Um colega de debates da Rede Liberal fez aquela que julguei uma das melhores análises da série “O Mecanismo”, de José Padilha, na Netflix. O fato de ela ter gerado tanta revolta na extrema-esquerda mostra como essa turma é limitada ou cafajeste, ao fingir que a tese do “mecanismo” não é música para seus ouvidos “isentões” e “jacobinos”. Eis em linhas gerais o que o colega apontou:
Também assisti à primeira temporada de “O Mecanismo”, e acho que o Padilha toma partido da esquerda e dos bandidos mesmo, nem tentou disfarçar. Prestem atenção à narrativa, aos personagens, a quem o diretor põe em quais situações, às tomadas de câmera. É muito clara a intenção dele.
Como as coisas são postas nesta série:
1- Os bandidos são melhores atores, mais bonitos, simpáticos e carismáticos que os mocinhos. TODOS eles. As roupas, a maquiagem e todo o resto dos bandidos está sempre impecável, o que não acontece com os mocinhos;
2- Sergio Moro é um bobão clichê, tem trejeitos de bobão, transa de meia, usa capacete para andar de bike. Ele me lembra muito o personagem Boça dos esquetes de Hermes e Renato;
3- Selton Mello, no papel principal de policial, é um cara obcecado e que age o tempo todo fora da lei. Forçam a barra, o policial interpretado por ele aparenta ser mais bandido que os bandidos. Ele tem aparência, psiquê e trejeitos de vilão Walt Disney. Em certo momento da série, a mulher do personagem some vestida como uma vadia e reaparece bêbada 3 dias depois… até corno o personagem principal é;
6- Roberto Youssef é um malandro carismático, piadista. Quase sempre se dá bem, mas quando perde, ainda perde sorrindo e alegre. É “pegador”, já teve até um caso com a mulher do policial interpretado pelo Selton Mello no passado. Grande contraste com o personagem do Selton Mello, policial perturbado, ressentido e sem carisma (eles são rivais de infância na série). Roberto Youssef é a cara do Zé Carioca!
5- Paulo Roberto Costa é “um cara família”, é bandido mas é “do bem”. Carismático. Foi forte e não entregou ninguém até que ameaçaram sua família, sujeito “honrado”;
6- Marcio Thomaz Bastos, “o mago”, é um sábio respeitado por todos, um velhinho carismático. Reparem bem de que forma o Padilha o coloca e narra seus acordos… Ele mostra um acordo encabeçado pelo MTB para comprar o Procurador-Geral da República (!!!) como se fosse algo banal. Foca as tomadas no carisma do ator, na “sabedoria” do personagem, no “respeito” que os outros bandidos têm pelo MTB;
7- Os empreiteiros sim, estes são todos colocados como maus. São os “capitalistas malvados” que tocam o “sistema”, que controlam o “mecanismo”. Destaque para o maquiavélico Marcelo Odebrecht;
8- As personalidades de Lula e de Dilma são amenas. Não são mal-educados e baixos como sabemos que são. Lula é muito mais carismático na série que na vida real. Aliás, a série passa a impressão de que a Dilma só caiu por que foi passada para trás: a primeira temporada termina com uma conversa entre Michel Temer e Aécio Neves, planejando o impeachment;
9- O Aécio Neves é “O vilão” dentre todos os vilões. Maquiavélico, inteligente, é “bandido como todos os outros, mas é esperto, perigoso”. O personagem é muito caricato (vilão de novela das 8). Todas as vezes em que ele apareceu eu fiquei esperando uma risada do tipo AHAHAHAHAHA. Na opinião de Padilha, fosse o Aécio o presidente, a lava-jato não teria saído do papel. Só aconteceu porque a Dilma foi “inocente” demais e tomou uma rasteira;
10- Para finalizar, a narrativa praticamente culpa Sergio Moro e o MP pelo fracasso no caso Banestado. Coloca-os como incompetentes. O telespectador desinformado tem a impressão de que se Moro e o MP tivessem feito um trabalho decente lá atrás, a roubalheira do petrolão não teria acontecido.
Estas foram as minhas impressões a respeito da série. Sinceramente, não sei do que os petistas estão reclamando tanto. A tese do “Golpe” é clara na produção, a de que esquerda e direita são farinhas do mesmo saco também. “O mecanismo não tem lado”.
A análise está impecável, e eu tento responder a questão levantada: o PT ficou bravo porque não aceita sequer ser misturado aos outros, pois se julga melhor, mesmo sendo o pior. Aliás, é o pior em parte por conta desse cinismo tosco, dessa inversão absurda. Houve uma fase em que os petistas saíram do “nunca antes na História deste país” para o “sempre antes na História deste país”, tentando apelar para o “somos todos iguais”. Mas mesmo essa tática dura pouco. O PT quer ser melhor. Mesmo sendo muito pior, repito.
Rodrigo Constanino
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