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A compra de uma casa americana
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Quando vim morar nos Estados Unidos, há dois anos, sabia que o contraste do dia a dia num país de primeiro mundo iria fornecer várias pautas para artigos. E, de fato, muitos já foram escritos, além de uma parte do meu livro Brasileiro é otário?, que compara justamente o cotidiano dos americanos “otários” com o dos “malandros” brasileiros – para nosso desespero e revolta.

Recentemente, escrevi na coluna da Gazeta um texto sobre a facilidade chocante de vender um carro usado, sem burocracia alguma. A coisa toda se resolve em menos de uma hora, e você sai de lá com um cheque e sua placa, para o próximo carro. O texto teve grande repercussão, pois realmente chega a ser bizarro o calvário para comprar e vender carros em nosso país.

Imagine então, caro leitor, minha surpresa ao comprar uma casa! Foi tão fácil como a venda ou a compra do carro, mas estamos falando de um ativo bem mais valioso. No Brasil, o processo burocrático para se fechar um negócio imobiliário é infindável, com inúmeras certidões negativas, cartórios envolvidos, vai e vem entre comprador e vendedor, com a desconfiança sempre predominando: “será que o sujeito quer me ferrar?”

Vendi meu apartamento no Rio para uma pessoa extremamente decente, que acabou se tornando meu amigo (e também vizinho em Weston, mas ele jura que não está me espionando a mando do PT). Ambos percebemos que lidávamos com uma contraparte séria e honesta. E mesmo assim o processo foi lento e burocrático, com contratos, cartórios e certidões necessárias em cada passo.

Aqui eu sequer precisei conhecer o proprietário (esbarrei com ele por acaso numa visita que fiz antes da proposta). Gastei menos de mil dólares com um advogado, outros mil com uma inspeção padrão, e fechei a coisa toda pela internet. Isso mesmo! Transferi o dinheiro pela internet e recebi um e-mail com o título de propriedade provisório. A casa já era minha.

Com esse documento, impresso pelo computador mesmo, fui na empresa de água e transferi a conta para meu nome. Fui na administração do condomínio e me cadastrei, recebendo o material de novo morador e o cartão de acesso ao clube. O título oficial só chegou duas semanas depois, pelo correio. Eu já era o dono da casa, para todos os efeitos práticos.

Meu corretor, um brasileiro que mora na Flórida há quase vinte anos, riu e disse para mim: “Isso dá um texto, não dá?” Dá sim, respondi. E aqui está ele. A minha experiência de vender um carro usado e comprar outro nos Estados Unidos já tinha me surpreendido. Mas a experiência parecida na compra de uma casa?! Essa foi ainda mais impressionante.

Burocracia quase zero. Tudo para facilitar a vida dos envolvidos, fazer os negócios girarem com maior facilidade. Impostos bem menores também, que fique claro. E sociedade da confiança: parte-se da premissa de que o outro lado é sério, e não um malandro que quer te dar um golpe. Até porque a punição para golpistas costuma ser exemplar.

Claro que existem embusteiros por aqui também. Na Flórida, então, com tantos latinos forjados na selva do “vale-tudo” e do “jeitinho”, não são poucos. Mas tampouco são a maioria, e estão longe de representar a regra em vez de a exceção. Pequena exceção. E a vida segue mais fácil para todos os que são corretos, com regras burocráticas feitas para atendê-los, não para tornar suas vidas um inferno kafkiano como se todos fossem bandidos, até prova em contrário.

Já no Brasil, todos são tratados como se estivessem na lista da Odebrecht. E talvez a maioria estivesse mesmo, se tivesse a oportunidade…

Rodrigo Constantino

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