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Após reforma previdenciária, foco deve ser retomada da agenda da produtividade

Macro e micro. Ambos merecem o mesmo grau de atenção. As mudanças macroeconômicas serão responsáveis pela estabilidade da moeda, pela volta da confiança dos investidores ao passarem a crer na estancada da sangria fiscal do estado. Já as mudanças microeconômicas serão responsáveis pelo choque de produtividade de que nossas empresas tanto precisam.

A reforma previdenciária é o carro-chefe da parte macro, e até aqui vem tramitando razoavelmente bem, apesar do tom catastrófico do ministro Paulo Guedes. Concordo com ele que retirar a capitalização é lamentável, mas como lembra o especialista Pedro Fernando Nery, o custo de transição é uma incógnita e gera dúvidas legítimas no processo:

A capitalização traria o chamado déficit de transição. O modelo, em que cada um poupa para si, se contrapõe à repartição, em que cada um recolhe tributos para pagar os atuais benefícios – como no INSS. Assim, a capitalização é considerada superior à repartição quanto à formação de poupança (juros mais baixos) e à ausência de subsídios cruzados (mais igualdade).

Entretanto, é difícil migrar de um regime de repartição para um de capitalização. Os benefícios já concedidos devem continuar sendo pagos, ao passo que arrecadação, ou parte dela, não existe mais. Como os trabalhadores em atividade deixam de recolher total ou parcialmente os tributos que pagam os inativos, o déficit aumenta. Os recursos que migram dos tributos (repartição) para a poupança individual (capitalização) precisam ser cobertos pelo Tesouro. O déficit total é acrescido do novo déficit, o déficit de transição.

O custo da transição da capitalização na reforma não foi conhecido, porque na verdade a Proposta de Emenda à Constituição (PEC) não criava o novo regime, só autorizava que futura lei complementar o fizesse.

Uma reforma perto de R$ 800 bilhões de economia em dez anos é melhor do que uma “ideal”, mas rejeitada pelo Congresso. Logo, na parte macro, a principal promessa parece caminhar na direção certa, ainda que muito aquém do que realmente necessitamos.

E, uma vez aprovada a reforma previdenciária, que é necessária, mas não suficiente, vem a questão das mudanças micro. Elas já começaram, e a MP da Liberdade Econômica vai nessa linha. Mas é preciso muito mais, e felizmente o governo parece ter essa noção. Foi o tema da coluna de Luiz Felipe D’Ávila no Estadão hoje:

O ministro da Economia, Paulo Guedes, já deu o norte. O Brasil tem de abrir a economia, privatizar empresas estatais, investir na agenda da retomada da produtividade e retirar o fardo pesado do Estado das costas dos brasileiros que desejam empreender, produzir e investir. Foi criada a Secretaria Especial de Produtividade, Emprego e Competitividade, comandada pelo secretário Carlos da Costa, que está encarregada de apresentar as reformas microeconômicas para melhorar o ambiente de negócio e a competitividade. A primeira boa providência do secretário foi estabelecer uma série de conversas com o setor produtivo para entender os principais entraves que as empresas enfrentam para fazer negócio no País. Essas demandas balizaram uma série de medidas que o governo pretende anunciar logo após a votação da reforma da Previdência. Há programas de simplificação de regras, normas e processos; iniciativas pró-mercado para melhorar a competição saudável, a prática concorrencial e impulsionar o promissor segmento da economia digital. O governo também prepara um programa de treinamento e capacitação de pessoas, em parceria com empresas privadas e entidades de classe, a fim de que os milhares de desempregados possam adquirir as habilidades necessárias para retornar ao mercado de trabalho.

[…]

A agenda da produtividade precisa, também, do respaldo do Congresso para aprovar dois projetos cruciais. O primeiro é a reforma tributária. A Câmara dos Deputados já aprovou na Comissão de Constituição e Justiça (CCJ) o projeto do deputado Baleia Rossi (MDB-SP) baseado nas propostas de simplificação tributária do diretor do Centro de Cidadania Fiscal (CCiF), Bernard Appy. O projeto contempla substituir cinco tributos (PIS, Cofins, IPI, ICMS e ISS) por um único imposto, o Imposto sobre Bens e Serviços (IBS), e propõe uma transição gradual para evitar perdas de receita dos Estados e municípios. Trata-se de uma das melhores iniciativas para desfazer os efeitos nefastos de um sistema tributário que aumenta o custo de transação das empresas, onera o valor dos produtos com impostos em cascata, prejudica a competitividade do País, estimula a guerra fiscal entre os Estados e, por fim, cria incentivos perversos que incitam a corrupção, a extorsão e a concorrência desleal.

O segundo projeto é a Lei de Liberdade Econômica. O Brasil tornou-se um dos países emergentes mais inseguros do mundo para fazer negócio. A irracionalidade de normas e regulações conflitantes entre União, Estados e municípios abriu o caminho para o voluntarismo jurídico, a intervenção arbitrária do Estado na economia e a corrupção. A Lei de Liberdade Econômica pretende criar um ordenamento de regras e de normas para eliminar as competências conflitantes entre os entes federativos, diminuir o ativismo jurídico e cercear o voluntarismo burocrático, que se tornaram gigantescos entraves para os negócios, investimentos e a inovação. Felizmente, o presidente da Câmara, Rodrigo Maia, já instalou a comissão para apreciar este projeto, que pode reduzir dramaticamente a insegurança jurídica no País.

Esse é o caminho. A receita está dada, com o diagnóstico feito pelos melhores economistas. Não há muito mistério ou dúvida sobre o que fazer. Os maiores desafios são na execução. As medidas não podem ser impostas por um “déspota esclarecido”. Elas precisam passar pelo crivo do Congresso, o que é sempre um risco, um problema, mas parte inevitável de uma democracia.

Nem toda a agenda liberal da equipe de Guedes será aprovada, claro. Mas se boa parte dela passar, o Brasil poderá finalmente deixar para trás a “herança maldita” do PT. É bom correr, pois as previsões de especialistas para o crescimento da economia vêm sendo reduzidas a cada semana. O Brasil tem pressa!

Rodrigo Constantino

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