Por que, quando determinados preços disparam, há uma reação mais organizada de grupos de interesse para pressionar o governo, enquanto outros preços oscilam ao sabor do mercado sem o mesmo tipo de reação? Refletir sobre isso pode ajudar a compreender como o modelo dirigista estatal está por trás da greve dos caminhoneiros, que tem gerado tanta tormenta ao povo brasileiro.
O economista Paulo Guedes, em sua coluna de hoje, falou do assunto, lembrando que o dirigismo é o grande responsável pelo tipo de resposta dos caminhoneiros (e de outras categorias que já embarcam em greves para conquistar privilégios também). Diz Guedes:
A explosão dos preços dos combustíveis é um fenômeno global. Nas economias de mercado, preços livres transmitem informações em uma engrenagem descentralizada. Mesmo em crises, os sinais de preços apontam o curso para correção dos desajustes. Com a mão invisível do mercado, não há culpados a perseguir. Mas, na armadilha dirigista, tudo é conflito e sempre há bruxas a caçar. Afinal, se as patas visíveis do governo contribuem para a tragédia, merece ser acusado enquanto persegue seus bodes expiatórios.
O governo Dilma estimulou uma bolha na oferta de transportes, com crédito subsidiado do BNDES para compra de caminhões. Estima-se um excesso de oferta de quase 300 mil entre os 2,6 milhões de caminhoneiros, 10% acima do que teríamos sem o doping do crédito. A bolha estourou com o colapso da demanda em meio à recessão, derrubando os fretes. E, após décadas sem investimentos nas estradas esburacadas, recorremos às concessões para transferir custos de reparos e manutenção para o setor privado, resultando em pedágios onerosos.
A falta de segurança nas estradas, o roubo de cargas e a indústria de multas agravaram o pesadelo dos caminhoneiros. Mas a disparada do câmbio e do preço internacional do petróleo repassada por uma política de reajustes diários foi o golpe decisivo que deflagrou a avassaladora greve dos caminhoneiros. Como na armadilha dirigista o governo se mete em tudo, agora é condenado pela opinião pública. “Dopou os caminhoneiros com crédito.” “Permitiu os pedágios extorsivos.” “Controla a produção e a distribuição de combustíveis, estabelecendo preços e impostos abusivos aos consumidores e contribuintes.”
Ou seja, num setor em que o governo decide tantas coisas, parece apenas natural que os afetados por crises, mesmo que parcialmente incontroláveis e ligadas a fatores externos, virem-se para o governo em busca de soluções, de canetadas milagrosas, transferindo o custo para terceiros. Quando todos os setores são assim, a briga vira uma disputa pelo cobertor curto, enquanto os elos fracos da cadeia, incapazes de criar grupos de interesse poderosos, pagam o pato.
Samy Dana também escreveu sobre isso em sua coluna de hoje:
A crise dos caminhoneiros tem ensinado mais sobre economia do que muitas horas na sala de aula. As lições do passado não foram aprendidas, muitas pessoas parecem ainda não entender a dinâmica de formação de preços e muito menos quem pagará a conta do populismo econômico.
A primeira pergunta a ser respondida é: “Quem pagará essa conta e a quem beneficiará esse acordo”? Benesses e concessões nunca vêm sem custos. De um lado, um grupo de caminhoneiros terá menos impostos sobre o diesel. Do outro, o restante dos 207 milhões de brasileiros terá aumento da carga tributária para compensar esse desequilíbrio. Os custos são difusos e os benefícios, concentrados.
[…] Grupos bem organizados, como o dos caminhoneiros e transportadoras, coordenam-se mais facilmente em lobbies e ações. Eles têm incentivos para isso. Já os brasileiros que pagarão a conta de forma difusa têm menos incentivos para se organizarem. Na prática, a pauta da minoria domina a da maioria.
[…]
Não pode tudo virar um jogo do “quem grita mais”, com cada classe reivindicando sua pauta e chantageando o governo para obter privilégios. Indivíduos buscando benefícios próprios quando outros pagam esta conta prejudicam a sociedade a longo prazo.
Cobrar por um bem o preço que vale ajuda a promover seu uso racional. Não existe almoço grátis. O custo do acordo sobre o diesel terá de ser pago por alguém. Infelizmente, você.
Em resumo, numa economia dirigista como a nossa, com muita concentração de poder e recursos no estado e a capacidade de transferir custos numa canetada do governo, haverá um cabo de guerra entre grupos organizados, seguindo a máxima de que quem não chora, não mama. Nessa disputa por privilégios, será sempre o povo trabalhador sem representatividade a pagar a conta.
É por isso que economistas sérios leem sem surpresa a notícia de que o governo já fala em aumento de impostos para compensar as vantagens bilionárias concedidas aos caminhoneiros. Não existe almoço grátis.
Rodrigo Constantino
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