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Brasília - Os deputados Jair Bolsonaro e Eduardo Bolsonaro falam com a imprensa (Fábio Rodrigues Pozzebom/Agência Brasil)
Brasília - Os deputados Jair Bolsonaro e Eduardo Bolsonaro falam com a imprensa (Fábio Rodrigues Pozzebom/Agência Brasil)| Foto:

Jair Bolsonaro fez seu primeiro pronunciamento como futuro candidato pelo Patriota, novo nome que adotará o Partido Nacional Ecológico (PEN). Foi, em resumo, um bom discurso do ponto de vista estratégico. Bolsanaro fala à classe média brasileira, cansada da roubalheira, da imoralidade, da degradação de valores e da agenda “progressista” que vem destruindo a família e as tradições.

Um primeiro ponto a destacar: seu pronunciamento já teve quase 500 mil visualizações pelo Facebook até agora, o que demonstra como a era das redes sociais mudou a política, retirando parte do excessivo poder concentrado na grande mídia. João Doria é outro que vem explorando esse contato direto com o público, o que esvazia a capacidade de distorção da “fake news”, com seu claro viés de esquerda.

O ponto mais fraco, sem dúvida, foi o próprio PEN. Com certeza uma decepção para os seguidores do deputado. Seu presidente é muito ruim, fala mal, não consegue articular bem seu raciocínio, sem falar da credibilidade questionável da sigla. O namoro recebeu uma ducha de água fria quando Bolsonaro disse que, hoje, não assinaria a parceria ainda, que isso seria prematuro. O próprio Bolsonaro disse que não está em meio de santos, mas que também não vai fazer conchavo com o diabo.

Tal realismo, porém, não esteve presente na hora de explicar como governaria com um Congresso dominado por pilantras. Bolsanaro disse que não tem partido, mas tem o povo, e que caberá a todos os eleitores mudar o quadro do Parlamento, ou seja, votar melhor para que, em 2019, outros políticos  melhores estejam no poder. É uma resposta retórica, sem substância.

O problema continua: obviamente o Congresso ainda terá uma grande parcela de picaretas, ou de deputados com outras pautas, o que é legítimo. O PMDB seguirá gigante. Democracia é negociar, fazer concessões, engolir sapos e nem sempre conseguir o que se quer. Não é local para o ideal, mas para o possível. Essas questões permanecem sem respostas: como o “exército de um homem só” poderia, de fato, mudar tanto assim o país? De cima para baixo? Na marra? Por decreto?

O fato de alguns seguidores mais fanáticos flertarem com a ideia de fechar o Congresso, de limpar a sujeirada toda da política, uma postura que o próprio Bolsonaro, de alguma forma, já fomentou com declarações passadas, é algo que preocupa, com toda razão. Podemos pinçar alguns comentários assustadores como este:

Aliás, o pior do “bolsonarismo” são sem dúvida os “bolsominions”, e acompanhar os comentários em tempo real era algo um tanto constrangedor: elegeram, parece, um Pai, um messias salvador, um Deus, não um bom candidato a presidente. Não são bem elogios, mas uma bajulação impressionante, digna de espanto, que expõe o fenômeno em curso: o povo está desesperado e precisa de uma tábua de salvação para manter as esperanças.

Bolsonaro explora bem esse sentimento, incorpora alguém que vai enfrentar com coragem toda a corja de marginais e comunistas do país (o que inclui, pelo visto, os tucanos também). Como deputado, travou o bom combate mesmo, apesar de não ter grandes resultados concretos para mostrar. Mas governar um país é diferente, o buraco é mais embaixo, e é preciso mais do que retórica, do que slogans patriotas, do que promessas. É aí que mora o perigo. Eis o calcanhar de Aquiles de Bolsonaro.

O deputado até tentou se defender da acusação de não entender de economia. Alegou que outros presidentes não entendiam, e que um presidente não precisa entender de saúde, de agronomia etc, pois vai se cercar de bons nomes para tanto. Está certo, claro, ainda que noções básicas de economia sejam desejáveis (vejam o que aconteceu com Dilma no poder). Mas eis o ponto: qual a equipe de Bolsonaro? Quais nomes o inspiram? Delfim Netto?!

Os presidentes do regime militar foram elogiados nessa área, mas o legado é sofrível, para dizer o mínimo. Especialmente o de Geisel, o nacionalista criador de estatais. Bolsonaro diz defender um estado menor, que interfira menos na vida do cidadão e na economia, o que é alvissareiro, mas logo em seguida fala de “vale do nióbio”, como se soubesse qual setor merece investimentos, como se flertasse com uma ideia estapafúrdia de uma Niobiobras da vida.

Para piorar, fez uma comparação com o centro de inovação tecnológica na Califórnia, perguntando porque não podemos ter um Vale do Nióbio se os americanos têm o Vale do Silício. Ora, Bolsonaro por acaso pensa que é o silício a razão da riqueza californiana? Essa mentalidade típica dos militares, de que o recurso natural é a riqueza em si, ainda está presente em Bolsonaro, um ranço ideológico lamentável.

Enfim, a necessidade de fechar com um partido pequeno e fraco como o PEN é um problema, e a visão econômica continua uma fraqueza evidente, além das questões complexas de governar na prática, caso eleito. Esse papo de que não precisa de partidos porque tem o povo soa muito jacobino para o gosto de qualquer liberal, conservador ou democrata.

Dito isso, Bolsonaro fez um bom discurso, pois captura como poucos a demanda popular, o grau de insatisfação geral com o establishment, com a política, com os intelectuais e com os “valores” vigentes, deturpados pela esquerda. O tom reacionário atrai nessas horas, ao prometer resgatar uma espécie de Éden perdido, com um passado inexistente que acaba sendo fantasiado, ou no mínimo maquiado. Quem está com raiva do presente e medo do futuro é presa fácil desse discurso.

Mas, justiça seja feita, se ele for bem dosado e equilibrado, pode servir como combustível para uma necessária luta patriota sim, desde que não escorregue para um nacionalismo tacanho e autoritário. Até porque o povo cansou justamente da frouxidão, da pusilanimidade, da conversinha fiada.

Em dia em que o PSDB solta uma peça de marketing que mais parece feita por um petista, pedindo desculpas por seus “erros”, e até Doria, o “tucano corajoso”, que bate sem dó em Lula e no PT e desafia a imprensa, resolve marcar conversa com o petista Suplicy, esse tipo de recado de Bolsonaro vai naturalmente conquistar mais aplausos:

“Não vou ficar broxa pra agradar eleitor!”, diz Bolsonaro. E uma grande parte do povo, cansada de tanta impotência, vibra, vai ao delírio, grita “mito”, mesmo que não tenha parado para pensar como exatamente o capitão vai fazer para transformar essa masculinidade toda em resultados concretos para construir um país mais próspero e livre. Essas são as tais questões que permanecem, que só liberais “chatos” levantam…

Rodrigo Constantino

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