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Segurança Pública

Visita de mulheres do CV a ministério mostra que governo não prioriza combate ao crime, diz oposição

Luciane Barbosa (4ª da esquerda para a direita) ao lado de Elias Vaz, secretário de Assuntos Legislativos do Ministério da Justiça, em 19 de março. (Foto: Reprodução/ Instagram )

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Membros da oposição ao governo de Luiz Inácio Lula da Silva (PT) afirmaram que a visita de duas mulheres financiadas pelo Comando Vermelho a autoridades do Ministério da Justiça mostram omissão e falta de vontade por parte do governo de combater o crime organizado.

“O governo federal prefere ser omisso e tolerante com as facções criminosas ao invés de enfrentá-las. A segurança pública não era problema desde 2019, mas voltou a ser. Receber na sede do Ministério da Justiça a esposa de um dos maiores traficantes do país, sendo ela própria condenada por associação com o tráfico, e achar isso normal é o retrato do caos que tomou conta do Ministério da Justiça”, disse o deputado Ubiratan Sanderson (PL-RS).

Reportagens do jornal Estado de S.Paulo revelaram nesta semana que autoridades do Ministério da Justiça, os deputados esquerdistas Guilherme Boulos (PSOL-SP) e André Janones (Avante-MG) e o Tribunal Superior do Trabalho se reuniram com Luciane Barbosa Farias, conhecida como “dama do tráfico amazonense” e esposa de um líder do Comando Vermelho, e a ex-deputada do PSOL-RJ, Janira Rocha, que também seria financiada pela facção criminosa.

O senador Sergio Moro (PL-PR), ex-ministro da Justiça na gestão de Jair Bolsonaro (PL), disse que em seu tempo na pasta “os criminosos não se sentiam tranquilos de ir lá fazer as suas demandas”.

Na rede social X (Twitter) ele ironizou: "Na minha época do Ministério da Justiça, até recebíamos criminosos em Brasília, mas eles iam direto para o presídio federal".

Na gestão de Moro, lideranças das principais facções criminosas do país foram retiradas de presídios estaduais e mandadas para presídios federais, onde ficaram isoladas de fato de seus comparsas em liberdade.

“O mais chamativo é uma pessoa como essa, com esse envolvimento criminal, se sentir à vontade em ir ao Ministério da Justiça e tratar desse tipo de demanda”, disse o senador a respeito de Luciane Farias. Ela foi condenada a 10 anos de prisão por associação criminosa, mas aguarda julgamento de recurso em liberdade.

O Ministério da Justiça divulgou nota afirmando que não tinha como saber que Luciane era ligada a uma facção criminosa, mas não se manifestou sobre a ex-deputada do PSOL.

Segundo o jornal Estado de S. Paulo, Luciane participou de reuniões com secretários do ministério em março e em maio deste ano. O jornal exibiu ainda documentos que comprovariam que não só Luciane e sua ONG, a Associação Instituto Liberdade do Amazonas (ILA), mas a ex-deputada Janira Rocha, responsável pela solicitação de ambas as reuniões, recebiam dinheiro da facção criminosa.

De acordo com investigação da Polícia Civil do Amazonas, Janira teria recebido três transferências de recursos financeiros de um suposto contador do CV, totalizando R$ 23.654. Isso teria acontecido dias antes da primeira reunião na qual ela e Luciane se encontraram com o secretário de Assuntos Legislativos do Ministério da Justiça, Elias Vaz, no dia 19 de março.

Luciane e Jandira participaram de outra reunião no ministério, no dia 02 de maio, com o titular da Secretaria Nacional de Políticas Penais (Senappen), Rafael Velasco. A secretaria é responsável pelas ações do governo federal para a área prisional. Velasco trabalhava com esse tema nos governos do ministro da Justiça, Flávio Dino, no Maranhão. Na visita de maio, Luciane e Jandira também se reuniram com Paula Cristina da Silva Godoy, da Ouvidoria Nacional de Políticas Penais (Onasp) e com Sandro Abel Sousa Barradas, que é Diretor de Inteligência Penitenciária da Senappen.

