A indicação do advogado Cristiano Zanin ao Supremo Tribunal Federal (STF), feita pelo presidente Luís Inácio Lula da Silva (PT), corre o risco de ser judicializada da mesma forma que a nomeação do delegado, e atual deputado federal, Alexandre Ramagem (PL) para o comando da Polícia Federal, em 2020.
Indicado pelo então presidente Jair Bolsonaro (PL), Ramagem foi impedido de assumir o comando da corporação após o ministro Alexandre de Moraes acatar um pedido do PDT.
Na época, o magistrado levou em conta as declarações do ex-ministro da Justiça e Segurança Pública Sergio Moro, que acusou Bolsonaro de ingerência política na PF ao demitir o diretor-geral Maurício Leite Valeixo e nomear Ramagem.
O então chefe do Executivo estaria insatisfeito com atuação de Valeixo devido a operações da PF contra deputados aliados.
No despacho, Moraes argumentou que a troca realizada por Bolsonaro era “desvio de finalidade de ato presidencial”, bem como “inobservância aos princípios constitucionais da impessoalidade, da moralidade e do interesse público”. O ministro também evocou os princípios da moralidade administrativa, impessoalidade pública e interesse coletivo para suspender a nomeação.
Caso o mesmo princípio se aplique a Zanin, Lula terá que nomear outro jurista para o cargo de ministro do STF. Ao defender o petista nos processos da Lava Jato, o advogado, em teoria, estaria impedido de julgar os processos do presidente por ter possuído vínculo advocatício.
Para o doutor em direito administrativo Amauri Saad, ao nomear o próprio advogado, Lula estaria confessando que seu real interesse na vaga do Supremo não condiz com os requisitos citados por Moraes para a nomeação de um agente público.
“No caso da nomeação de Zanin ao STF, há pelo menos duas confissões do presidente da República que ilustram que a real motivação da nomeação não foi o interesse público ou a moralidade: quando disse que a nomeação ao STF era “assunto seu” e quando disse que confiava em Zanin por conta de sua atuação como seu advogado pessoal nas ações criminais de que foi réu.”, diz Saad.
Ele acrescenta: “Não acredito que o STF manterá o mesmo nível de rigor com a atual nomeação, por uma questão simples: o presidente de turno não é considerado um inimigo da corte, mas um aliado.”
Saad também lembra que o “notável saber jurídico” é um dos requisitos para ocupar o cargo.
“Lembrando que, fora da questão moral, há também o problema do não-atendimento, por Zanin, do requisito do art. 101 da Constituição de “notável saber jurídico”. Está claro que ser bacharel em direito ou advogado inscrito na OAB não é suficiente. Se o fosse, a Constituição teria indicado esses requisitos e não o primeiro. Notável saber jurídico é um algo mais (na verdade, bem mais) em relação a ser simplesmente advogado. Pressupõe uma obra jurídica relevante ou, pelo menos, uma atuação sólida em cargos públicos (preferencialmente, a magistratura). Zanin não tem nada disso”, disse o professor.
Seguindo na mesma linha, Ângela Gandra, professora de Filosofia do Direito e Presidente do Instituto Ives Gandra, explicou que apesar da prerrogativa da nomeação, o presidente da República precisa seguir a Constituição.
“A questão principal nesse caso, é não atender aos pressupostos constitucionais. Amizade e confiança não estão elencados como critério de seleção. Nesse sentido, podemos até mesmo evocar a nomeação suspensa de Alexandre Ramagem em posição de muito menor transcendência e poder decisório, pelo temor à escolha personalista. A tese do ministro Alexandre de Moraes poderia ser aplicada a essa indicação, de forma análoga.”, diz Ângela.
A jurista também aponta que a escolha para o ministro do Supremo deveria ser feita dentro do próprio Judiciário.
"Muito preferivelmente, a nomeação deveria ser feita considerando a candidatura de pessoas com alta trajetória judiciária, magistrados de carreira, com qualificação e a experiência devida para exercer a função", acrescentou.
Transparência Internacional critica nomeação de Zanin
Apesar de já esperada no mundo político, a nomeação causou controvérsias. De acordo com a Transparência Internacional, a indicação contraria compromissos assumidos internacionalmente pelo Brasil sobre independência do Judiciário. Ela também afronta o princípio constitucional de impessoalidade e “trai a promessa de resgate das instituições democráticas”.
A organização afirma que Lula “parece” transformar o tribunal em “anexo do governo de ocasião”, e que o país está “diante das escolhas que reverterão ou avançarão essa trajetória de enfraquecimento e captura das instituições”.
“É fundamental que a sociedade brasileira promova amplo debate sobre a composição de seu tribunal constitucional, para que nossos representantes eleitos no Senado cumpram seu papel na defesa do interesse público e da democracia”, disse a entidade.
E acrescentou: “A nomeação de advogado pessoal ao STF contraria compromissos assumidos internacionalmente pelo Brasil sobre independência do judiciário, afronta o princípio constitucional de impessoalidade e trai a promessa de resgate das instituições democráticas – completa a ONG.”
Mais de 5 mil advogados também criticaram nomeação
A nomeação de Zanin também foi rechaçada por advogados. Em março deste ano, o Movimento Advogados de Direita Brasil publicou uma carta aberta contra a indicação do advogado de Lula. No documento, os 5.582 assinantes pediram ao Senado Federal que rejeite o candidato, caso seja indicado pelo presidente Lula.
"Não se trata, pois, de uma nomeação puramente técnica. A escolha do Ministro do Supremo é também política, e como política relacionada ao Judiciário, não basta ser apenas legal, tem que parecer ser Justiça. Aceitar a mera argumentação restritiva de que Zanin possui atributos que lhe conferem notável saber jurídico e reputação ilibada, ao menos para grande parte da população, é, no mínimo, uma afronta à moralidade da República", escreveram os advogados.
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