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Chega de messianismo na política!
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A esquerda costuma colocar a estética à frente da verdade e, imbuída de uma visão romântica de mundo, endossa utopias redentoras que acabam, invariavelmente, descambando para tragédias. A falta de realismo é sua grande fraqueza. Não falo aqui dos oportunistas sem caráter que exploram essa visão de mundo esquerdista, e sim dos idiotas úteis que servem como massa de manobra desses oportunistas. Normalmente são “intelectuais”, não proletários, os que acreditam nessa esperança religiosa tendo a política como instrumento. O socialismo é o ópio dos “intelectuais”.

E o lulopetismo foi o crack dos nossos “intelectuais” brasileiros: bastava uma pedrinha para despertar o vício. A narrativa era sedutora demais. Um operário humilde, um “bom selvagem” rousseauniano, que chegaria ao poder para limpar toda a sujeira, para recomeçar tudo do zero, para eliminar as “elites” podres e oligárquicas, e que finalmente colocaria todo o aparato estatal a serviço dos mais pobres. Se crianças se encantam com seus contos de fadas, muitos adultos foram atraídos por esse conto do vigário. Foram como crianças: o romantismo político produz marmanjos com a idade mental de um adolescente.

Em sua coluna de hoje, o professor Denis Rosenfield dissecou com maestria essa crença messiânica no PT, cuja narrativa sempre alimentou essa postura boboca em seus seguidores. A redenção viria pelo toque mágico do grande líder popular, e tudo seria diferente, melhor, mais puro. Claro que o resultado foi o oposto: o PT apodreceu o que já era ruim, fez os escândalos de corrupção passados parecerem roubos de galinha, substituiu ou comprou as velhas oligarquias. Seguem trechos do artigo imperdível:

Estamos no epílogo de um longo período de obscurantismo, que começou com uma promessa de esclarecimento. Desde o começo, o esclarecimento, porém, tinha um forte componente religioso, baseado na ideia de uma espécie de redenção nacional. A história estaria recomeçando a partir de um ponto zero, divisor de águas entre o antes e o depois. É como se os séculos do país devessem, doravante, ser contados de uma outra maneira. Expressões típicas desta vocação religiosa são a “herança maldita” e “nunca dantes neste país”.

A primeira pôs especial relevo em que tudo o que existia anteriormente estaria marcado por um tipo de maldição indelével, fruto de pecados sucessivos, que eram, na verdade, crimes irremissíveis. Do ponto de vista do discurso político, era o resultado de uma visão de esquerda, segundo a qual o capitalismo, o lucro, a propriedade privada e o mercado deveriam ser conjurados e controlados severamente. Um Deus político de novo tipo deveria ser honrado, manifestando-se sob a forma de um Estado intervencionista. O lucro era o pecado, o Estado a redenção. O passado era condenável, o futuro promissor. O seu instrumento o PT e um líder carismático com pretensões messiânicas. Um toque seu podia ungir uma candidata a presidente ou um candidato a prefeito.

A segunda marcava, com fervor, o anúncio do amanhecer de um novo dia. As trevas fariam parte do passado, os tucanos seriam a sua caricatura e um recomeço estaria por vir. A certeza religiosa seria uma prova de sua revelação. Os “pobres” seriam resgatados, apresentando-se como os símbolos desta nova época.

Se o PT pegasse programas sociais do governo anterior e os aglutinasse num só chamado “Bolsa Família”, então era como se nada antes existisse e só o governo novo tivesse criado, do zero, algo voltado para os mais pobres. Esse tipo de narrativa foi a marca registrada do PT desde o começo. Se milhões tivessem entrado pela primeira vez na classe média graças ao Plano Real do governo anterior e ao crescimento chinês, então era tudo fruto de um foco prioritário do PT em ajudar essas pessoas mais pobres.

Qualquer coisa que desse certo era obra do Messias no poder, e qualquer coisa que desse errado era resultado da “herança maldita” que o PT ainda estava limpando. Se depois de 13 longos anos no poder ainda temos tantos “sem-tetos”, então isso só pode ser culpa das oligarquias que controlam o poder há 500 anos. Claro, são as mesmas oligarquias que até ontem estavam ao lado do PT, mas isso não vem ao caso.

Como não vem ao caso qualquer preocupação com coerência. Os deputados que votaram pelo impeachment de Dilma em nome da família e de Deus são de péssimo nível, o país percebeu, mas isso só vira algo relevante quando esses deputados estão contra o PT, já que antes eram seus aliados e o baixo nível nunca foi uma questão.

Chesterton dizia que não se importava com a descrença em Deus, mas sim com o que os descrentes colocariam em Seu lugar. Estava certo, claro. Quando vemos as seitas religiosas que proliferam por aí, das mais descabidas às mais sombrias, temos que lhe dar razão. E uma das seitas mais perigosas é, sem dúvida, a política, aquela que forma a ideologia redentora. Já foram milhões de cadáveres empilhados pelo comunismo/socialismo, mas nada abala o fanatismo dos crentes.

Eis o resultado do lulopetismo: mais corrupção, mais miséria, degradação total de valores morais, mensalão, petrolão, autoritarismo, tentativas constantes de golpismo por parte desses que simplesmente não aceitam o processo democrático e constitucional etc. Mas agora que o barco petista afunda, o que fazem os crentes da política redentora? Olham em volta desesperados, em busca de um novo Messias. Marina Silva que o diga.

O que precisa ser combatido não é “apenas” o PT, mas toda essa mentalidade que enxerga no estado um salvador da Pátria, que busca um Messias para criar um marco zero e instaurar a “nova política”, uma que irá trazer o paraíso terrestre. Não é assim que o mundo real funciona. Os românticos precisam aceitar isso. Que busquem suas fugas da angústia existencial e suas fantasias em outros lugares, nas artes, na literatura, no cinema; mas deixem a política fora disso.

Na política não há redenção; apenas progresso, com muita dificuldade e com percalços no caminho. Curiosamente, como lembra Rosenfield, os mensageiros da ruína se autointitulam “progressistas”, mas representam o contrário disso. Ao ignorar a realidade e colocar a estética da narrativa acima dos fatos, esses “progressistas” acabam representando o retrocesso. O Brasil perdeu uma geração inteira brincando de “salvacionismo” com o PT. Está na hora de falar sério agora, de ter uma conversa de adultos. Tirem as crianças da sala…

Rodrigo Constantino

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