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Por Juliano Oliveira, para o Instituto Liberal
Num artigo em que objetiva refutar a teoria da Curva de Laffer, Paulo Kogos, autointitulado anarcocapitalista dos mais radicais, faz uso de uma figura filosófica pré-socrática bastante instigante, Anaximandro. Aluno de Tales de Mileto, Anaximandro não aceitou passivamente as teorias de seu mestre, o qual afirmara que a água era o princípio de tudo.
A introdução do artigo de Kogos é um alerta aos estudantes (em especial aos de economia) sobre a necessidade de questionarem sempre e buscarem, das mais variadas formas possíveis, dados que contestem ou corroborem as “verdades” propaladas por quem se propõe a ensiná-los. Eis um trecho bastante interessante que trata da discussão que coloco neste breve texto:
“Alunos de economia devem se comportar como Anaximandro, aluno do fundador da Escola Jônica de Cosmologia, o grande Tales de Mileto. Este, por sua vez, para explicar os terremotos, baseou-se na Teogonia de Hesíodo, concluindo que a Terra flutuava no oceano como um navio.
Diante da teoria de Tales, que hoje sabemos ser absurda, Anaximandro ofereceu uma refutação lógica: se a Terra deve ser sustentada pelo oceano, quem sustenta o oceano e, logo, quem sustenta o sustentáculo do oceano? Este loop infinito só poderia ser resolvido se assumirmos que a Terra se mantém equilibrada sem nenhum suporte mecânico. A abordagem audaz de Anaximandro deu origem à mecânica celeste, inspirando cientistas como Aristarco e Copérnico.”
Para além das aulas de economia, eu diria que todos os alunos, de todos os níveis da educação formal, principalmente quando expostos ao modelo estatal de ensino (na verdade, todos estão expostos a esse modelo e isso independe de estarem numa instituição privada ou pública, uma vez que tudo o que se ensina nos ambientes escolares precisa passar pela chancela do Estado) deveriam adotar o exemplo de Anaximandro.
Isso porque faltam, à grande maioria de nossos professores, formados ou (de) formados sob a metodologia freireana de opressores e oprimidos, os conhecimentos mínimos necessários a um debate saudável sobre os mais diversos problemas que nos rodeiam, razão pela qual tendem a exteriorizar toda sua cólera quando confrontados por aquele aluno que, não conformado com a mediocridade do que lhe é oferecido, entrega-se ao autodidatismo.
O desprezo pela curiosidade e pela crítica ao que lhes era ensinado durante seu processo de formação fez de grande parte dos nossos professores pessoas medíocres (no sentido genuíno da palavra). Pessoas que transmitem aos seus pupilos comportamentos bovinos e pensamentos que são comuns à massa. Essa homogeneização do modo de pensar e perceber o que está ao nosso redor é fruto de anos de metodologias que exploram, sem parcimônia, o “jeitinho”, a busca pelo caminho menos pedregoso, mais fácil, menos árduo. Ler é algo que demanda disciplina, vontade de aprender. Obras de autores dissidentes sequer são mencionadas (nossos mestres, vergonhosamente, não as conhecem). Como consequência inescapável, nossos jovens também se tornam seres autômatos que repetem, feito papagaios, as mensagens descabidas, que não produzem qualquer efeito prático, ditas por aqueles que deveriam conduzi-los à autonomia profissional exigida pelo livre mercado (aliás, duas palavras que desejariam que jamais fossem combinadas numa mesma frase).
Tudo isso me veio à mente quando vi um “projeto” escolar em que uma adolescente exaltava, sob a anuência de seu tutor, a necessidade de transformarmos o mundo por meio da educação, dos livros e da leitura. Até aí, tudo normal (ou quase). O imbróglio estava na referência utilizada no projeto, a ativista paquistanesa Malala. Aquela menina hipócrita que jura ser contra o uso de armas de fogo, que prega sua substituição por livros, mas, contraditória e inacreditavelmente, diz que somente o socialismo poderia salvar o mundo. Ou seja, em nome da causa socialista vale ignorar os milhões que foram mortos brutalmente por armas de fogo. A ativista fecha os olhos para o fato de que, sob um regime socialista, inerentemente opressor, não há possibilidade de qualquer dissidência e livros que não estejam em conformidade com as pregações tiranas são lançados ao fogo juntamente com quem se atreva a lê-los. Recuso-me a acreditar que algum professor, ciente dessa bizarrice, apoiaria um trabalho/projeto que carregasse nomes de tipos como Malala. Para mim, repito, os professores são tão ignorantes quanto os pupilos que juram ensinar. Por essa mesma razão, não deveriam estar em sala de aula arrogando a si mesmos a função de conferir (que audácia, não?) cidadania aos nossos jovens.
Obs: Reconheço que Malala foi vítima do terrorismo que impera em seu país e que não há qualquer liberdade de escolha às suas compatrícias. Reconheço, também, que como vítima do poder destrutivo de uma arma de fogo, Malala deseje que armas sejam substituídas por livros. Não se pode negar que Malala tenha sido, enfim, corajosa ao enfrentar os radicais islâmicos. É compreensível, também, sua preocupação com jovens mulheres que, como ela, desejam maior poder de escolha. O problema é que, como diz o economista Rodrigo Constantino, o pêndulo exagerou para o lado esquerdo da força e mais do que simplesmente lutar por liberdade de escolha das mulheres, Malala passou a ser uma defensora do progressismo e do marxismo que preconiza o uso de violência e armas de fogo para calar dissidentes.