O impasse diante das trapalhadas e, por que não dizer?, crimes cometidos por Dias Toffoli e Alexandre de Moraes continua. O Brasil não tem as instituições mais sólidas do mundo, e elas ficaram ainda mais esgarçadas por conta desse arbítrio todo, desse gritante abuso de poder. A pergunta feita pelo poeta romano Juvenal volta à cena do cotidiano: quem vigia o vigia? Se o próprio guardião da Constituição rasga as leis dessa forma, a quem recorrer? Um cabo e um soldado?
Em seu editorial de hoje, a Gazeta do Povo alega que o plenário do próprio STF é o último freio antes de uma crise institucional grave. Resta saber se será capaz de reverter o estrago causado por seus ministros, incluindo o presidente da instituição. Políticos flertam com a possibilidade de um impeachment e também de uma CPI que investigue o Poder Judiciário. Eis um trecho do editorial:
Com o prolongamento do impasse em torno do inquérito que apura fake news que corre no Supremo Tribunal Federal (STF), sob a relatoria do ministro Alexandre de Moraes e tutela do presidente do tribunal, ministro Dias Toffoli, o Brasil está a ponto de entrar em uma crise institucional sem precedentes. Em uma série de ações que configuram claro abuso de poder, Toffoli e Moraes assumiram funções persecutórias próprias do Ministério Público, em contrariedade à Constituição, ensejando uma reação aguda não só da opinião pública, mas da sociedade civil organizada, de outras instituições, como a Procuradoria-Geral da República, e de membros do Congresso Nacional.
O sistema de freios e contrapesos na separação dos poderes foi concebido justamente para evitar esse tipo de abuso. Há freios e contrapesos internos, por meio de procedimentos e pelo controle dos próprios pares – um exemplo do qual, no Judiciário, não deixa de ser o duplo grau de jurisdição e a existência de recursos. Mas há também freios e contrapesos externos, em que Executivo, Judiciário e Legislativo atuam para coibir, preventiva ou reativamente, eventuais abusos uns dos outros.
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A ampla maioria da comunidade jurídica razoável está de acordo que a manobra regimental que permitiu ao STF tornar-se, ao mesmo tempo, vítima, investigador e julgador em última instância agride de maneira grave e inédita uma série de normas legais e princípios constitucionais.
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O imbróglio todo só não chegou ao ponto da ruptura institucional perpetrada pelo Judiciário porque ainda há tempo de a maioria do tribunal fazer um chamado ao bom senso e restaurar a ordem constitucional, articulando para o que plenário do Supremo enterre o inquérito aberrante e anule todas as decisões tomadas em seu bojo.
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A persistir a situação absurda que os dois ministros criaram, o impeachment de Toffoli e Moraes estaria justificado e seria a solução institucional adequada a ser conduzida de forma responsável pelas lideranças políticas. A qualidade da democracia brasileira e a estabilidade do país não dependem de o STF tornar-se intocável e seus ministros converterem-se deuses inimputáveis.
O presidente do STF segue na “defensiva”, justificando suas medidas abusivas com a alegação de que a reportagem foi “orquestrada” para constranger o Supremo e que a liberdade de expressão não pode “alimentar o ódio“. O ministro se acha uma espécie de “tirano do bem”, confundindo sua função institucional com algum tipo de missão nobre incompatível com seu cargo.
“A liberdade de expressão não pode servir à alimentação do ódio, da intolerância, da desinformação. Essas situações representam a utilização abusiva desse direito. Se permitimos que isso aconteça, estaremos colocando em risco as próprias conquistas obtidas em 1988”, afirmou Toffoli.
É uma visão simplesmente absurda do que seja liberdade de expressão e também o papel do STF. Com base nessa desculpa esfarrapada, o ministro acha que pode atropelar as leis e adotar a censura prévia, ignorando o devido processo legal. Conceitos vagos, interpretados por ele mesmo, serviriam para se impor um regime opressor no país.
“É ofensa à instituição à medida que isso tudo foi algo orquestrado para sair às vésperas do julgamento em segunda instância. De tal sorte que isso tem um nome: obstrução de administração da Justiça”, disse o presidente do STF em entrevista publicada nesta quinta (18) pelo “Valor Econômico”.
Reparem no grau hiperbólico de sua interpretação subjetiva: Toffoli acha que sabe o que os responsáveis pela reportagem querem pelo timing de sua publicação, ou seja, ele pune, como um tirano, a suposta intenção dos autores da reportagem!
O tiro saiu pelo culatra. Se a intenção de Toffoli era calar a imprensa e impedir a circulação da reportagem, ele errou feio o alvo. Ocorreu o “efeito Streisand”: após a censura, a repercussão sobre a matéria envolvendo Dias Toffoli aumentou mais de 20%.
Toffoli quer bancar o Napoleão tupiniquim, pretende se colocar acima das leis e, com base em interpretações subjetivas, atropelar os limites constitucionais de sua função. Não há mais como tolerar sua presença no STF. Toffoli deve sair. Ou cada vez mais gente razoável e moderada vai mesmo optar pela “solução” drástica: um cabo e um soldado!
Rodrigo Constantino