O ministro Cristiano Zanin votou nesta quinta-feira (10) pela obrigatoriedade da implementação, em todo o país, do juiz de garantias, modelo que altera radicalmente o modo como são investigados e julgados os crimes no Judiciário. Essa foi a primeira participação de Zanin em julgamentos no plenário do Supremo Tribunal Federal (STF).
Nesse modelo, a fase de investigação de um delito – tarefa da polícia e Ministério Público – será supervisionada de forma bastante rigorosa por um magistrado (o juiz das garantias, a quem caberá zelar pelas prerrogativas do investigado) e a fase de instrução do processo e julgamento final ficará necessariamente a cargo de outro juiz.
Atualmente, essas duas fases ficam a cargo de apenas um juiz. O intuito de dividir as tarefas em dois magistrados é evitar que o juiz que acompanhou toda a investigação dê a sentença final. A premissa é a de que, por ter autorizado medidas contra o investigado (como prisão, busca e apreensão, quebras de sigilo, bloqueio de bens, etc.), ele se tornaria mais suscetível a considerá-lo culpado de antemão, antes do fim do processo, para não contrariar suas suspeitas iniciais. A finalidade, portanto, é assegurar maior imparcialidade no processo e julgamento do réu.
O juiz de garantias foi inserido por deputados em 2019 no pacote anticrime, proposto pelo então ministro da Justiça, Sergio Moro, para trazer mais efetividade às investigações criminais, nos moldes da Operação Lava Jato. No Legislativo, porém, o projeto de lei foi bastante alterado, para incluir regras na direção oposta, de ampliar o direito de defesa dos investigados. Começava, na época, um movimento político de reação à Lava Jato, inclusive no Legislativo. O juiz de garantias foi a principal inovação nesse sentido.
O modelo é defendido por advogados criminais, inclusive por Cristiano Zanin, quando era advogado do presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT). Se aplicados, vários dispositivos do juiz de garantias proibiriam ou dificultariam procedimentos adotados contra o petista e outros políticos nas investigações do petrolão. Moro, na época, defendeu o veto do então presidente, Jair Bolsonaro, mas ele sancionou a proposta como aprovada pelo Congresso.
Associações de juízes e de promotores acionaram então o STF para suspender a lei e declará-la inconstitucional. Os principais argumentos contrários eram de que a adoção do modelo iria tumultuar e atrasar o andamento dos processos, levando muitos à prescrição; que na maior parte do país, principalmente no interior, não haveria juízes e estrutura suficiente para dividir cada caso criminal para dois magistrados; e que a mudança deveria partir de proposta do Judiciário, não do Legislativo, uma vez que alteraria também a organização dos tribunais.
Na época, Dias Toffoli presidia o STF e determinou que o Conselho Nacional de Justiça (CNJ) estudasse a implementação. O ministro Luiz Fux foi sorteado relator das ações. Com carreira e ligações fortes no Judiciário, atendeu aos apelos das associações do segmento e suspendeu a validade da lei.
Votos no julgamento
Só neste ano ela começou a ser julgada e Fux votou, em junho, pela facultatividade da implementação. Ou seja: a lei apenas autorizaria a criação do juiz de garantias, mas não obrigaria, de modo que cada Tribunal de Justiça estadual poderia adotar o modelo gradualmente conforme sua capacidade, sem que um juiz que supervisionou a investigação ficasse necessariamente impedido de dar a sentença final, como proposto.
Nesta quarta, o julgamento foi retomado com o voto de Dias Toffoli, que defendeu a obrigatoriedade da adoção, em no máximo dois anos. Nesta quinta, ele foi seguido por Zanin, que, no entanto, defendeu um prazo ainda menor, de um ano para implementação em todo o país.
Ele também defendeu a validade de um trecho da lei que determina que todo e qualquer procedimento investigativo instaurado pelo Ministério Público deve ser submetido ao crivo do Poder Judiciário. Atualmente, muitas investigações ficam somente no MP, sem supervisão judicial. Com a mudança, o juiz de garantias terá mais poder para controlar a investigação para assegurar direito de defesa dos investigados.
Além disso, para Zanin, o juiz de garantias não poderá mais determinar, por iniciativa própria, a produção de provas, o que deverá ser sempre requerido pela polícia ou MP.
Em seu primeiro julgamento presencial no plenário, o novo ministro disse estar convicto da necessidade de implantar o juiz de garantias. “A existência do juiz de garantias poderá efetivamente mudar o rumo da Justiça brasileira, pois ao garantir à sociedade maior probabilidade de julgamentos imparciais e independentes, permite-se que o sistema penal seja potencialmente mais justo”, afirmou.
Depois, disse que a medida poderá contribuir para reduzir o número de prisões de negros e pobres no Brasil. “Poderá auxiliar no combate às injustiças e preconceitos sociais e raciais que lamentavelmente se fazem presentes no sistema de Justiça. Há cerca de 650 mil pessoas no país. E esse índice altíssimo nos coloca no terceiro lugar no ranking mundial da população carcerária. Fato é que o encarceramento atinge majoritariamente jovens de até 29 anos de idade, 55%; negros, 64%; com baixo grau de escolaridade, uma vez que 75% sequer acessaram o ensino médio”, disse o ministro.
Ele acrescentou que a aplicação da Lei de Drogas condena mais negros que brancos por tráfico. Nas próximas semanas, o STF também vai julgar se descriminaliza o porte de drogas para consumo pessoal. Zanin também poderá votar nesse processo.
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