O “intelectual” é aquele, como dizia Paul Johnson, que ama mais a ideia do que as pessoas de carne e osso. Talvez por um sentimento de alienação e distanciamento em relação ao povo, ao homem comum, visto como o verdadeiro alienado e “feliz” em sua ignorância pelo “intelectual”, este faz de tudo para se sentir povo, para, acima de tudo, falar em seu nome. Todo “intelectual” acha que recebeu uma procuração dos milhões de brasileiros que compõem o tal povo, mesmo quando vive numa bolha que o afasta completamente desse povo.
O caso da maioridade penal é sintomático. A esquerda progressista resolveu repudiar qualquer tentativa de se endurecer penas para menores criminosos, mesmo aqueles que matam, estupram e sequestram. O problema é que quase 90% da população brasileira, segundo pesquisas, é favorável à redução. Os “progressistas”, eles mesmos da classe média alta ou da elite, juram falar em nome do povo, mas remam contra os anseios desse povo. Reinaldo Azevedo, em sua coluna de hoje, comentou sobre essa “demofobia” contraditória dos petistas:
Quando um parlamentar favorável à emenda lembrava que, segundo o Datafolha, 87% dos entrevistados se dizem favoráveis à redução da maioridade, deputados de esquerda tomavam a palavra para vituperar contra o que muitos chamavam de “senso comum”. Entenda-se. Para eles, o povo é estúpido, não sabe o que é melhor para si e precisa de um ente de razão para orientá-lo. É a herança marxista vagabunda que sobrou no verbo frouxo dos que nunca leram Marx. Alguns nunca leram. Ponto. Intransitivamente.
Sabem como é… O populacho está tomado pela falsa consciência e precisa da razão iluminista do partido. E pensar que essa gente estava, até anteontem, pedindo Constituinte exclusiva para a reforma política e aprovação das emendas em plebiscito. Mas como? Segundo eles mesmos, os votantes não sabem o que é melhor para si, já que seriam a expressão do vulgo e do senso comum.
Os argumentos contra a redução da maioridade constituem uma das maiores coleções de falácias lógicas e mentiras reunidas sobre um só tema. Mas eu entendo o fundo psicológico e histórico que faz um esquerdista se solidarizar sempre com o algoz, nunca com a vítima. A humanidade será sempre um projeto para os (re)engenheiros de gente. Fascistas!
Esse debate é a cara de um PT que se divorciou do país. E olhem que nem me refiro àqueles companheiros que deveriam compor o núcleo da Papuda. Falo é da legenda que passou a ser, quem diria?, demofóbica e que substituiu o velho anseio de ser um “partido socialista e de massas” pela determinação de ser uma falange de socialites de capacete.
Os mesmos “progressistas” que queriam um plebiscito para a nova constituinte resolveram que o povo não sabe de nada, que não entende o que é melhor para si, e que, portanto, necessita da clarividência dos “ungidos”, da elite de esquerda que vai escolher o melhor em seu lugar. A contradição evidente entre paternalismo e defensores do sufrágio universal sempre foi algo que me chamou a atenção: o “povo” que essa esquerda defende é apenas uma abstração, pois os indivíduos de carne e osso que formam o povo são vistos pelos “intelectuais” como mentecaptos incapazes de decidir por conta própria qualquer coisa.
Não obstante, os “intelectuais” precisam insistir na tese de que falam em nome do povo, pois sem isso seu autoritarismo com tons fascistas ficaria exposto demais. Um exemplo? O jornalista Luiz Garcia, com claro viés de esquerda, escreveu em sua coluna de hoje sobre a maioridade penal, e pasmem!, colocou Eduardo Cunha do lado oposto ao povo, chamado por ele de “turma da arquibancada”, como se ambos quisessem coisas diferentes:
[…] é preciso reconhecer que, com algumas exceções, nossas penitenciárias fazem muito pouco para transformar condenados em cidadãos honestos. É mais comum que jovens condenados aprendam nas celas a serem mais nocivos para a sociedade do que eram quando lá entraram. E esse é um poderoso argumento, talvez definitivo, contra a proposta de redução da maioridade em discussão no Congresso.
Os deputados favoráveis à redução têm esperanças de ganhar a disputa. O presidente da Casa, Eduardo Cunha, que é dessa turma, já levou a plenário um texto que mudou o resultado da primeira votação. Ele tem direito a isso. Mas a turma da arquibancada continua torcendo contra. O seu melhor argumento é óbvio: a baixa qualidade da grande maioria de nossas prisões. Se não se der um jeito nisso, o que é bastante complicado, não faz sentido qualquer projeto que trate adolescentes como adultos.
Em primeiro lugar, o jornalista insiste na absurda tese de que a prisão serve para transformar bandidos em cidadãos honestos, e não para afastar o criminoso perigoso do convício social ou para puni-lo pelo crime em respeito à vítima inocente (ou seja, para se fazer justiça). Para ele, a situação de nossas prisões é um “poderoso argumento”, talvez “definitivo”, contra a redução da maioridade penal. Por sua “brilhante” lógica, deveríamos soltar todos os bandidos, não apenas os menores de idade. Talvez a esquerda tivesse orgasmos com essa ideia mesmo: criminosos soltos, e quem sabe “burgueses capitalistas” presos!
Mas o que nos interessa aqui é a total falta de elo com a realidade quando o jornalista fala em nome da “turma da arquibancada”, ou seja, apropria-se da voz das massas, do povo. Esse povo estaria torcendo contra Cunha e a medida da redução da maioridade. Onde? Na bolha dos progressistas? Eis o problema: essa gente só vive na Tribuna de Honra, no pequeno círculo das elites progressistas, e depois acha que representa o povo, a arquibancada. É um espanto!
Além das pesquisas de opinião mostrarem claramente que quase 90% dos brasileiros desejam a redução da maioridade penal, o governo Dilma, representante desses “progressistas” que fazem intensa campanha contra a medida, possui míseros 9% de aprovação, e 68% de rejeição! Nunca antes na história deste país um governante teve tanta rejeição e tão pouca aprovação, abaixo até da taxa de inflação. Lula, quando fez campanha com as mãos sujas de petróleo, estava sendo profeta duplamente, ao mostrar simbolicamente o petrolão e ao antecipar a taxa de aprovação de sua criatura:
Por extenso para o leitor atentar bem para o fato: nove por cento de aprovação apenas! Nível similar ao dos que desejam manter a maioridade penal no patamar atual, protegendo assassinos de 16 a 18 anos como se fossem “crianças indefesas vítimas da sociedade”. Poucas vezes uma causa teve tantos adeptos como a da redução da maioridade penal. Não chega a ser uma unanimidade pois sempre haverá aquelas minorias totalmente desligadas da realidade.
Justamente os “intelectuais” que amam mais uma ideia do que os seres humanos de carne e osso, vítimas dos marginais. Ironicamente, esses “intelectuais progressistas” juram representar… o povo! Não é hilário?
Rodrigo Constantino
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