Não deve ser fácil ser demonizado diariamente pela mídia mainstream e pelo establishment, ser tratado como um fascista, homofóbico, xenófobo, racista, que está prestes a lançar o país no caos, na barbárie, na ditadura e no retrocesso. Ainda mais por gente tão pronta para mentir, distorcer, acusar os demais diante de um espelho. É apenas humano reagir não só com firmeza, mas com raiva.
Vejamos o que fez Nancy Pelosi com Trump esta semana, por exemplo. Eles tinham uma reunião marcada para discutir um pacote de investimento federal em infraestrutura. Minutos antes, Pelosi deu uma entrevista em que acusou o presidente de estar “encobertando” coisas, ao falar sobre o caso russo.
Ora, as investigações que levaram ao relatório de Robert Mueller, após centenas de testemunhas e milhões de dólares consumidos, mostraram que não houve conluio e não há prova para indiciar o presidente por obstrução. Não obstante, Pelosi diz que Trump estaria “encobertando” informações, ou seja, crimes. E diz isso, uma leviandade sem qualquer evidência, pouco antes de se reunir com ele!
Não é fácil evitar uma reação emotiva. Trump caiu na armadilha. Chegou na reunião, fez um breve discurso, e foi embora, fazer um pronunciamento público diante de um mural com dizeres sobre a ausência de conluio. Compreensível. Mas eficaz do ponto de vista político? Parece que não. Os democratas conseguiram exatamente o que desejavam, e deram várias declarações de como Trump é emocionalmente instável e não se preocupa com a infraestrutura capenga no país.
São uns canalhas, uns hipócritas, uns calculistas frios! Invertem tudo, com doses cavalares de cinismo. Não é trivial manter a calma diante de um jogo tão sujo. Mas Trump é presidente, e precisa manter a calma. Teria sido muito mais inteligente se ele chegasse à reunião lamentando o cinismo da líder democrata, as acusações irresponsáveis e levianas, para logo depois mostrar magnanimidade e dizer que o interesse do povo americano precisa estar acima disso, e que portanto vai negociar com a oposição para o bem da nação.
Assim como Trump, Bolsonaro é retratado pela imprensa e pela elite “progressista” como um ser humano terrível, como alguém abjeto, disposto a sair espancando gays, oprimindo mulheres e colocando correntes em negros. É a visão que muitos tentam passar do presidente, e é claro que ele não tem sangue de barata. Mas precisa evitar as cascas de banana. Precisa mostrar mais frieza e não cair no jogo dessa turma. Há um país a ser governado, reformas a serem aprovadas, articulações a serem feitas, inclusive com adversários políticos. É do jogo democrático.
A retórica beligerante serve para mobilizar militância, mas não para atrair moderados e independentes. As pesquisas mostram que a reeleição de Trump não será fácil se ele não conquistar uma parte do público que se sente incomodada com seu perfil. Não é preciso ser “tucano”, claro. A postura mais incisiva muitas vezes rende bons resultados.
Mas é preciso cuidado para não exagerar. Os ataques constantes aos produtores de “fake news” e o espetáculo mais belicoso diante dos adversários políticos podem surtir efeito em quem já aderiu, mas não necessariamente cai bem com os mais neutros. Quando Bolsonaro tenta humilhar uma jornalista da Folha, por exemplo, só por ela falar em corte quando é contingenciamento, isso gera delírio nos bolsonaristas, mas como reage a senhora que não se liga muito em política e vê essa reação na televisão?
Como eu disse, é apenas humano ficar revoltado com tanta distorção e ataque pérfido. Em parte, reagir com “mitadas” e virar as costas para o “politicamente correto” também serve para mobilizar militância. Mas o risco é extrapolar, confundir a própria bolha com a população toda, focar demais nas curtidas das redes sociais e esquecer do restante.
Trump e Bolsonaro são fenômenos reativos justamente a essa canalhice “progressista”. O risco é reagirem tanto e da mesma forma truculenta, que se transformem na caricatura que criaram deles. Se forem percebidos pela maioria como sisudos e sem qualquer capacidade de simpatia, isso pode ser fatal do ponto de vista político.
Rodrigo Constantino
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