sabe dialogar e o que sobra é dinheiro de emenda e cargo. Por isso, as pautas estão travadas e não anda nada. O Centrão não quer privatizar porque quer os cargos. Centrão não quer reforma administrativa porque quer manter os privilégios, não só deles, mas da turma do Judiciário e do Ministério Público.
Como o senhor avalia o trabalho do Congresso durante a pandemia. Neste ano houve mudança nos comandos da Câmara e do Senado, já deu para sentir uma mudança em relação à tramitação dos projetos?
Vinícius Poit: Nem o Congresso e muito menos o governo federal conseguiram entregar. Antes dessa nova gestão, existia uma gestão (Rodrigo Maia) que batia muito mais forte no governo, só que fazia concessões à esquerda. Eu vou ser bem pragmático, nessas concessões não teve reforma administrativa, não teve capitalização da Eletrobras, não teve privatização dos Correios. E não andaram porque precisavam do apoio da esquerda para ter maioria no Congresso e bater no governo.
Agora a nova gestão (de Arthur Lira) está colada no governo e essa nova gestão é insaciável, gosta de cargo e emenda e a tal governabilidade não chega. Outro dia, no meio da pandemia a turma estava votando projeto que não tem nem pé nem cabeça, projeto para garantir progressão automática de servidor público. Projeto como o próprio governo tentou para fazer mobilização nacional, apelidado PL do golpe.
Cadê as atitudes de combate à pandemia? Como por exemplo, cortar os supersalários do Ministério Público e do Judiciário, que são cheios de penduricalhos. Agora, na votação do Orçamento foram mandar emenda para obras do ministério do Desenvolvimento Regional em vez de mandar para a Saúde e Educação. Então, não acho que o Congresso esteja fazendo um bom trabalho nessa pandemia.
O senhor tem afirmado que caso o presidente Bolsonaro sancione o projeto do Orçamento na forma como o Congresso aprovou, ele estaria claramente implicando em crime de responsabilidade fiscal. Há clima para um impeachment nesses termos?
Vinícius Poit: Eu acompanhei todos os pedidos de impeachment e continuo acompanhando porque frequentemente aparecem pedidos novos. Esse pedido com base no Orçamento, já estou antecipando que pode ter um, está muito bem desenhado e embasado. Veio um Orçamento, o Ministério da Economia avisou que tem um rombo de R$ 17 bilhões nas despesas primárias e tem que corrigir, o relator ignorou e colocou mais R$ 26 bi nas emendas para dividir com a turma lá e fazerem obras pelo Brasil. Ou seja, R$ 43 bi de rombo. O Congresso com a base do governo aprovou, a gente foi contra, óbvio.
O presidente está analisando e ainda não respondeu aos nossos questionamentos. Com essa pressão agora o relator disse que pode voltar atrás e liberar R$ 10 bi das emendas. Tenha a santa paciência, ninguém é trouxa aqui não! R$ 10 bi não são suficientes. O TCU (Tribunal de Contas da União) vai apertar o governo e eu espero que seja a seguinte, “olha presidente com esse orçamento aí vocês não vão conseguir cumprir o teto, ao menos que se faça pedalada fiscal”.
Fazendo pedalada fiscal é impeachment, porque pedalada fiscal foi impeachment para a Dilma (Rousseff) e é para o Bolsonaro também. Então isso está muito bem desenhado e didático para ninguém ter dúvida.
Recentemente, Bolsonaro anunciou um comitê de Covid-19 com a participação de outros poderes. Houve algum avanço no diálogo?
Vinícius Poit: Primeiro, eu acho que a lua de mel da relação entre o presidente Bolsonaro e os presidentes Arthur Lira e Rodrigo Pacheco já azedou e acabou. Estamos tendo demonstrações sucessivas disso. Logo quando eles fizeram aquele primeiro GT (Grupo de Trabalho), que se reuniram todo mundo, o Lira veio para a reunião de líderes e chegou com o discurso de equilíbrio, foco na solução, vamos deixar as diferenças políticas de lado, ou seja um discurso razoável. Já o Bolsonaro saiu com o discurso de tratamento precoce. Não tem condição! O presidente do Congresso diz uma coisa e ele diz outra. A todo o momento criando cortina de fumaça e polêmica. Isto não é um caminho bom para o Brasil.
