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Aécio no Jornal da Globo: previsibilidade e transparência

Encerrando o ciclo de entrevistas com os principais candidatos à presidência, nesta quarta foi a vez de Aécio Neves ser sabatinado por William Waack e Christiane Pelajo no Jornal da Globo, após Dilma Rousseff fugir do embate (dizem as más línguas que foi, de longe, sua melhor entrevista até agora). O tucano foi bem em geral, lembrando do perfil do público que assiste a um jornal depois de meia-noite – ou seja, não é quem precisa acordar cedo para pegar no batente.

A palavra mais repetita pelo candidato foi “previsibilidade” (nada menos do que oito vezes usada em poucos minutos). Tentou passar a impressão de que, ao contrário das duas principais concorrentes, possui uma equipe confiável, que goza da estima e do prestígio dos investidores do Brasil e do mundo, e que isso, por si só, já será suficiente para garantir uma melhora nos indicadores econômicos e permitir mais tempo para os ajustes necessários.

Esquivou-se das perguntas mais objetivas, sem explicar em detalhes aquilo que foi questionado. Não disse, por exemplo, por que não foi capaz de capturar até agora o posto de candidato de oposição, uma vez que o índice de rejeição de Dilma é enorme, mas é Marina quem desperta nos eleitores o desejo de mudança.

Lembrando que Marina foi do PT por vários anos, que chegou a ser ministra de Lula, que está com o PSB que era governo até “ontem”, realmente parece algo difícil de explicar, pois o natural seria supor que Aécio canalizaria o voto de oposição e o desejo de mudança. Houve alguma falha de comunicação que o candidato não soube explicar, mas que meu amigo Rubem Novaes, creio eu, resumiu bem aqui.

Comparando-se a Marina Silva no que diz respeito à capacidade de gestão, e aproveitando também para atacar o atual governo, Aécio disse logo no começo:

A mudança se inicia a partir do primeiro dia do mandato do próximo presidente da República. E é isso que eu tenho tentado colocar de forma muito clara. Nós temos o melhor projeto para que essa mudança, esse sentimento de mudança amplamente majoritário na sociedade brasileira, se confirme adiante. Nós hoje vivemos uma grande frustração. O Brasil comprou um bilhete falsificado de loteria. Uma grande gestora que colocaria o Brasil em ordem, controlaria a inflação e permitiria o Brasil a voltar a crescer. Isso não aconteceu e por isso acho que perderá a eleição. Temos uma nova candidata que se apresenta com um conjunto de propostas absolutamente inexequíveis do ponto de vista prático e terá que explicar isso. O custo das propostas já anunciadas até aqui, fora as que certamente virão ainda durante a campanha, significa um aumento de gasto de R$ 150 bilhões ao ano, 3% do PIB. Só tem uma forma de se fazer isso: aumentando a carga tributária, que ela diz que não vai acontecer. Então, eu acho que esse conjunto de propostas poderá se transformar amanhã em uma grande frustração à sociedade brasileira.

Aécio não entrou em maiores detalhes sobre seu programa de governo na área econômica, que deve ser divulgado em breve, mas se mostrou familiarizado com os principais pontos que precisam mudar. Não quis se comprometer com medidas “impopulares” específicas, e se saiu bem ao alegar que o sofrimento do povo já está acontecendo por meio da inflação alta e do risco de aumento de desemprego. Garantiu que não vai mexer em “conquistas trabalhistas” ou em benefícios dos aposentados. Como, então, colocar a economia de volta nos trilhos?

Seu foco foi o tempo todo a questão da previsibilidade, da transparência. Em sua opinião, o “simples” fato de resgatar as regras do jogo, parar de ludibriar os investidores com malabarismos contábeis, ter mecanismos conhecidos de reajustes de preços, perseguir de fato o centro da meta de inflação com autonomia do Banco Central, cortar desperdícios que resultam da incompetência da atual gestão, isso já seria suficiente para a retomada do crescimento, melhorando a vida para todos.

É pouco perto do que necessitamos, de um grande choque de produtividade, mas é sem dúvida muito quando comparado ao estrago causado pelo atual governo Dilma. E Aécio é, sem dúvida, aquele que possui a equipe mais preparada e capaz de executar este projeto de resgate da confiança no governo e nas contas públicas. Colar em Marina a imagem de alguém sem o preparo adequado para a execução desse projeto foi a principal missão de Aécio na entrevista:

E economia é confiança. Nós temos as condições que as outras candidaturas não têm, até porque a da presidente perdeu e a da Marina não sabe exatamente o que significa isso, governar é com todos, com Lula, com Fernando Henrique. Então, chegou a hora de transformar estas bondades em projetos, eu acho que é isso que a sociedade brasileira vai cobrar da candidata Marina.

Ao depender de sua fala, não vem aí um pacote de reformas estruturais de que o país tanto precisa. Ao menos Aécio não teve a coragem de se comprometer com isso, e defendeu mais benefícios previdenciários, manutenção da indexação ao salário mínimo, poucas mudanças significativas nas leis trabalhistas, etc. Longe de uma agenda realmente liberal, mas é compreensível o receio de se erguer tais bandeiras tidas como impopulares e facilmente manipuláveis pelo PT para pintar o candidato como inimigo dos trabalhadores.

Dito isso, trata-se do melhor discurso até agora, e também dos melhores nomes para colocá-lo em prática. Marina, ontem mesmo, assumiu que pretende manter o programa Mais Médicos, por exemplo, algo que Aécio teve a coragem de condenar, ao menos nos moldes atuais. Ou seja, Marina pretende manter a mesada bilionária para a ditadura cubana? Se for isso mesmo, é um enorme equívoco. Ela precisa responder.

Diante das propostas de cada um, do discurso, do histórico e da equipe, o eleitor que não suporta mais o PT vive um dilema: Aécio Neves é o melhor nome, mas Marina Silva é a que tem maiores chances de derrotar Dilma no segundo turno, como mostram as pesquisas. Ciente desse dilema, Aécio enfatizou na entrevista que está seguro e confiante de que Dilma já perdeu, pois a imensa maioria quer mudança e rejeita seu governo. Quem for para o segundo turno com ela, venceria.

Falta um mês para as eleições, e a situação do tucano não está confortável. As pesquisas divulgadas ontem mostram que ele perdeu alguns pontos para Marina e está, agora, bem longe do segundo turno. Em sua defesa, gostaria apenas de lembrar que o mesmo clima de derrota dominava as torcidas do Flamengo e do Botafogo ontem. Ambos passaram para a próxima fase da Copa do Brasil. Viradas “milagrosas” acontecem…

Rodrigo Constantino

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