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O ministro Cristiano Zanin votou a favor de derrubar uma regra que impede juízes de julgar ações cujas partes sejam clientes de escritório de advocacia de seu cônjuge, companheiro ou parente até terceiro grau. Para ele, a norma é “desproporcional”, porque o juiz pode não saber, por exemplo, se determinada empresa que integra o processo é ou não cliente do escritório de advocacia no qual seu parente seja sócio ou empregado. Pelo voto de Zanin, nas ações em que o próprio parente atue como advogado, o juiz continuaria impedido de julgar.
Desde a semana passada, o Supremo Tribunal Federal (STF) analisa uma ação que aponta inconstitucionalidade numa regra do Código de Processo Civil que impede juízes de julgarem partes que sejam atendidas por escritório de advocacia integrado por cônjuge ou parente.
A Associação dos Magistrados Brasileiros (AMB) alega que é “impossível” que um juiz possa saber todos os processos em que uma determinada empresa, por exemplo, é atendida por um um escritório no qual seu parente trabalhe, sobretudo em ações ajuizadas por outros escritórios. Ou seja, mesmo que o escritório do parente não atue na causa da empresa, mas trabalhe para ela em outro processo, o juiz ficaria impedido. Isso pode ocorrer quando a banca tem muitos advogados e atende a grandes empresas, com muitas causas na Justiça.
Além de Zanin, já votaram pelo fim desse tipo de impedimento os ministros Gilmar Mendes, Luiz Fux, Dias Toffoli e Kassio Nunes Marques. Votaram contra os ministros Edson Fachin, Luís Roberto Barroso e Rosa Weber. Ainda faltam os votos de Alexandre de Moraes, André Mendonça e Cármen Lúcia. Se apenas um deles votar para derrubar a regra, haverá maioria para acabar com o impedimento.
Na ação, todas as instituições consultadas se opuseram ao pedido da AMB. A Câmara, o Senado, a Advocacia-Geral da União, a Presidência da República e a Procuradoria-Geral da República argumentaram, em síntese, que a regra busca preservar a imparcialidade da Justiça, evitando o tráfico de influência nos tribunais e não tem nada de inconstitucional.
Primeiro a votar pelo fim do impedimento, Gilmar Mendes afirmou, no voto, que “grande parte da força de trabalho de meu gabinete está envolvida na verificação de impedimentos, deixando de auxiliar no julgamento das causas”. Afirmou ainda que um advogado não deve ser obrigado a informar um juiz parente que seu escritório defende determinada parte que ele vá julgar.
Zanin acompanhou Mendes, argumentando que muitos escritórios possuem centenas de advogados que atuam para empresas grandes. Como consequência, um advogado parente de um juiz ficaria impedido de atuar em muitas ações, “em afronta à liberdade de iniciativa e ao direito ao trabalho e à subsistência”.
Em contato com a reportagem, o gabinete do ministro esclareceu que, de acordo com seu voto, um juiz deixaria de ficar impedido nos casos em que a parte é cliente do escritório do parente, mesmo que em outro processo. Nos casos em que o próprio parente atua na ação, o juiz continuaria impedido.
Como mostrou a Gazeta do Povo, a mulher de Zanin, Valeska Martins, atua em pelo menos 14 ações em andamento no STF. Outra regra do CPC impede que o ministro julgue esses casos, porque ele mesmo atuou neles como advogado.
Inicialmente, o título dessa reportagem informou que o voto de Cristiano Zanin permitiria que ministros julgassem ações de advogados parentes. Na verdade, o voto permite que juízes julguem partes defendidas por escritórios dos quais fazem parte seus parentes. Ministros e juízes, no entanto, continuariam impedidos de julgar ações nos quais seus cônjuges ou parentes atuaram diretamente na causa.
Corrigido em 19/08/2023 às 14:32