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Amyr Klink é um conhecido velejador, mas poucos sabem o que vai por trás de uma longa viagem pelos oceanos em termos de planejamento, cálculos etc. Já tive a oportunidade de assistir a uma palestra sua e fiquei bastante impressionado. Faz tempo, mas lembro bem de detalhes impressionantes, como a necessidade de usar uma seringa para tirar o ar de cada fruta seca que levava, pois ar pesa.

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Para sair num barco daqueles com o objetivo de dar a volta ao mundo, é preciso muita paciência, determinação e meticulosidade. Será que ele aprendeu tais coisas em sua faculdade de economia na USP? Nada disso. Em seu livro Não há tempo a perder, Klink dá é uma boa detonada na turma da USP, na faculdade em si, no perfil de seus colegas. Eis um trecho:

A USP era uma universidade de referencia, onde, no final dos anos 1970, já estavam todos os atores da política brasileira, como Delfim Netto, Affonso Celso Pastore, João Sayad, Eduardo Suplicy, Fernando Henrique Cardoso. Mas o curso era horrendamente ruim. Pobre. O currículo e a carga horária de outras faculdades, como a PUC, onde eu tinha amigos com quem conversava sobre o assunto, me pareciam muito mais eficientes e rigorosos. Na USP nunca fomos obrigados a fazer um trabalho. Alunos de economia que nunca aprenderam a elaborar um plano de negócio.

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Ninguém nunca nos ensinou a montar um banco, nem uma banca de vender pipoca. Como é que faz para abrir uma franquia? Eu não sabia nada de nada. Era o antiempreendedorismo por excelência. Como ensinar o público a se dar bem sem muito esforço. Como entrar para o concurso do Banco do Brasil e salvar sua pele para o resto da vida. Esta era a espinha dorsal do currículo da USP. Chegava ao final do segundo ano, quando me dei conta. Minha mãe, não existe nada na Terra tão ruim quanto esse curso.

[…] Neste período em que fiquei fugindo dos veteranos, entrando por vários lugares do prédio, descobri uma atividade que começava às quatro da manhã. Percebi que havia uma raia olímpica onde, no escuro, de madrugada, um monte de gente limpava barcos e remos. Era todo mundo sério e todos os dias, sem exceção, eles saíam para correr, dando a volta até o prédio da Biologia – o que totalizava um percurso de oito quilômetros em subida. Que diferença em relação ao mundinho que eu começava a frequentar naquela faculdade. Fiquei apaixonado pelo remo.

Paixão porque em tudo era diferente do que faziam os caras da USP. Em tese a USP é uma universidade para atender quem não tem recursos, mas eu só encontrava milionários na minha escola. Havia uma distorção naquilo ali. Também me parecia contraditório o pessoal do centro acadêmico, vindo de motorista para fazer greve contra um aumento de alguns centavos no almoço do bandeijão, que custava 68 centavos. No remo não havia essas contradições.

Era um universo onde existiam compromissos inadiáveis, calendários, estratégias. Treino todo dia, três horas na água. Esse mundo começava às 4h da manhã e às 7h15min acabava. Eu adorei aquilo. Quase ninguém que vinha treinar tinha carro. Um deles era sócio de uma loja de sapato, trabalhava no Baixo Augusta, todo mundo andava de ônibus, ía na zona… Os caras do remo tinham uma existência de verdade. Nenhum deles estudava na USP. Aluno da USP não acorda três e meia da manhã pra entrar em água fria e carregar barco nas costas.

Aquela lista de “proeminentes” já diz tudo. Eu, que fiz Economia na PUC-RJ, atesto que a qualidade de nosso curso e nossos professores devia ser bem melhor do que a da USP mesmo, mas também não era essa Brastemp. Sequer ouvi falar da Escola Austríaca em meus quatro anos de estudos! Mas sem dúvida a USP, e também a Unicamp, são infinitamente piores. A conclusão de que não ensinam a empreender, mas sim a buscar um concurso público, diz tudo, e explica porque o Brasil é o que é, essa porcaria.

