As diferenças de uma sociedade de confiança para uma selva de malandros podem ser percebidas nos detalhes do cotidiano. Falo de muitas dessas coisas no meu livro Brasileiro é otário? – O alto custo da nossa malandragem. E comento agora duas novas, para ilustrar o contraste.
Como muitos sabem, o Matthews (Mateus para os íntimos) vem aí. Já passou pelo Haiti e chega a Cuba nesse momento. E furacão traz histeria por aqui em Miami. A fila do Costco hoje estava quilométrica, a turma pegando toneladas de água e mantimentos (que não sei como não acabavam). Parecia que se preparavam para o Apocalipse.
Mas eis o detalhe: a fila era organizada, tranquila, cada um aguardando a sua vez, sem qualquer resquício de confusão, de gritaria, de correria, de “espertos” furando a fila para se dar bem. Imagino como seria um alerta de furacão categoria 4 no Rio. Como ficaria o Guanabara, o Mundial?
E outra: meu Powerbeats deu problema. A Apple me mandou uma caixa pelo Fedex, eu coloquei o device e bastava levar a uma Fedex e despachar, tudo já devidamente pago. Quando cheguei, estava uma certa fila, e eu não sabia direito em qual deveria ficar. Uma moça que trabalhava lá passava nesse momento e perguntei: “Onde devo ir para enviar essa caixa?”. Ela quiser saber se era apenas para mandar a caixa, e se eu queria um recibo.
Ainda titubeei: se fosse no Brasil, será que eu abriria mão de um recibo, o comprovante de que efetivamente coloquei no Correio o produto? E se ele fosse desviado? E se a funcionária simplesmente ficasse com minha caixa para ela? Pensamentos ruins, de um pessimista, de um descrente na espécie humana, eu sei. Sinto um pouco de vergonha. Mas é que são muitos anos de Brasil, de Rio de Janeiro.
E sabem como é: once beaten twice shy. Quem já foi mordido por cobra tem medo até de linguiça. Fiquei um pouco apreensivo, mas na mesma hora respondi: “É só colocar a caixa sim, e não precisa de recibo. Toma aqui e muito obrigado. Bye”. Fui embora, e um dia depois – hoje – já recebi o email da Apple avisando que meu produto chegou e será reparado em no máximo três dias. Ufa!
É bom viver numa sociedade de confiança, mais organizada e civilizada, em que as pessoas não esperam levar uma apunhalada de algum malandro pelas costas a todo momento. Sim, tem vários problemas aqui, como esse huricane season. Depois do Mateus já vem a Nicole, uma dupla desagradável. Mas aí penso que no Rio eu teria não o furacão, a ameaça natural, mas sim aquela artificial da malandragem, e fico mais tranquilo.
A turma começa a avaliar um plano de evacuação por aqui, ou de estocagem de mantimentos em casa. Então ficamos assim: enquanto o carioca tem de fugir de Freixo, o “coxinha” em Miami tem de fugir do furacão. O consolo é que o estrago causado pela natureza ainda é bem menor do que aquele rastro de destruição deixado pelo socialismo. Triste mesmo é quando juntam as duas coisas: furacão e socialismo, como deve ocorrer em Cuba. Aí é o fim do poço mesmo…
PS: Se o blog ficar menos ativo nos próximos dias é porque “deu ruim” por aqui, e o Mateus passou deixando a pequena e charmosa Weston sem eletricidade. Veremos. Estou com meus mantimentos para resistir. “Se a tormenta não me deixa escolha, então escolho a tormenta”, dizia Karl Kraus. O que é um furacão de meia-tigela perto de um segundo turno entre Crivella e Freixo? Vamos com tudo!
Rodrigo Constantino