Por Luan Sperandio, publicado pelo Instituto Liberal
Foi aprovado por unanimidade o projeto de lei complementar responsável pela anistia aos mais de 2.600 policiais militares que participaram da greve realizada no Espírito Santo em fevereiro de 2017.
A iniciativa foi do governador eleito Renato Casagrande (PSB), cumprindo uma promessa de campanha. A legislação prevê ainda a reintegração de quem foi expulso da corporação e o pagamento retroativo de salários e benefícios — um impacto de mais de R$ 830 mil aos cofres públicos.
Como toda manifestação de classe, o protesto reivindicava reajustes salariais e melhores condições de trabalho. Vendida inicialmente como um protesto de esposas e filhas de policiais militares que, supostamente, impediam a saída das viaturas — uma narrativa rapidamente contradita —, a greve propagou-se por toda a região metropolitana da Grande Vitória, afetando 70% das cidades do estado. Ela durou ao todo 21 dias, período em que a vulnerabilidade e a consequente sensação de medo por parte da população tomaram conta de toda a unidade federativa, em especial na primeira semana do movimento. Houve a suspensão da prestação de serviços públicos, com escolas e postos de saúde fechados, além da não circulação de ônibus. Nem mesmo a coleta de lixo estava ocorrendo. Lojas, farmácias e agências bancárias ficaram de portas fechadas, e a população correu aos supermercados que funcionavam em regime especial para estocar comida. O clima de insegurança foi tamanho que em muitos momentos não havia nenhum motorista disponível em aplicativos de transporte individual, como a Uber.
Para conter a situação, foram convocadas as Forças Armadas e a Força Nacional de Segurança. Ao final, o então governador Paulo Hartung conseguiu superar a crise sem conceder aumentos salariais. Posteriormente, foram aprovadas reformas na polícia militar. Seu capital político, todavia, foi bastante danificado, com parcela da população sendo favorável ao movimento da PM. Não à toa, seu principal opositor no ES venceu a campanha em 2018.
Os efeitos colaterais da paralisação resultaram em mais de 900 roubos de veículos e 236 mortos no mês de fevereiro de 2017 — mais que o dobro do número de mortos no mesmo período do ano anterior. Ademais, segundo estimativa da Fecomércio, o prejuízo estimado para o comércio foi de R$ 330 milhões. Isso em um estado gravemente afetado pela recessão do país, cujo PIB despencou 12,2% em 2016.
Casagrande justificou a sanção ao dizer que “a tropa está doente, com uma pressão psicológica muito forte”, e que é preciso “motivar” a Polícia Militar capixaba, sendo necessária a anistia para “curar feridas”.
A verdade é que a aprovação do projeto representa tão somente a vitória de um movimento corporativista, evidenciando que as demandas de uma categoria podem ser exigidas sem a observância da legislação e variar conforme a conveniência de quem ocupa o poder. A anistia cria, ainda, um incentivo perverso: a abertura de portas para movimentos similares da categoria no futuro.
*Texto escrito em conjunto com Abel Teixeira, graduando em Administração – Ufes