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Minha filha, com 15 anos e no high school de uma escola pública em Weston, já tem aulas de empreendedorismo. Do lado cultural, canso de ver meninas ainda mais novas, com menos de dez anos, na porta do supermercado fim de semana vendendo coisas, ou fazendo sucos na porta de casa para vender. São os primeiros passos rumo ao empreendedorismo, conceito essencial para o progresso, mas desprezado pelos brasileiros em geral, que preferem olhar para o estado como o messias salvador.

Por fim, chama a atenção também o esquerdismo caviar daquele pessoal, que chegava de motorista e ficava fazendo protesto contra o aumento de alguns centavos na comida. É a cara desses “coxinhas mortadelas”, a turma de “mauricinhos” e “filhinhos de papai” que usam iPhone com capa do Che Guevara e acham que vão salvar a humanidade com seus protestos e “ocupações”. Tudo, menos estudar!

Essa galerinha pensa que representa os mais pobres, que faz parte da força revolucionária que vai criar um “novo mundo”, mas não passa de uma cambada de mimadinhos entediados e preguiçosos. Comentei em Esquerda Caviar:

Em A elegância do ouriço, Muriel Barbery usa uma das narradoras, uma menina muito inteligente de 13 anos, para descrever o desconforto com essa atitude de sua mãe. Elas moram em um endereço de luxo em Paris, repletas de conforto. Não obstante, sua mãe vive a pregar o socialismo, entre uma conversa e outra com suas plantas. E claro, mesmo depois de dez anos de terapia, ela ainda precisa tomar remédio para dormir…

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O autor coloca na outra narradora da história, uma concierge humilde, porém extremamente culta, as palavras de desprezo em relação ao grupo de riquinhos mimados que tentam aparentar um estilo artificial de pobreza cool:

Se tem uma coisa que abomino, é essa perversão dos ricos que se vestem como pobres, com uns trapos que ficam caindo, uns bonés de lã cinza, sapatos de mendigo e camisas floridas debaixo de suéteres surrados. É não só feio mas insultante; nada é mais desprezível que o desprezo dos ricos pelo desejo dos pobres.

No entanto, basta frequentar uma faculdade privada para ver a quantidade de jovens que aderem a esse estilo “riponga”, com suas camisetas do Che Guevara, apenas para entrar depois em seus carros importados do ano. São os “revolucionários de Facebook”, que escrevem em seus perfis da rede social americana o quanto odeiam o sistema capitalista americano e o lucro que tornou o instrumento viável.

Uma típica “riponga” dessas morre de medo de hormônios no leite vendido pela multinacional capitalista, mas aceita uma “bala” de qualquer estranho em uma festa rave. Contradição é sua marca registrada, e o importante é atacar sempre o sistema capitalista, assim como seu maior ícone, os Estados Unidos.

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Outro dia mesmo vi à venda uma capa para iPhone (aquele da Apple, empresa americana das mais lucrativas do mundo), que estampava o símbolo comunista. Nem era barata: custava R$ 90. Nada mais esquerda caviar que isso! Só falta vir com ring tone do Bob Marley de fábrica. Maneiro, bicho!

Posso até ver o rebelde, com cabelo despenteado, barba por fazer, camisa do Che, falando: “Mamãe, veja como sou revolucionário; olhe a linda capa com a foice e o martelo que comprei para o telefone que você me deu! Agora passa logo a mesada que quero ir no cinema com os camaradas ver aquele filme que detona com os Estados Unidos”.

Amir Klink deve ter conhecido muitos desse tipo. Fez bem em ir remar. Aprendeu muito mais coisa prática e útil para sua vida do que se tivesse ficado lá, escutando o militante disfarçado de professor enaltecer Marx ou organizando “protestos” com os colegas riquinhos em prol dos pobres…

Rodrigo Constantino