A chapa formada por Alberto Fernández e a ex-presidente e senadora argentina Cristina Kirchner ganhou de lavada as Primárias Abertas Simultâneas e Obrigatórias (Paso) realizadas na Argentina deste domingo, desbancando o presidente Mauricio Macri, que tenta a reeleição.
De acordo com o serviço eleitoral do Ministério do Interior da Argentina, às 07h42 (horário de Brasília) desta segunda-feira, com 99,37% das urnas apuradas, a Frente de Todos, de Fernández e Cristina, tinha 47,66% dos votos, contra 32,08% da chapa Juntos pela Mudança do atual mandatário, num resultado que, se se repetir nas eleições de 27 de outubro, significará a vitória ainda no primeiro turno do kirchnerismo.
Para vencer a eleição presidencial no primeiro turno, um candidato argentino precisa de 45% dos votos, ou 40% e ter ao menos dez pontos percentuais de vantagem sobre o segundo colocado.
Macri venceu com um discurso reformista liberal, sendo “acusado” pela esquerda de “neoliberal”, enquanto as pessoas com bom senso celebravam, alimentando grandes expectativas de mudanças no país que foi destruído pelo populismo. Mas Macri não governou como um liberal de fato.
À época da vitória, Alexandre Borges comemorou em artigo publicado pelo Instituto Liberal, mas alertou: “Se ele será ou não um liberal na presidência, o tempo dirá. A decepção com Juan Manuel Santos na Colômbia não nos permite colocar a mão no fogo por ninguém antecipadamente. Se ele vai conseguir se manter no poder, mesmo com a violenta oposição dos peronistas, não há como prever. Se fará um governo liberal como de Sebastián Piñera no Chile, cabe a ele decidir”.
Infelizmente para os hermanos e também nós brasileiros, ele decidiu deixar de lado o receituário liberal, atrasou as reformas necessárias, congelou preços, estimulou o consumo de forma irresponsável, e colheu os péssimos resultados. A inflação ficou acima de 20% no primeiro semestre deste ano, projetando mais de 50% no ano. A pobreza ainda atinge cerca de um terço da população. O troco veio nas urnas.
A vontade de punir Macri foi maior do que o medo da volta de Kirchner, o que demonstra certa vocação para a tragédia dos nossos vizinhos. A Argentina, que já foi no começo do século XX um dos países mais ricos do mundo, vem desde então numa trajetória assustadora de desgraças, basicamente pela demagogia do peronismo, com a crença de que o estado é a grande locomotiva da economia e da “justiça social”. Essa mentalidade afundou a Argentina no caos, ainda que a arrogância de muitos argentinos continue em alta.
A situação é temerária. O Brasil está negociando, por meio do Mercosul, acordo de livre-comércio com os Estados Unidos, assim como precisa definir os detalhes do acordo com a União Europeia, evitando armadilhas. Tocar essas negociações com Macri é uma coisa; com Kirchner é outra, bem diferente. A volta da esquerda radical e corrupta ao poder na Argentina será terrível para o Brasil, se se confirmar mesmo no final de outubro. Resta pouco tempo hábil para Macri reverter o quadro.
Fica a lição para Bolsonaro também: não dá para confundir a bolha das redes sociais ou a militância engajada com o povo como um todo. Muitos votaram em Bolsonaro para punir o lulismo, e querem resultados concretos, especialmente econômicos. Não adianta o presidente mandar perguntarem para seu ministro da Economia porque os indicadores não reagem. Se a economia continuar patinando, será o presidente o castigado nas urnas.
Bolsonaro assumiu abertamente a defesa da reeleição de Macri, e corre o risco de amargar uma derrota. Que isso, ao menos, sirva de lição sobre os erros cometidos, para que não se repitam em nosso país. A volta de Kirchner lá é análogo a um retorno do lulismo no Brasil. E só de pensar numa coisa dessas, qualquer pessoa decente e normal tem fortes calafrios…
Rodrigo Constantino