“O senhor me desculpe o desabafo, eu estou fazendo a minha parte. Eu estou deixando de gastar R$ 20 mil de cartão de crédito e estou passando a gastar R$ 8 [mil], para poder viver com os meus R$ 24 mil”.
A fala foi proferida pelo procurador Leonardo Azeredo dos Santos em uma sessão da Câmara de Procuradores do MPMG (Ministério Público de Minas Gerais), no dia 12 de agosto. O áudio na íntegra, com 1 hora e 40 minutos, foi publicado no site da própria instituição.
“Como é que o cara vai viver com R$ 24 mil? O que é que de fato vamos fazer para melhorar a nossa remuneração? Ou nós vamos ficar quietos? Eu não sei se vou receber a mais, se vai ter algum recálculo dos atrasados que possa me salvar, salvar a minha pele. Eu, de qualquer forma, já estou baixando meu padrão de vida bruscamente, mas eu vou sobreviver”, afirmou.
O procurador segue no desabafo dizendo que não é perdulário, mas infelizmente “não tem origem humilde” e não está “acostumado com tanta limitação”. Ele cita, entre seus gastos, R$ 4.500 em condomínio e IPTU.
“Vamos baixar mais a crista? Vamos virar pedinte quase? Alguém vai chegar e dizer ‘ora, exagero seu, você não sabe o que é um pedinte’. Mas será que estou pedindo muito, para o cargo que eu ocupo? Será que o meu cargo não merece ter uma remuneração que eu possa pagar o colégio dos meus filhos, por exemplo?”.
O valor de R$ 24 mil citado por ele é uma média dos salários no Ministério Público de Minas Gerais. Segundo o portal da transparência do MPMG, em janeiro, Azeredo recebeu bruto R$ 35.462, 22. Após o descontos, o valor líquido foi de R$ 23.803,50.
Ocorre que, segundo a planilha divulgada na página do Ministério Público mineiro, ele ainda teve direito a indenizações que somaram R$ 42.256,59, mais R$ 21.755,21 em outras remunerações retroativas/temporárias.
Minas Gerais, não custa lembrar, vive uma das piores situações de crise fiscal do país, com parte de pagamentos de servidores públicos atrasados e parcelados. É nesse contexto que o procurador reclama do “miserê” de seu salário.
Os servidores públicos, em geral, e em especial os do Poder Judiciário, parecem mesmo viver numa bolha. Perderam o contato com a realidade. Quem paga seus salários é o povo que tem, como renda média, uma ínfima parte desse montante. Isso os que trabalham, pois há quase 13 milhões de desempregados!
Não nego que, em alguns casos, o sujeito poderia ganhar mais na iniciativa privada. Mas é preciso levar várias coisas em conta: o espírito público da função, que deveria existir; a estabilidade do emprego, já que no setor privado ele correria muito mais riscos; os adicionais e regalias oferecidas pelo estado, que se somam ao ganho bruto; a aposentadoria cheia e antecipada em relação aos que labutam no mercado.
Um casal de servidores públicos desse patamar tiraria mais de R$ 50 mil líquidos por mês, fora os auxílios todos, os complementos, as vantagens. E dormiria tranquilo sabendo que amanhã não poderão simplesmente receber uma carta de demissão do chefe, como ocorre com os reles mortais do setor privado.
Não obstante, o procurador disse que vive à base de remédios, para aguentar essa “miséria” de salário: “Eu e vários outros, já estamos vivendo abaixo de comprimido, abaixo de antidepressivo. Eu estou falando desse jeito aqui com dois comprimidos de sertralina por dia. Eu tomo dois ansiolíticos por dia e ainda estou falando desse jeito aqui. Você imagina se eu não tomasse? Ia ser pior que o Ronaldinho. Alguma coisa tem que ser feita”.
Diante disso, só resta a nós, pagadores de impostos que sabemos das dificuldades de se ganhar dinheiro tendo de ofertar trabalho no mercado, tomarmos um Prozac também, para tentar não cair em depressão profunda…
Rodrigo Constantino