A polícia amazonense também dispõe de comprovantes de transferências do CV para a ONG de Luciane no valor de R$ 22,5 mil, em fevereiro deste ano – uma indicação de que a entidade é mantida pela facção criminosa. Segundo sua página na internet, a ONG tem o objetivo de ser uma porta-voz de todos os familiares de presos dentro e fora do Estado do Amazonas.

Presidente da Comissão de Segurança da Câmara cogita pedir impeachment de Dino

Segundo Moro, desde o início do governo, nada de concreto foi realizado pelo Ministério da Justiça. O senador chamou a atenção para a falta de ações efetivas de combate à criminalidade e disse que a segurança pública se “encontra abandonada, não tem propostas, não tem projetos relevantes, e nem se vê essa força no combate ao crime organizado”.

O deputado Sanderson também afirmou que o Ministério da Justiça é um problema para o país inteiro, que está “à deriva na segurança pública”. Presidente da Comissão de Segurança Pública e Combate ao Crime Organizado da Câmara dos Deputados e policial federal licenciado, Sanderson vê na inoperância da pasta uma das razões para a explosão da criminalidade no Brasil.

Juntamente a outros parlamentares, o deputado tem se articulado na Câmara para cobrar esclarecimentos de Flávio Dino. Os parlamentares oposicionaistas querem convocá-lo novamente para prestar explicações no Congresso desse e de outros fatos ocorridos em sua gestão, além de solicitar investigações à Procuradoria-Geral da República. Sanderson e outros deputados cogitam até mesmo solicitar o impeachment do ministro.

Ministério alega que não sabia

Ao justificar o ocorrido, por meio de nota assinada pelo secretário de Assuntos Legislativos do Ministério da Justiça, Elias Vaz, o Ministério disse que não tinha como saber que Luciane era ligada à facção criminosa, pois foi às reuniões como parte de uma comitiva e que tinha se identificado como presidente da ONG Instituto Liberdade da Amazônia – o órgão e os secretários ainda não se pronunciaram após as alegações de envolvimento de Janira com o Comando Vermelho. Ele tentou assumir toda a culpa pelo episódio para tentar preservar Dino, que concorre uma uma vaga de ministro no Supremo Tribunal Federal.

Segundo Moro, procedimentos de rotina são utilizados no dia a dia dos ministérios para evitar esse tipo de acontecimento. “Existem controles e critérios para receber as pessoas, poderia ter se pedido uma lista das pessoas que iriam ao evento com os secretários e feita uma checagem, muito simples, que ia identificar que não era apropriado receber aquela visitante em específico. De todo modo, se de fato passou desapercebido, aí revela também um descuido”, afirmou o senador.

Elias Vaz disse que novos procedimentos de acesso ao ministério serão adotados para que situação similar não se repita.

De acordo com Fabrício Rebelo, jurista e responsável pelo CEPEDES - Centro de Pesquisa em Direito e Segurança, o Ministério da Justiça tem sido o protagonista de controvérsias e suspeitas de forma acentuada nos 11 meses em que Dino está à frente da pasta.

“Esse episódio é mais um que mancha fortemente a imagem do Ministério, pois é inadmissível que ali se tenha aberto espaço, em agenda oficial e por mais de uma vez, para a esposa de um líder do crime organizado, inclusive conhecida como 'dama do tráfico amazonense'. E não é algo que se amenize pela desculpa de desconhecimento, eis que seria ainda mais absurda a incompetência de uma gestão que não soubesse com quem estava se reunindo oficialmente”, afirmou.

O jurista avalia que as visitas de Luciane e Janira ao Ministério passam uma mensagem clara para a sociedade: de que a gestão é incrivelmente incompetente ou que realmente tem canais de comunicação muito estreitos com a criminalidade organizada. A esse último ponto, soma-se a impressão gerada em março deste ano pela visita de Dino, com poucos seguranças, ao complexo de favelas da Maré, no Rio de Janeiro.

As favelas da Maré são controladas por facções criminosas e, à época, declarações de integrantes de forças de segurança disseram ser impossível para uma autoridade adentrar nas comunidades da forma como Dino fez, sem que haja autorização prévia da facção. “Seja como for, a mensagem pública que se passa é a pior possível, revelando-se um verdadeiro mistério como o titular da pasta segue não só inabalável no cargo, como provável indicado a uma vaga na Corte Suprema”.

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