“A princípio, as pessoas tinham aceitado estarem isoladas do exterior como teriam aceitado qualquer outro inconveniente temporário que apenas perturbasse alguns dos seus hábitos. Mas, subitamente conscientes de uma espécie de sequestro, sob a tampa do céu em que o verão começava a crepitar, sentiam confusamente que esta reclusão lhes ameaçava toda a vida e, chegada a noite, a energia que recuperavam com o frescor lançava-os por vezes a atos de desespero”.
O trecho de “A Peste”, de Albert Camus, retrata bem a sensação que muitos começam a ter em meio ao isolamento radical. O apoio à medida vem caindo, segundo pesquisas, e não é para menos. Falta confiança nas previsões das autoridades, que sabem menos do que confessam. A exceção é o novo ministro da Saúde, que foi humilde ao admitir a ignorância. Seu antecessor preferia ficar adiando eternamente o pico da curva.
Muitos esquecem que o isolamento servia a um só intuito: achatar a curva e ganhar tempo. E nesse período, claro, construir novos leitos hospitalares. O que tem sido feito muito aquém da velocidade necessária. Os “isolacionistas” ignoram tudo isso e colocam na conta do presidente a contagem mórbida de cadáveres, sendo que ainda não falta leito no país. É como se o isolamento fosse uma panaceia para curar a doença, o que é absurdo.
Enquanto isso, é o sistema econômico que ameaça implodir. Nos Estados Unidos, país bem mais rico do que o Brasil, algo como 30 milhões de pessoas pediram seguro-desemprego nas últimas semanas. É uma quantidade sem qualquer precedente, mesmo considerando a Grande Depressão. O empreendedor Elon Musk chegou a clamar por libertação para salvar empregos e chamou de “fascistas” as medidas drásticas de isolamento.
Alguns podem achar que a palavra sequestro é exagerada para nossa realidade atual. Mas o empresário Abílio Diniz chegou a afirmar que a crise do coronavírus é pior do que o sequestro que sofreu. Os empresários, que criam riqueza e empregos, estão apreensivos com a situação, pois sabem do caos econômico que virá em breve. Enquanto isso, sem a devida robustez científica, muitos repetem apenas o mantra “fiquem em casa”, sendo que o desespero vai se alastrando pela sociedade.
Gente desesperada é sempre um perigo. Aumentam os casos de agressão doméstica, certamente teremos mais suicídios, infartos, surtos psiquiátricos e outras doenças como efeito desse confinamento angustiante. Em vez de destilar pânico e pregar um isolamento quase eterno, destruindo a economia no processo, talvez fosse o caso de exigir cautela e cuidados, mas enfrentando a vida – e o risco inerente a ela.
Não podemos sucumbir a essa peste do desespero. Isso leva à paralisia, não só da atividade produtiva, mas dos nossos espíritos!
* Artigo originalmente publicado no jornal ND
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