O governo Jair Bolsonaro planeja dar isenção completa de vistos, sem exigir reciprocidade, a um grupo de quatro países considerados estratégicos para o turismo no Brasil – Estados Unidos, Canadá, Japão e Austrália. Os ministros do Turismo, Marcelo Álvaro Antônio, e das Relações Exteriores, Ernesto Araújo, se reúnem nesta quinta-feira, 17, para discutir detalhes da proposta, na lista de prioridades para os primeiros cem dias de governo.
Os ministros já conversaram informalmente sobre o tema e, segundo o titular do Turismo, houve sinal positivo por parte do chanceler. Em governos anteriores, havia resistência na diplomacia à liberação unilateral. “Tive uma conversa preliminar com o ministro Ernesto, e ele vê com muito bons olhos esse caminho de acabar com a política de reciprocidade. A minha proposta inicial é que nesses países onde já foi implantado o visto eletrônico – Estados Unidos, Canadá, Japão e Austrália -, a gente já consiga promover a isenção completa de vistos”, disse Antônio.
Desde dezembro de 2017, o Brasil criou um sistema totalmente virtual de emissão de vistos, que reduz a burocracia para esse grupo de turistas. Entre o pedido, a apresentação de documentos e a liberação, o tempo estimado é de 72 horas.
Agora, caberá ao Itamaraty estabelecer os critérios de escolha de quais países receberão a isenção completa. O ministério analisa, por exemplo, se há riscos de um fluxo migratório de determinado país para o Brasil.
Antônio afirma que a liberação pode ocorrer ainda este ano. Na reunião desta quinta, os ministros vão discutir procedimentos burocráticos. “O mais importante a gente já tem: a visão do ministro Ernesto de que esse é o caminho.”
Embora haja expectativa de que, após a liberação unilateral, os quatro países facilitem a entrada de brasileiros, o argumento do governo para abandonar a reciprocidade é econômico. “Vai ajudar, e muito, a trazermos emprego e divisas aqui para dentro. Precisamos gerar emprego. Com a reciprocidade, nesse aspecto, os prejudicados somos nós”, diz Antônio.
Entendo o conceito de reciprocidade na diplomacia internacional, e sei que alguns podem considerar uma decisão unilateral dessas como sintoma do nosso velho complexo de vira-latas. Uma reportagem na Gazeta de Guido Orgis toca justamente nesses pontos, alegando que a decisão do governo pode simbolizar que o Brasil é um país de segunda classe:
O episódio do visto é o que pega mal na classe média-alta brasileira, que precisa se submeter a uma enorme burocracia para conseguir viajar aos Estados Unidos, Canadá, Austrália e Japão, os quatro países que estão na lista de isenção proposta no governo. A corrente majoritária em relações internacionais diria que o Brasil precisa manter uma reciprocidade no tratamento como forma de não permitir um tratamento pior a seus cidadãos em outros países. Se país A pede um carimbo, o Brasil também pede até os dois entrarem em acordo.
Já houve diversas conversas com os EUA sobre concessão de visto e elas nunca levaram à isenção do pedido prévio no país de origem. O que se conseguiu foi uma melhora no processo, com maior agilidade no envio de formulários e a retirada de entrevistas (no caso dos EUA, para brasileiros jovens e idosos ou para quem está renovando o visto).
A imigração é algo sensível para os quatro países que seriam agraciados com a concessão brasileira. Em todos os casos, há políticas para a entrada ordenada de imigrantes e o receio da chegada de pessoas com baixa qualificação que queiram permanecer ilegalmente no país. A regra de visto prévio serve para frear cidadãos de países que têm o perfil para essa permanência ilegal. Como é claro que a maioria dos turistas brasileiros indo para Miami não é formada por imigrantes ilegais, há uma questão de afirmação na manutenção da reciprocidade.
Como disse, entendo os argumentos, mas não concordo com a necessidade de reciprocidade nesse caso. Quando o governo brasileiro petista quis retaliar os Estados Unidos criando mais dificuldades para os turistas americanos entrarem no Brasil, escrevi à época criticando, pois isso sim, me parece complexo de vira-latas. Um brasileiro realista pode compreender perfeitamente que o Brasil e os Estados Unidos apresentam realidades distintas, e que não é complexo de inferioridade admitir isso, mas puro realismo.
O passaporte brasileiro não é dos mais caros no mercado negro à toa. Qualquer um pode se passar por brasileiro, já que somos um país miscigenado. Muitos brasileiros tentam ir para os Estados Unidos de forma ilegal, enquanto o oposto nunca ocorre: não vemos americanos tentando entrar ilegalmente no Brasil para desfrutar das “conquistas trabalhistas”. O medo com o terrorismo islâmico é diferente em cada situação. E por aí vai.
Logo, acho que a pura retaliação em nome da reciprocidade é birra infantil, e que se faz sentido para nós facilitar a entrada de turistas de países desenvolvidos, então devemos fazer isso, não importa que eles não façam o mesmo em relação aos turistas brasileiros, por vários motivos (compreensíveis). Atrair mais turistas é do interesse nacional. O Brasil tem enorme potencial nessa área, muito mal explorado. Facilitar a vinda de turistas, portanto, é algo bom e desejável. O governo Bolsonaro acertou nessa medida.
Rodrigo Constantino
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