A instabilidade política abala as instituições e já afeta a economia, afirma Arminio Fraga, ex-presidente do Banco Central e sócio da Gávea Investimentos, em entrevista neste domingo ao GLOBO. Ele vê, nas ações do governo e nas declarações do presidente Jair Bolsonaro , um retrocesso na democracia, em seu sentido mais amplo, que dificulta a retomada da confiança e dos investimentos.
Será que o que nós estamos vendo no meio ambiente e na educação vai se repetir em outras áreas?, questiona o economista, que responde: “É claro que é possível. Está tudo muito imbricado com a questão maior do investimento, da confiança, até mesmo do gasto das pessoas, que ficam com medo. Além disso, o Brasil segue com um desemprego muito alto, muita gente vai ficando para trás e o ambiente de negócios fica prejudicado. Muita gente elogia a economia publicamente, mas não investe.”
Arminio ainda criticou o lado mais extremista do presidente e sua base: “Estamos olhando não apenas instituições, mas valores. Essa questão está presente desde a campanha, e diz respeito a preconceitos os mais variados, de questões raciais à misoginia ao obscurantismo”.
É preciso dar um leve desconto, pois Arminio vem articulando com um grupo de centro-esquerda que tem Luciano Huck como provável nome para disputar as eleições em 2022. Os rótulos que muitos usam para descrever Bolsonaro, da mesma forma que ocorre com Trump nos Estados Unidos, soam às vezes um pouco exagerados. É justamente por uma questão de valores morais que muitos da classe média encontram guarida em alguém como Bolsonaro, apesar de tudo, contra os excessos dos “progressistas”, cujos “valores” enxergam como amorais ou imorais.
Mas, se essa parte da crítica pode soar excessiva, o primeiro ponto me parece mais relevante e acurado: a verborragia e a postura de Bolsonaro têm gerado maior insegurança política, e investidores costumam demandar estabilidade e previsibilidade no cenário. Isso pode estar custando caro em termos de investimentos sim. Os projetos continuam engavetados, pois os empresários enxergam os avanços das reformas, mas temem o quadro conflituoso na política, muito dele estimulado pelo próprio presidente.
Além da política, o Judiciário produz incertezas, em especial o próprio STF, como admite Arminio: “O Supremo, que no caso do mensalão agiu de maneira rápida e coerente, de uns tempos para cá vem tomando mais decisões de forma monocrática, e as coisas têm sido mais erráticas, ou não têm andado”.
Enfim, a economia sob Paulo Guedes caminha na direção certa, mas não parece ser suficiente. Os ventos que vêm da política e do STF não ajudam na retomada dos investimentos, infelizmente.
Rodrigo Constantino
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