O poeta romano Juvenal já tinha feito a pergunta básica: Quis custodiet ipsos custodes? Traduzindo: quem vigia o vigia? Delegamos um poder enorme aos políticos e burocratas, muitas vezes um poder arbitrário, de decidir numa só canetada o destino de setores inteiros. Mas quem vigia esses “vigilantes”? Qual o grau de responsabilidade que eles assumem? Como premiar os acertos e punir os erros?
Justamente por compreender que os mecanismos de incentivos não são muito adequados e que esses poderosos também são seres humanos, suscetíveis aos mesmos riscos e paixões que todos nós, é que o liberalismo prega menos regulação e controle estatal, e mais liberdade econômica. Os liberais têm receio de enormes aparatos regulatórios, pois sabem que existe o risco de captura por grandes empresas e ineficiência devido ao mecanismo perverso de incentivos.
O caso dos frigoríficos vem à mente. E como lembra o jornalista José Casado em sua coluna de hoje, o risco envolvendo remédios também não é nada desprezível, e pode ser a próxima bola da vez se nada for feito para melhorar a gestão da Anvisa. Casado recomenda como providências a serem tomadas que dirigentes sejam demitidos e a megaestrutura da Anvisa seja revista. Falta à Anvisa a capacidade de dar conta do recado de tudo aquilo que se propõe a fazer. Análises de medicamentos, por exemplo, não ocorrem desde 2012. Casado conclui:
A Anvisa é um repositório de registros de remédios, mas não analisa mudanças no perfil de segurança dos produtos que possam motivar, ou não, alterações no registro do medicamento ou ainda, sua retirada no mercado. Dos 1.585 pedidos que recebeu em 18 meses de 2015 a 2016, só analisou dois.
Na prática, atua como guichê de renovação automática de registros. Há situações estranhas, como a do Cicladol, usado em terapia de dores agudas. Registrado em 2000, teve a renovação pedida em 2004. A Anvisa rejeitou, a empresa recorreu, e o caso foi suspenso para “análise de eficácia e segurança” do remédio. Mesmo com a desconfiança técnica, o registro foi renovado automaticamente duas vezes, e o medicamento segue em circulação.
A Anvisa nasceu duas décadas atrás, na esteira do caso das pílulas de farinha do laboratório Schering, cujos anticoncepcionais ineficazes, Microvlar, chegaram aos consumidores. A boa ideia original, para controle e fiscalização de medicamentos, acabou no loteamento político das agências reguladoras. O resultado está aí: da carne ao remédio sobram burocracia, ineficácia, insegurança e um histórico de impunidade aos que deixam em risco a saúde coletiva.
Infelizmente, esse costuma ser o resultado prático das “belas ideias” estatólatras, de quem acha que basta criar lei e órgãos burocráticos para controlar tudo. Não funciona assim. E o efeito pode ser ainda pior, pois se cria o “moral hazard”: o público pensa que conta com especialistas filtrando o que é bom do que é ruim, e relaxa. Mas não tem ninguém vigiando o vigia. E o vigia, como podemos ver, dormiu no ponto faz tempo…
PS: Além da ineficiência naquilo que deveria ser sua função básica, a Anvisa também representa um risco de autoritarismo e excesso de intervenção indevida, quando resolve tolher a liberdade e retirar do indivíduo o direito de escolha dos riscos que aceita correr. Gravei um vídeo no passado sobre esse “fascismo” da entidade:
Rodrigo Constantino
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