O que o futuro reserva ao governo Bolsonaro?
Vinícius Poit: Eu vejo que, do lado do Congresso, essa galera vai pedir mais e pedir mais e o governo não vai conseguir entregar tanto cargo e tanta emenda para saciar a vontade dessa turma, e isso vai azedar. Não sei se o caminho vai ser o impeachment mesmo, mas tudo acaba desenhando para isso. O presidente está nas mãos do Congresso e supostamente tem uma turma ali que está chantageando. Está na cara que isso vai dar ruim. O caminho para o Brasil é em 2022 tirar esse presidente e renovar esse Congresso. Não vamos ter o país que a gente quer com essa turma lá.
O Congresso sinaliza com uma nova reforma eleitoral, que começou a ser discutida na Câmara. O que pode vir de novo nessa articulação?
Vinícius Poit: É uma reforma para inglês ver. É uma reforma para manter quem está no poder. Querem elevar a cláusula de barreira para não deixar o partido pequeno trabalhar e menos renovação entrar. Saiu a informação de que o presidente Arthur Lira iria propor que partido pequeno não pudesse entrar com Adin (Ação Direta de Inconstitucionalidade), ou seja está tirando a participação de partido pequeno.
Isso vai totalmente na contramão do que eu defendo, por exemplo, que é candidatura independente como já tem em alguns países. Esta reforma política não é a que o brasileiro quer. Hoje, a gente tem um combo para dar errado. Um Congresso faminto por cargo e emenda e um presidente que gosta de dar cargo e emenda, porque conversar ele não sabe. Esta é a fórmula para dar errado.
Outras reformas como a administrativa e a tributária estão paradas por falta de consenso. O senhor acredita que existe possibilidade de votação dessas matérias antes das eleições de 2022?
Vinícius Poit: Não acredito em nada que venha desse governo. Infelizmente, esta é a realidade. Reforma administrativa está pronta desde 2019 e não vinga. Na hora que chega, vem atrasada e faltando peça. Na administrativa não está inclusa a elite do funcionalismo público, não estão inclusos os políticos. Que cidadão que vai acreditar numa reforma dessas?
Reforma tributária fica um brigando de protagonismo com o outro. É a reforma da Câmara ou é a do Senado? Vai criar imposto ou não vai? Então não sai. A pressão e o lobby não deixam sair mais nada. Daqui para frente não se vota nada. Centrão precisa fazer caixa para campanha de 2022 e não vão abrir mão de cargo ou emenda agora. Muito difícil ser aprovada qualquer pauta dessas.
O senhor faz alguma ressalva positiva do governo Bolsonaro?
Vinícius Poit: Uma ressalva é o Ministério da Economia, que é um negócio a parte nesse governo. Aliás, é ignorado lá dentro. Ministério da Economia propõe a PEC Emergencial, os caras vão lá e desidratam. Ministério da Economia avisa que no Orçamento tem um buraco, é ignorado. Ministério da Economia avisa na LDO (Lei de Diretrizes Orçamentárias) que as transferências especiais que o Congresso aprovou tinham que ser vetadas, o presidente foi lá e vetou, só que depois a própria base do governo foi lá e derrubou o veto. Ou seja, o Ministério da Economia é algo à parte. E eu já escutei várias vezes lá dentro que o Ministério da Economia é contra isso, mas o governo é a favor. Tem dois governos?
Então o que sustenta o ministro Paulo Guedes no cargo?
Vinícius Poit: Sinceramente não sei. Ele é um profissional inteligente, que tem um histórico profissional de sucesso. Eu não sei o que ele está fazendo lá para aguentar tanto desaforo e tanta humilhação desse cara que está na Presidência da República.
Recentemente a direção nacional do Novo declarou formalmente que iria fazer oposição ao governo Bolsonaro. O que levou o partido a se posicionar justamente neste momento?
