Mário Guerreiro *, publicado no Instituto Liberal
Há pouco tempo, a correspondente da TV Globo em Roma anunciou-se para uma entrevista com o Sumo Pontífice: “Sua Santidade, Ilze Scamparini da TV Globo, Brasil”.
E o Papa Francisco foi logo soltando de chofre: “E quem vai ganhar a Copa?” É provável que ele esperasse como resposta: “o Brasil, Santidade”.
Mas Ilze talvez tivesse se sentido numa sinuca de bico:
Se fosse franca, diria isso. Mas, para não desagradar ao Papa, grande torcedor do San Lorenzo, diria: “a Argentina”. Mas, com esta resposta, desagradaria a grande galera de olhos colados na Globo.
Por brevíssimo momento, Ilze ficou sem saber que resposta dar, mas acabou rapidamente achando uma saída pela tangente: “E o senhor, não quer fazer uma previsão?”
Por sua vez, Francisco bem que quis dizer: “a Argentina”, mas se limitou a sorrir e foi logo desconversando.
“Bairrismo” até que rima com “ecumenismo”, mas estas duas coisas juntas não ficariam bem num Papa disposto a acolher todos os povos de boa vontade.
E isto inclui até mesmo os de má vontade, como os fundamentalistas islâmicos que querem comer os fígados dos “infiéis”, ou seja: judeus e cristãos.
Ah! Lembro-me como se fosse hoje… Nos tempos dos governos de exceção, muitos grupos hostis ao governante militar não só torciam contra o Brasil na Copa como também faziam campanha contra a vitória da Seleção!
É claro que não tinham nada contra o Esquadrão de Ouro, bom de bola e bom de couro. Mas não desejavam que o governo militar tirasse proveitos políticos da vitória da Seleção.
Ora, fosse qual fosse o regime de qualquer país, seria esperado e inevitável que o governo torcesse por uma vitória da Seleção, ainda que o governante pessoalmente amasse golfe e detestasse futebol.
Era assim nos tempos da guerra fria e é também assim nestes tempos bicudos do pós-guerra fria.
Em muitos países, e principalmente no Brasil, o futebol exerce poderosa influência sobre o humor das massas e este pode se expressar mediante protestos pacíficos, arruaças e outras perturbações da ordem pública.
Como pode também estimular um patriotismo exaltado, como os de Policarpo Quaresma e de Affonso Celso, este último autor de Porque Me Ufano de Meu País (primeira edição em 1900), obra geradora do “ufanismo”.
Ninguém expressou melhor do que o saudoso Nelson Rodrigues essa forte paixão das massas pelo futebol quando disse: “A Seleção é a pátria de chuteiras”.
No entanto, tudo indica que os tempos são outros. Os brasileiros em geral não deixaram de ser apaixonados pelo futebol, mas essa paixão parece ter se arrefecido um pouco nestes inícios do século XXI.
Ouso até dizer que, por incrível que pareça, o povo brasileiro amadureceu politicamente, ao menos neste particular.
Para se fazer uma ideia desse amadurecimento, basta comparar a grande desolação nacional com a perda da Copa de 1950 – coisa de que fui testemunha histórica de calças curtas e tomando guaraná – à quase-indiferença geral com a perda da última Copa na África do Sul.
Copa esta em que a Seleção Espanhola deixou de ser “a que joga como nunca e perde como sempre”, como nos tempos aziagos do Corinthians tão sofridos por sua torcida, a “Fiel”.
Apesar disso, tem muita gente agourando uma derrota do Brasil na Copa de 2014, e por motivos semelhantes aos que agouraram a derrota nos assim chamados “Anos de Chumbo”.
Só que agora o inimigo é outro!
Malgrado Dilmandona – enquanto “Comandanta” Suprema das Forças Armadas – ter se mostrado disposta a convocar o Exército Nacional para patrulhar e proteger as ruas, já há prenúncios de furdunços e rebuceteios em muitas partes da nação.
Nada contra esse apelo ao Exército.
Só acho que ela devia trazer de volta os soldados que estão há tanto tempo no Haiti, bem treinados no papel de policiar as ruas de Port au Prince, onde as duas grandes gangues rivais – Os Monstros e Os Canibais – estão sempre travando lutas ferocíssimas.
Mas aqui o circo já está armado. Só está faltando, para completar o espetáculo, o retorno do reprimido: dosBlack Blocs, Red Blocs, Pstu Blocs, Dirty Blocs et caterva.
Um banho de sangue? Não, apenas muitos quebra-quebras e muita quizomba produzida por uma mistura de blocos de sujos com patotas de intoxicados por ideologias anárquicas caquéticas.
“Mas quem vai ganhar a Copa?”
O Papa fez a pergunta errada. Devia ter perguntado: “Quem vai ganhar com a Copa?” E se eu estivesse no lugar de Ilze Scamparini, teria respondido na paleta: a FIFA!
FIFA, A Copa do Mundo é vossa! Com fifeiros não há quem possa!
Essa grande indústria do “velho e viril esporte bretão” [a expressão é do finado locutor esportivo Oduvaldo Cozzi] criada por João Havelange e alavancada por Joseph Blatter, um homem tão poderoso que foi capaz de gerar leis no Brasil!
Blatter só não se candidata a Deputado Federal porque é suíço-alemão e não fala português, como fala o palhaço Tiririca – o do “Pior do que está não fica” – eleito com 1.400.000 votos pelos eleitores do Estado de São Paulo.
Ô louco, meu! Tá variando, meu rei! Barbaridade, tchê! Trem doido, sô! É mole ou quer mais?
E o povo? Sifú, mané! A julgar pelo preço salgado dos ingressos, terá que se contentar com os telões e farta cerveja rolando redondo.
O custo da Copa já está em 25 bilhões. 95% ou mais dos gastos com a Copa foram do governo, mas só para não dizer que não mandei flores, 5% ou menos foram da iniciativa privada.
Em outras palavras: a maior parte da grana veio mesmo do de sempre. De quem? Ora, do vampirizado contribuinte sem retribuinte!
Antigamente, construíam-se estádios de futebol, como o Maracanã e o Pacaembu. Hoje constroem-se “arenas”.
Nome adequado aos novos tempos: nas suas arquibancadas e nos seus entornos digladiam-se gladiadores até a morte, mas sem antes dizer: “Ave César! Os que aqui vão morrer te saúdam!”
Mas não vou falar de maracutaias, mutretas, superfaturamentos, corrupção braba, obras fajutas de engenharia y otras cositas más.
Basta dizer que foram construídas arenas para mais de 50.000 torcedores em lugares cujos campeonatos estaduais não conseguem reunir mais de 5.000 torcedores.
Mas não há problema dessas arenas abrigarem uma meia-dúzia de gatos pingados: basta alugá-las – e por bom preço! – para igrejas que as encherão de devotos fiéis interessados em ouvir as mensagens de seus pastores.
E eu que nunca pensei que um dia a palavra da fé reuniria mais gente do que um Fla-Flu no domingo e show da Waleska Popozuda!
* Doutor em Filosofia pela UFRJ. Professor do Depto. de Filosofia da UFRJ.
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