Vinícius Poit: A mesma coisa que levou o Brasil a perder mais de 300 mil vidas para a Covid-19. A mesma coisa que levou o Brasil a não fazer reforma nenhuma. A mesma coisa que levou o Brasil a dar dinheiro para o Centrão e não privatizar nada. A gestão Jair Messias Bolsonaro levou a isso. Não dá para ser a favor dele na condução da pandemia. Então, entendo totalmente o partido se posicionar contra o jeito que esse cara toca a pandemia no Brasil.
E qual o posicionamento da bancada do Novo dentro do Congresso?
Vinícius Poit: O Novo na Câmara se mantém independente, a gente não vai se juntar em hipótese alguma com PT, Psol, PCdoB. Vamos votar a favor de pautas positivas. Agora, essa balbúrdia e pouca vergonha que o governo faz a gente vai bater forte contra.
Em 2022 o cenário se desenha para uma eleição polarizada entre Jair Bolsonaro e o ex-presidente Lula. Há chance para uma outra candidatura surgir até lá?
Vinícius Poit: A gente tem que dar luz para quem sabe dialogar, para quem não conversa só com uma parte do Brasil, mas quem conversa com o Brasil todo. Não dá para ter Bolsonaro, nem Lula. Está na cara de Bolsonaro a ignorância, a falta de tato com a população, a agressividade, a truculência. Não fez nada em 27 anos na Câmara e não fez nada como presidente. Só que a gente não pode esquecer do que o Lula fez. O Lula vem com discurso paz e amor, mas o cara tem um monte de crime e de acusação nas costas. O cara chefiou uma quadrilha que roubou o Brasil inteiro, o maior escândalo de corrupção do mundo.
A gente precisa de alternativa, a gente precisa construir isso. E novamente, precisamos de alguém que vá lá e governe para todos. A gente precisa de alguém que tenha diálogo e que governe para 210 milhões de brasileiros e não para a metade.
Recentemente o ex-presidente do Novo e candidato à presidência em 2018 João Amoêdo assinou um manifesto com outros presidenciáveis a favor da democracia. O senhor acha que desse grupo é possível uma candidatura da chamada terceira via?
Vinícius Poit: Eu não sei se essa turma vai conseguir se unir e se vai ter uma candidatura só dali ou não. Mas o diálogo é necessário. Se a gente conseguir uma candidatura que pregue o diálogo e não o extremismo, e que dê voz para essa corrente, já será um caminho. Hoje a gente tem de um lado um cara que defende cloroquina, que dá voz para a agressividade, para atitudes antidemocráticas... e tem uma candidatura que também é populista e vem de outro extremo.
A gente precisa de uma candidatura que mostre que o extremismo não levou o Brasil a lugar algum. Então, se tiver uma candidatura, seja dessa lista de nomes que assinou o manifesto ou qualquer outra que saia com esse discurso, eu acredito que será o melhor para futuro do Brasil. Então, pode ter uma chance de em 2022 as pessoas acordarem e perceberem que estão sendo manipuladas de um lado e de outro.
Como o senhor defende que o Novo se posicione nessa disputa?
Vinícius Poit: Temos quadros para lançar candidatura própria, mas não tem nada definido ainda. O João (Amoêdo) já foi candidato e já foi presidente do partido, então naturalmente acabam considerando ele. Mas nem ele falou que vai ser candidato, nem sei se ele quer. Existe um processo seletivo dentro do Novo e temos outras pessoas que podem se candidatar.
Na minha opinião, temos que ter sim candidato à Presidência. Temos pessoas como o Bernadinho (treinador de vôlei), temos o Romeu Zema (governador de Minas Gerais). A gente precisa trazer pessoas boas para que sejam candidatos à Presidência, a senador e a governador. Defendo que o Novo tenha um chapa completa, que venha mais unido. Acabar com essa divisão.
As divergências internas serão superadas até a disputa presidencial?
Vinícius Poit: Temos sim divergências dentro do Novo. É melhor quando assumimos essas divergências. Estamos tentando consertar e corrigir. Isso é normal, em qualquer lugar existe divergência. Temos que focar em fortalecer o time, em união e ter uma chapa boa para em 2022. No mínimo, nós vamos eleger uma baita bancada federal no Congresso Nacional.